Erivaldo Gomes ladeado por João Simas (guitarra) e Tião Carvalho (cavaquinho) em show do último em março de 2019. Foto: Márcio Vasconcelos
Erivaldo Gomes ladeado por João Simas (guitarra) e Tião Carvalho (cavaquinho) em show do último em março de 2019. Foto: Márcio Vasconcelos

A frase que escolhi para manchete, segundo o percussionista maranhense Erivaldo Gomes, seria o título de seu primeiro disco solo. Que ele não chegou a lançar. Na sua cabeça irreverente, “Pensamentos drobados” (sic), que ele lançou em 2008, era seu segundo disco.

Erivaldo Gomes (26/2/1959-2/10/2022) faleceu hoje, de complicações hepáticas – lutava contra um câncer no fígado.

Percussionista, compositor, cantor e violonista, o artista participou ativamente da vida cultural maranhense desde a adolescência. No final da década de 1970 integrou o lendário Rabo de Vaca, com Betto Pereira (à época Beto do Cavaco), Jeca Jecowski, Josias Sobrinho (a quem agradeço parte das informações deste obituário), Manoel Pacífico, Mauro Travincas, Omar Cutrim, Rodrigo Castelo Branco, Ronald Pinheiro, Tião Carvalho e Zezé Alves.

Na década de 1980 se mudou para São Paulo, onde tocou com nomes como o mineiro Dércio Marques e o baiano Xangai. Foi percussionista de “Fulejo” (1983), disco em que o primeiro gravou “Namorada do cangaço” (Cesar Teixeira), no encarte dedicada a Chico Maranhão, com outro maranhense na ficha técnica, o violonista Ubiratan Sousa; do segundo tornou-se parceiro (é deles “Não rio mais”), tendo sido percussionista de “Qué que tu tem canário” (1981) e “Dos labutos” (1991). Com Manoel Pacífico produziu “Engenho de flores” (1987), disco de estreia de Josias Sobrinho.

Durante sua temporada paulista, trabalhou no Som Brasil, na Rede Globo, à época apresentado por Ronaldo Boldrin, época em que, além dos já citados, tocou com artistas como Antonio Carlos e Jocafi, Antonio Nóbrega, Diana Pequeno, Dominguinhos, Doroty Marques, Elba Ramalho, Francis Hime, Genésio Tocantins, Gilberto Gil, Heraldo do Monte, João Bá, Juraildes da Cruz, Milton Edilberto, Oswaldinho, Paulinho Pedra Azul, Terezinha de Jesus, Titane, Toninho Horta e Vicente Barreto, entre outros.

No Maranhão tocou com todo mundo: Adler São Luís, Alcione, Betto Pereira, Carlinhos Veloz, César Nascimento, Cesar Teixeira, Chico Saldanha, Didã (com quem foi casado e teve os filhos Aimoré Gomes e Mirasol Santos, percussionista e cantora, respectivamente), Erasmo Dibell, Gerude, Josias Sobrinho, Lourival Tavares, Rita Benneditto, Rosa Reis, Sérgio Habibe, Tião Carvalho, Tutuca e Zeca Baleiro, entre outros.

A partir de 2002 participou constantemente do happening A vida é uma festa, capitaneado pelo poeta-músico ZéMaria Medeiros, inicialmente no Bar de Seu Adalberto (in memoriam), depois na Companhia Circense de Teatro de Bonecos, ambos na Praia Grande.

Naquele mesmo ano produziu a caixa “O calor do tambor de crioula do Maranhão dá o tom à cultura popular”, com um documentário e cds dos grupos comandados por Mestre Leonardo, Mestre Chico e Mestre Felipe. A propósito de sua admiração sobretudo pelo primeiro, o fotógrafo Márcio Vasconcelos (nunca se negavam um dedo de prosa, sempre que se encontravam), relembra: “Uma vez, provocando-o para tocar num tambor com Leonardo, ele me disse que quando Leonardo estava tocando, preferia parar para aprender do que pedir para tocar”. Um verdadeiro atestado de sabedoria e humildade.

Sua obra autoral bebia na fonte dos ritmos da cultura popular maranhense, com elementos de bumba meu boi, tambor de crioula, lelê e tambor de mina, mas passando também por coco, reggae, baião e marchinha, entre outros. No carnaval comandava a alegoria de rua Tapera, uma espécie de casinha da roça. E seguindo sua máxima, “acabou o carnaval, já é São João”, comandava o Blofão, que desfilava pelas ruas da Madre Deus na meia-noite da sexta-feira santa para o sábado de aleluia.

Era um frasista espirituoso: além da manchete, dizia coisas como “eu sou ateu, graças a Deus” e “partindo do princípio de que o amor é cego não haverá amor à primeira vista” (versos de “Papo furado”).

Algumas de suas composições mais conhecidas são “Eu te conheço, carnaval”, hit da Esbandalhada, bloco carnavalesco puxado por Alcione, “De cima” (que intitulou disco de Gerude), “Cajapió” (gravada por Tião Carvalho em “Quando dorme Alcântara”) e “Terecô” (parceria com Betto Pereira, que intitulou um disco seu).

O sepultamento será realizado às 17h, no Cemitério do Gavião (Madre Deus).

*

Assista ao show “A viagem é você”, que Erivaldo Gomes apresentou no programa Pátio Aberto online, do Centro Cultural Vale Maranhão, em 13 de dezembro de 2020:

PUBLICIDADE

DEIXE UMA REPOSTA

Por favor, deixe seu comentário
Por favor, entre seu nome