Aula show de Carlos Malta e Pife Muderno abriu o Fina, ontem (17), em São Luís

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Carlos Malta e Pife Muderno na aula show "Esculpindo o vento: ritmos e melodias", ontem. Foto: Taciano Brito/ Divulgação
Carlos Malta e Pife Muderno na aula show "Esculpindo o vento: ritmos e melodias", ontem. Foto: Taciano Brito/ Divulgação

Quando Carlos Malta deixou a banda de Hermeto Pascoal após mais de uma década de bons serviços prestados à música brasileira, reuniu em torno de si, no Pife Muderno, nomes de referência em seus respectivos instrumentos. O músico queria algo parecido com a formação tradicional de uma banda de pífanos, mas injetando um toque de modernidade. Além dele mesmo (flautas, pífano e saxofone), o grupo é formado atualmente por Andréa Ernest Dias (flautas e pífano), Durval Pereira (zabumba), Marcos Suzano (pandeiro), Bernardo Aguiar (pandeiro) e o recém-integrado Fofo Black (bateria), maranhense que ele conheceu em Curitiba em fevereiro passado.

Ontem à noite, durante a aula show que o grupo – sem Suzano, que acompanhava Ney Matogrosso em um show e só chega hoje à São Luís – ministrou na Escola de Música do Estado do Maranhão Lilah Lisboa de Araújo (Emem, Rua da Estrela, 363, Praia Grande), Malta disse que se o Pife Muderno fosse um grupo de rock, Durval seria o guitarrista, referindo-se tanto ao destaque que cada instrumento tem, seja em discos ou em shows, quanto à performance do músico da banda de Elba Ramalho, que toca dançando.

Digo tudo isto para me atrever a afirmar que se o Pife Muderno fosse uma academia de letras, Fofo Black ocupa hoje a cadeira do imortal Oscar Bolão (1954-2022) – que chegou a gravar na tetralogia com que o grupo homenageia Gilberto Gil, lançada ano passado –, encerrando a dúvida de Malta sobre ter ou não outro baterista.

No palco do auditório da Emem, a tradução literal de aula show: a aula como espaço de trocas, no processo de ensino-aprendizagem, e o show do verbo mostrar em inglês, como disse o próprio Malta. Cada integrante do Pife Muderno teve a oportunidade de satisfazer a curiosidade dos presentes em relação a determinados aspectos como, por exemplo, microfonação de pandeiro, improviso e influências – em meio ao papo, uma verdadeira jam.

Como o Pife Muderno completa 30 anos em 2024 e Carlos Malta citou ter sido apresentado a Durval por Lenine, indaguei-lhe o quanto “Olho de Peixe” (1993), álbum que o pernambucano gravou com Suzano – e do qual Malta participou –, poderia ser considerado uma espécie de embrião do grupo. O flautista e saxofonista disse que fazia todo sentido e lembrou que o álbum, que completa 30 anos em 2023, com direito a reedição em vinil, foi sua primeira gravação após deixar o grupo de Hermeto.

Depois de um longo improviso, numa demonstração da capacidade, dos talentos individuais e da simpatia dos integrantes do grupo, o Pife Muderno tocou “Domingo no Parque” (Gilberto Gil), e Malta afirmou (cito de memória): “quem conhece a letra vai perceber que as flautas estão fazendo o papel que seria da voz nessa versão instrumental”. Lembrou-se do impacto de ver o compositor baiano defendendo sua música no festival de música popular da TV Record em 1967. E arrematou: “o rei da brincadeira é Gilberto Gil”.

Antes de tocarem “Nítido e Obscuro” (Guinga/ Aldir Blanc), ele lembrou que há quem considere a flauta baixo um instrumento limitado e citou recomendações de “não faça isso ou aquilo” de métodos, referindo-se a orientações comumente dadas a músicos de não tocarem muito rápido, por exemplo. A execução ao vivo da obra-prima de Guinga provou que os sopros do Pife Muderno são excepcionais. “Instrumento, o nome já diz; agora o que cada um faz com seu instrumento, é outra questão”, ensinou Malta, sempre bem-humorado.

Lá pelo meio da música, ele simulou apoiar-se no pífano como se o instrumento fosse uma bengala. Era uma homenagem ao flautista Manoel – quem puxou o nome da memória foi o violonista e professor Joaquim Santos, na plateia –, um músico de rua, cego, com deformações nas mãos, que tocava sua flauta, um tubo de aço galvanizado, para angariar umas moedas. “Eu o conheci aqui, no final da década de 1970; passei três tardes ouvindo-o tocar e aquilo foi muito impactante para mim; como ele, apesar de todos os limites, conseguia tirar um som maravilhoso; a gente não chegou a conversar, ele não era muito de papo; ele queria tocar e eu queria ouvir; quando a tarde terminava eu lhe dava uns trocados e ele ia embora; eu acho que é um personagem que merece um documentário”, contou Malta.

Ao fim da aula show, Malta mandou um “declaro oficialmente aberto o Fina”, para gargalhadas do público presente, que vibrou e se divertiu ao longo de cerca de uma hora de papo e som. A atividade era uma amostra da apresentação que eles fazem hoje (18), baseada na tetralogia “Carlos Malta e Pife Muderno em Gil”, no Festival Instrumental Nacional (Fina), que acontece hoje (a partir das 20h), amanhã (idem) e domingo (às 18h) na Praça Maria Aragão (Centro).

A programação de hoje conta ainda com Fofo Black e Afrocongo e Mestrinho. O Fina tem patrocínio do Instituto Cultural Vale, através da Lei Federal de Incentivo à Cultura. Antes, na Emem, acontecem os workshops “Sete cordas, técnica e estilo”, com os violonistas Rogério Caetano e Gian Correa (hoje, às 14h), e “O estilo Toninho Horta de tocar”, com o guitarrista (idem, às 16h30). Toda a programação do Fina é gratuita (confira no instagram do festival) e para os workshops não é necessária inscrição prévia.

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