O violista Amaro Dubois. Retratos: Harris Beauchamp. Divulgação
O violista Amaro Dubois. Retratos: Harris Beauchamp. Divulgação

Com uma consolidada carreira internacional, entre o ambiente acadêmico e o das salas de concerto, o violista brasileiro Amaro Dubois acaba de lançar, em duo com a pianista chinesa Tingting Yao, ambos radicados nos Estados Unidos, o álbum “Luz”.

O trabalho é inteiramente dedicado a repertório erudito de compositores latinos e americanos, mas Amaro Dubois puxa a brasa para sua sardinha: metade do repertório é de brasileiros e há até mesmo um Zequinha de Abreu (1880-1935) no repertório.

Luz. Capa. Reprodução
Luz. Capa. Reprodução

“Luz” foi gestado virtualmente e Amaro Dubois e Tingting Yao, que moram mais de mil quilômetros distantes um do outro, se encontraram para gravar o álbum em duas sessões de cinco horas. O resultado é um primor.

Entre uma e outra série de concertos, o violista já se prepara para gravar dois novos discos, frutos do primeiro prêmio na competição ArtsLab da Universidade da Geórgia (UGA), em que recebeu o prêmio Presidential Award Fellowship para as temporadas de 2022-2026. Isto após ser convidado, em 2021, a concluir sua pesquisa de doutorado na Universidade de Nevada e atuar como assistente de ensino.

Outros feitos seus espraiam-se por vários concursos na Europa, como o World Classical Music Awards Gold Prize Winner, em que obteve o primeiro lugar na categoria Música Moderna (música de câmara acima dos 26 anos) e o segundo lugar no Kings Peak International Music Competition. Em 2021 ficou em quarto lugar na categoria profissional de Viola no London Classical Music Competition.

Por e-mail ele conversou com exclusividade com FAROFAFÁ.

ENTREVISTA: AMARO DUBOIS

ZEMA RIBEIRO: “Luz” é título bastante apropriado para o disco que você divide com a pianista chinesa Tingting Yao, dedicado a repertório erudito de compositores latinos e americanos, literalmente jogando luz sobre este repertório e seus criadores. Como surgiu a ideia? Fale um pouco também do processo de gravação.
AMARO DUBOIS: A ideia do título “Luz” surgiu primeiramente pelo fato e desejo que tenho de expressar diversidade e inclusão em tudo que faço. Música para mim é uma maneira ideal de comunicação; é o meio mais poderoso de expressar nossos sentimentos dos mais variados tipos. Como bem você disse: jogando luz sobre esse repertório pouco visto em palcos do mundo, eu pretendo fazer desse projeto algo grande, onde outros artistas possam se espelhar. O título veio também por causa da música-tema do álbum pelo meu grande amigo, professor, mentor e extraordinário compositor Edmundo Villani-Cortes. Sua música intitulada “Luz” me inspirou durante a pandemia no início de 2022 a elaborar esse segundo álbum com o tema “Luz”. As gravações foram uma diversão com muitas emoções. Minha pianista mora no Texas e eu morava no Tennessee, 1.100 km de distância um do outro. Um desafio, mas nós nos comprometemos e nos encontramos em Memphis no Tennessee para as gravações. Foram dois dias de cinco horas cada, e gravamos o disco todo. Cansativo mas muito gratificante.

ZR: Metade dos compositores registrados por vocês dois em “Luz” é brasileira. Para além de demonstrar a relevância de nossa produção no campo da música erudita, era uma escolha inevitável esse puxar a brasa para nossa sardinha?
AD: Verdade. Minha ideia é trazer a música erudita brasileira a um ponto mais sublime e de contato com outras vertentes também. Usamos o disco para juntar compositores brasileiros com mexicanos, como por exemplo José Elizondo e uma compositora nativa de Arkansas, Florence Price. Todos no mesmo segmento, onde são pouco representados nos nossos palcos em dias atuais. Com um bom “brazuka” [grafia e aspas dele], eu não poderia deixar de puxar a sardinha para minha terra e ter mais música brasileira no disco.

ZR: Uma curiosidade é a presença de Zequinha de Abreu, que fecha o repertório com “Tico-Tico no Fubá”, uma espécie de ponto fora da curva, no disco. Como ele é invariavelmente conhecido como compositor de choros e música popular, eu pergunto se essa escolha foi justamente para demonstrar o quão tênue é essa linha que separa popular e erudito.
AD: Exatamente. Adorei sua expressão ao dizer “um ponto fora da curva”. Foi exatamente essa minha intenção ao gravar e brigar pra ter essa composição popular, e fechando o álbum! Novamente eu digo: minha missão é a diversidade e igualdade dos compositores, músicas e artistas. Zequinha de Abreu foi e é um grande compositor de nossa BOA [grifo dele] música brasileira, onde todos nós fomos influenciados. Eu quis buscar essa espécie de choque na audiência. Quem escutar o álbum terá uma viagem extraordinária pelo mais variado tipo de composições através do som da minha viola e piano. “Tico-Tico no Fubá” vem fechando o álbum pra dizer que na vida passamos por muita coisa, aprendemos muita coisa, e vivemos bons e não tão bons momentos, mas que sempre haverá LUZ [idem] no fim do túnel, sempre haverá sol após uma tempestade. “Tico-Tico” traz essa alegria que o BOM [ibidem] samba e choro tem. “Luz” é um álbum para emocionar e levar o ouvinte a uma incrível viagem de esperança.

ZR: Como se deu o encontro musical com Tingting Yao? Era um repertório já conhecido por ela? Como foi o processo de maturação até o registro?
AD: Tingting e eu nos conhecemos nos corredores da Universidade de Música de Memphis, no Tennessee. Ela trabalhava na universidade como pianista acompanhadora e eu estava lá para um ensaio de quarteto da Orquestra onde trabalhava. Nos conhecemos e rapidamente tocamos algo junto para sentir a “conexão” que tínhamos. Então, foi isso. Veio a pandemia e nós nos conectamos ainda mais em projetos e gravações virtuais. Através disso surgiram convites e gravamos nosso primeiro disco, “Adorations – Music of the Americas”, que também é voltado para expressões musicais dos compositores pouco representados em nosso meio. Todo o repertório era super novo para nós dois. No disco “Luz” nós aprendemos e amadurecemos o repertório juntos contando também com todos os feedbacks dos compositores.

ZR: Você tem uma consolidada carreira internacional, com títulos e prêmios, entre o ambiente acadêmico e o das salas de concerto. O que pode anunciar sobre os dois discos em que já está trabalhando?
AD: Muito obrigado! Fico grato com a oportunidade de estar ficando mais perto do público brasileiro. Os dois discos em que estou trabalhando agora são muito especiais. São dois projetos lindos que vão levar ao público novas composições e uma outra maneira de ouvir os instrumentos como viola e piano. “Sonatas from the Americas” será gravado durante nosso verão aqui, nos meses de junho e julho deste ano. Consiste em uma seleção nova de Sonatas para Viola e Piano por um compositor de cada América. Sendo assim teremos uma sonata de compositor da América do Sul, outra da América Central e outra da América do Norte. Um projeto rico, que traz a comparação de estilo e escrita e histórias através da música.

ZR: Que saudades tem do Brasil? Ou ouvir música brasileira supre essa distância?
AD: Muitas saudades. Especialmente do calor brasileiro e das pessoas. De ouvir uma boa música popular… de estar nas praias contemplando a beleza que nosso Brasil oferece. Ah, claro, algumas comidas também. Uma boa farofa e um feijão no capricho! Tem coisas que não dá mesmo pra achar por essas bandas daqui [risos].

ZR: Além da gravação dos discos, você também tem uma turnê pela Europa. O que pode adiantar destas apresentações? E a divulgação de “Luz”? Há concertos previstos? Há alguma previsão de se apresentar no Brasil?
AD: Exato. Nós acabamos de chegar de uma curta turnê pelos Estados Unidos. Fizemos sete concertos onde apresentamos o repertório do álbum “Luz”. Nosso próximo concerto do álbum será no dia 20 de Fevereiro no Teatro Ramsey Hall da Universidade da Geórgia e temos uma turnê nos planejamentos para o meio do ano. A princípio será uma série de sete concertos pela Alemanha, França e Suíça. Iremos apresentar composições dos dois discos recentes e também levar música brasileira como Zequinha de Abreu, Villani-Cortes, Villa-Lobos (1887-1959), Dimitri Cervo e muito mais. No Brasil ainda não temos previsão. Honestamente, tenho buscado oportunidades para fazer uma turnê pela minha terra natal. Esperamos ansiosamente que algumas oportunidades possam surgir em breve.

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Ouça “Luz”:

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