O poeta Álvaro Faleiros, o pianista Yaniel Matos e a cantora e compositora Beth Amin no Estúdio Arsis durante as gravações de
O poeta Álvaro Faleiros, o pianista Yaniel Matos e a cantora e compositora Beth Amin no Estúdio Arsis durante as gravações de "Valsa no Tempo". Foto: Tarita de Souza/ Divulgação

“A gente se come”, faixa que abre “Valsa no Tempo”, é cartão de visitas desbragado e despudorado. A música é uma delícia, tem sabor, como o título já deixa explícito – o recado é direto, certeiro, longe de soar vulgar.

O disco marca o encontro da cantora e compositora Beth Amin, do poeta-letrista Álvaro Faleiros e do pianista cubano Yaniel Matos, radicado no Brasil há mais de 20 anos – que também toca violoncelo, faz vocais e assina os arranjos –, além da participação especial da paulistana Tatiana Parra (vocais). Fernando Vilela assina concepção visual, pinturas e desenhos.

“A gente se come/ A gente se lambuza/ Quer saciar uma fome/ Que não tem fim/ Que não tenha nunca/ Que não tenha nunca/ Eu gosto assim/ Esquentei você/ Em borbulhas de dendê/ Até o dia amanhecer/ E então/ De sobremesa/ Ai, tem chantilly com cereja/ Tem nós dois em cima da mesa/ E as roupas no chão”, diz a letra.

“A vida é redemunho/ Que não para de rodar/ Giro eu e giramundo/ Alço velas vou ao mar”, canta em “Redemunho”, a faixa seguinte, em completa entrega ao ofício da música, no melhor estilo “todo artista tem de ir aonde o povo está”. “Se um dia chego ao porto/ Não é mais de onde parti/ Vem comigo algum tesouro/ E na pele a cicatriz”, continua, estabelecendo a relação artista-público, através das trocas proporcionadas pela devoção à deusa-música, além de reforçando a ponte musical Cuba-Brasil, na sonoridade de todo o álbum.

As 10 faixas de “Valsa no Tempo” são inéditas – alguns poemas já haviam sido publicados, outras letras foram compostas para o projeto. A faixa de abertura e “Hoje Tem Sol”, por exemplo, foram compostas durante o período mais agudo da pandemia de covid-19.

Na reflexiva “Silêncio” ouvimos a voz de Álvaro Faleiros, precedendo a melancólica “Sincera Tristeza”. “Silêncio perene/ Só as sirenes/ Os gritos das mães/ Entre os projéteis/ Ecos de maio”, diz a letra da primeira, evocando tanto as mães da Praça de Maio na Argentina quanto as mães das periferias brasileiras. A segunda evoca o bíblico “em tudo dai graças”: “Por que desprezar/ Uma sincera tristeza/ Viver é também mergulhar/ Em sua profundeza”, filosofa.

Depois é a vez de “Manzanas Verdes”, a única do disco composta e cantada em espanhol, emoldurada pelo violoncelo de Yaniel Matos, outra delícia do repertório: “A vida é um jardim/ De rosas brancas/ Cheio de esperanças/ Que cheiram a jasmim”, diz trecho da letra em tradução livre.

O balanço de “Mandala de Seda” evoca tons de Ernesto Nazareth (1863-1934), com a alegria se sobressaindo aos altos e baixos da vida, como diz a letra, roçando Cartola (1908-1980): “Viver é mesmo um moinho/ Milhões de surpresas no meu quintal/ Viver é mesmo um moinho/ Tem dia de chuva, tem dia de sol/ Tem dia no céu, tem dia no chão/ Tem dia que dói, tem dia que não/ Tem dia de doce, tem dia de sal/ Tem dia de brisa e de vendaval”.

Em “Valsa no Tempo” até a “Preguiça” é uma delícia, sem querer empobrecer a rima. “Preguiça, moço/ Aqui tem muita/ Balança rede/ Depois do almoço”, diz a letra, antes de transformar preguiça em malícia.

A buarqueana faixa-título, que fecha o álbum, é uma reflexão profunda sobre nossa relação com o tempo, em tempos de correria nossa de cada dia. Tudo é intenso no álbum, gravado em 20 e 22 de maio do ano passado (por Adonias Jr., que também assina mixagem e masterização), que será lançado nesta terça-feira (14) nas plataformas de streaming.

Como reza a letra de “Valsa no Tempo”, “Quem sabe se o tempo faz que não percebeu/ Que paramos pra olhar para o céu”, eis um disco que merece sua atenção: tire um tempo para ouvir.

Valsa no Tempo. Capa. Reprodução
Valsa no Tempo. Capa. Reprodução

Serviço: os shows de lançamento de “Valsa no Tempo” acontecem dias 18 (sábado, às 20h) e 19 (domingo, às 19h), no Instituto Brincante (Rua Purpurina, 412, Vila Madalena). Os ingressos custam R$ 80,00 (inteira) e R$ 40,00 (meia-entrada).

Faça a pré-save do álbum clicando aqui.

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