Rogério Bandeira no monológo 'Hamlet: 16 x 8'
Rogério Bandeira no monológo 'Hamlet: 16 x 8' - Foto: Pio Figueiroa

Hamlet: 16 x 8, monólogo interpretado por Rogério Bandeira, pode enganar por seu título que remete a uma das peças mais célebres de William Shakespeare. Na verdade, ela é sobre Augusto Boal, diretor e dramaturgo que imortalizou o Teatro de Arena e se tornou mundialmente conhecido por fundar o Teatro do Oprimido. E é também sobre o próprio Bandeira, que estabelece, em cena, um dialogo de sua carreira com a retratada por Boal em sua autobiografia Hamlet e o Filho do Padeiro: Memórias Imaginadas.

A intenção de encontrar paralelos, senão similitudes, entre a sua vida e a de Boal é, à primeira vista, pretensiosa. Mas nesse jogo que Bandeira arma logo de saída, quando sobe ao palco, ganha em não muito tempo uma dimensão entre cômica, pitoresca e nostálgica. E aos que leram a autobiografia de Boal compreenderão que esse foi o espírito do dramaturgo. “Quero mais. Sou excessivo, demasiado. Seria incômodo falar de mim: no que faço, importa o feito, não o fazedor”, descreveu Boal. “Os fatos são verdadeiros mas não aconteceram iguais ao meu jeito de contar: estilo existe!”

O ator Bandeira sabe da potência e da genialidade de seu personagem inspirador, e presta as devidas homenagens ao dramaturgo. Em cenas curtas, ele transforma o pequeno palco da sala Paschoal Carlos Magno em um simulacro do Teatro Arena, que fermentou a dimensão política e social de Boal. É uma forma de o próprio Bandeira dizer, ao seu modo, que ele também vê o teatro como instrumento de transformação. Ao buscar recortar, dentro da autobiografia de Boal, pequenas passagens, o ator acaba por construir uma  pequena genealogia do teatro brasileiro. São reverenciados nomes singulares como Sábato Magaldi, Décio de Almeida Prado, Oduvaldo Vianna Filho, João do Vale, Zé Kéti, Gianfrancesco Guarnieri, Antunes Filho, CPC e Companhia do Latão, com ele participando das duas últimas.

Bandeira revela que sua vontade de fazer com que a autobiografia de Boal seja conhecida por muitos é maior que sua indisposição para montar um monólogo. Mas esse mise en scène ajuda a abrir espaço para que pequenas situações vividas por Boal ou por ele próprio surjam natural e comicamente. Boal já dizia, sobre a peça de Shakespeare: “A tragédia de Hamlet não é ser ou não ser: é ser e não ser. Hamlet é os dois, o Pai e o Tio, a morte e a vida – e só não sabe ser ele próprio. Sou especialista nessa dicotomia”. Hamlet: 16 x 8 brinca com dicotomias que até hoje fazem parte do ato de atuar, seja no palco ou na vida real.

Na direção de Hamlet: 16 x 8 está Marco Antonio Rodrigo, parceiro de Plínio Marcos e ator do Bando, nos anos 1980. Bandeira e Marco Antonio fundaram a Cia Folias D’Arte. Ambos, assim como Boal, viveram períodos de exílios no exterior, cada um ao seu modo. O ator Rogério Bandeira é filho de Iberê Bandeira de Mello, um dos principais advogados que atuou na defesa de presos políticos durante a ditadura militar. Em tempos diferentes, ator e diretor conhecem Cecília Boal, mulher do dramaturgo, que lhes cede os direitos autorais da autobiografia. A montagem, em nova temporada, segue até dia 20 de fevereiro em São Paulo em formato híbrido: nas versões presencial e online. A iniciativa é um legado da pandemia que o Teatro Sérgio Cardoso oferece, abrindo possibilidade para que diferentes públicos, e localizados em qualquer parte do planeta, tenham acesso à sua programação.

Hamlet: 16 x 8. Monólogo de Rogério Bandeira. No Teatro Sergio Cardoso, presencial (Ingressos a 20 reais) e online (15 reais). Até 20 de fevereiro. 

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