Foto de Filipe Araújo/MINC

A 4ª Conferência Nacional de Cultura (CNC), realizada no dia 7 de março e que reuniu cerca de 5 mil produtores, artistas e trabalhadores da cultura em Brasília, divulgou hoje as 30 propostas aprovadas por sua plenária para serem encampadas pelo governo brasileiro. Sob o tema “Democracia e Direito à Cultura”, os debatedores escolheram 30 propostas prioritárias que estão em destaque no documento publicado hoje, divididas em seis eixos temáticos, e que foram aprovadas durante a plenária final da 4ª CNC. O Ministério da Cultura informou hoje que cumpriu o prazo regimental de 60 dias para publicação do resultado. “A Conferência aprovou 30 proposições que irão nortear a cultura nos próximos anos”, divulgou o Ministério da Cultura na ocasião do encerramento do encontro.

Os destaques entre as deliberações são os compromissos assumidos para a criação da Agência Nacional da Música, do Instituto Brasileiro de Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas e do Instituto da Língua Portuguesa, Libras e Braile Flammareon Cruz. Quando foi ventilada pela primeira vez, a ideia de se criar uma Agência Nacional de Música, nos moldes da Agência Nacional de Cinema e outras, foi criticada por embutir um efeito colateral, que seria o de esvaziar as atribuições da Funarte (hoje a responsável pelo estímulo às artes em geral) e, ao mesmo tempo, dar protagonismo a uma determinada área da cultura em detrimento de outras. As artes consideradas “pobres” ficariam reféns da boa vontade de cada governo.

O Instituto Nacional do Livro é uma proposta contida num projeto legislativo abandonado, o Projeto de Lei do Senado de número 294/2005, que pretendia criar ainda o Fundo Setorial do Livro, Leitura Literatura e Bibliotecas, bem como o fomento a ações para efetivar e fortalecer as diretrizes da Política Nacional da Leitura Escrita. A CNC fixou a recriação do Instituto Nacional do Livro com “um novo enfoque e missão adaptados aos desafios contemporâneos”. A proposta também fala em eevisar, atualizar, aprovar e garantir que as linguagens artístico-culturais sejam permeadas e articuladas com ações e políticas do livro, leitura, literatura e bibliotecas a fim de registrar, acessibilizar, difundir e fomentar os conhecimentos e saberes a curto, médio e longo prazo, fortalecendo os eixos do Plano Nacional de Cultura”.

De forma quase paradoxal, o documento também aprovou a criação da Agência Nacional de Fomento à Cultura e Economia Criativa, cuja função seria “viabilizar a acessibilidade e o financiamento de equipamentos para o desenvolvimento de produtos culturais e da economia criativa nos setores criativos supracitados”. Embora tenha abrangência, princípios e espírito imprecisos, essa outra agência aponta para um diagnóstico de estímulo a diversos setores, inclusive os de pouca ressonância comercial, ao contrário da Agência Nacional de Música, que abarcará um dos setores mais organizados da cultura nacional.

O documento com as 30 propostas da 4ª Conferência Nacional de Cultura – realizada pelo MinC e pelo Conselho Nacional de Política Cultural (CNPC), e correalizada pela Organização de Estados Ibero-Americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura no Brasil (OEI) e com apoio da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso Brasil) – tem uma inexplicável ausência: as políticas audiovisuais mal são mencionadas no resultado final. Isso ocorre porque a Agência Nacional de Cinema (Ancine) não enviou nenhum representante oficial ao debate, não levou subsídios para abastecer as reuniões e nem repercutiu as eventuais tomadas de posição da conferência. FAROFAFÁ, na ocasião, solicitou esclarecimentos sobre a ausência da Ancine na 4ª CNC, mas não recebeu resposta da Assessoria de Comunicação do MinC. A Ancine é hoje controlada por uma diretoria nomeada pelo antigo governo, e persiste em políticas de orientação retrógrada. A conferência também conclamou à participação dos sindicatos de trabalhadores do audiovisual (artistas e técnicos) no Comitê Gestor da Ancine, como representantes da sociedade civil.

O texto aborda a questão en passant. “Destacamos a urgência em abordar temas cruciais para o setor, como a regulação de Inteligência Artificial e a regulamentação das plataformas de streaming, cuja falta de atenção evidencia as fragilidades do atraso enfrentado pelo setor do audiovisual. Portanto, instamos que o audiovisual seja representado devidamente no Conselho Nacional de Política Cultural (CNPC) e que uma setorial própria seja estabelecida, visando assim garantir uma voz ativa e participativa neste importante órgão de formulação de
políticas culturais. O audiovisual desempenha um papel fundamental na construção do imaginário simbólico nacional e é essencial que haja um diálogo efetivo entre o audiovisual e as demais áreas culturais. A setorial do CNPC é o espaço ideal para essa interação acontecer, permitindo que o audiovisual dialogue e colabore com outras áreas, enriquecendo assim o panorama cultural do país”.

 Os temas mais candentes da atualidade, como a IA Generativa, que ameaça o copyright e os direitos de imagem do setor criativo, passam pelos eixos debatidos pela conferência, que fala em “Estimular marcos legais relacionados aos direitos autorais, direito de personalidade (imagem e voz) e propriedade intelectual, garantindo investimento e pesquisa em soluções digitais inovadoras para gestão inteligente e equilibrada, para transparência e acesso aos bancos de dados e algoritmos de empresas que trabalham com aprendizado de máquinas e inteligência artificial, assim como a justa remuneração de criadores cujas obras sejam utilizadas em ambiente digital, assegurando os direitos autorais relativos às novas criações digitais, excetuando criações feitas exclusivamente por inteligência artificial generativa. Além disso, garantir a ampla participação dos trabalhadores e fazedores de cultura na construção de uma legislação que acompanhe as novas linguagens culturais, incluindo a gratuidade no registro nacional, em formato digital, de obras”.

Uma outra proposta aprovada é a da criação de um programa federal de auxílio financeiro (bolsa artista), para apoiar e incentivar artesãos locais, artistas e técnicos de cultura em situação de vulnerabilidade social e famílias que possuam crianças e adolescentes participando
de projetos culturais. Também se destacou a criação de parcerias com instituições de ensino e pesquisa, públicas ou privadas, para a
outorga de títulos de notório saber e inclusão remunerada dos mestres e mestras da cultura popular como professores nas universidades, institutos federais e escolas das redes públicas, museus, arquivos e bibliotecas, colaborando com a efetivação da lei 11.645/2008.

Para a secretária dos Comitês de Cultura, Roberta Martins, responsável pela realização da 4ª CNC, a entrega do texto final para sociedade representa a conclusão da Conferência, mas ela lembrou que ainda há muito trabalho pela frente. “As 30 propostas prioritárias são o pontapé inicial para a elaboração do Plano Nacional de Cultura. O texto aprovado na 4ª CNC representa parte dos anseios da sociedade civil e está na direção do que o MinC entende que é necessário fazer para aumentar a potência da cultura como um setor que contribui para construção social e para o fortalecimento econômico do país. Agora, iniciamos um novo processo, de colher mais contribuições, contando com a participação popular, para planejar políticas culturais para os próximos 10 anos”, ponderou.

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