Há dois meses, a Cinemateca pegava fogo. Nada aconteceu depois

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Galpão incendiado da Cinemateca Brasileira em São Paulo

Nesta quarta-feira, 29, completam-se dois meses do incêndio que devastou um galpão de armazenamento de filmes e documentos da Cinemateca Brasileira em São Paulo, na Vila Leopoldina. Após dois meses da grande comoção em torno da tragédia, a situação no local é atualmente de descaso e abandono. Objetos calcinados pelo fogo seguem ao ar livre (grande parte do telhado foi destruído), as janelas têm vidros destroçados, as dependências estão sujas e a bagunça é generalizada dentro daquilo que já foi uma reserva técnica do audiovisual. Um único vigia faz a segurança do galpão.

Mas o pior é a inação das autoridades. O responsável pela Cinemateca Brasileira é a Secretaria Especial de Cultura do governo federal, que um dia após o fogo lançou um edital de chamamento para escolher um gestor para a instituição, mas o resultado só deve sair em dezembro. Até lá, será tarde demais para qualquer intervenção no prédio queimado.

A investigação do incêndio está nas mãos da Polícia Federal e a perícia, a cargo do Instituto Nacional de Criminalística. Até agora, não se divulgou nada conclusivo, o que complica as possíveis intervenções emergenciais no prédio. A apuração de responsabilidades individuais só será iniciada após um novo gestor assumir a Cinemateca. No dia 3 de agosto, a Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados entrou com uma queixa-crime contra o secretário especial de Cultura, Mario Frias, por negligência na condução da Cinemateca, mas isso também não teve conclusividade.

No dia 7 de agosto, mais de 500 pessoas foram para a frente da sede da Cinemateca, na Vila Clementino, em São Paulo, para protestar contra o governo federal. A situação mobilizou moradores, intelectuais, cineastas, atores, técnicos. Pressionado momentaneamente, no dia 18 de agosto, o secretário Mario Frias anunciou uma suplementação de verba para a futura gestão da Cinemateca Brasileira, saindo do valor anunciado pelo edital (R$ 10 milhões) para R$ 14 milhões.

Outras iniciativas para socorrer o maior acervo audiovisual da América do Sul (250 mil rolos de filmes e 1 milhão de documentos) não saíram do esboço. De acordo com um termo firmado com a Justiça Federal em 2020, o governo deveria resolver pendências com a Sociedade Amigos da Cinemateca (SAC) relacionadas a projetos anteriores para que pudesse ser formalizada a doação de serviços emergenciais e transitórios. As pendências  foram sanadas com o parcelamento (e quitação) de uma dívida que a SAC tinha com o antigo Ministério da Cultura, mas não houve avanço na tutela.

Essa semana, o Ministério Público Estadual (MPE) negou pedido da deputada estadual Isa Penna (Psol) para atuar no caso por meio de sua Promotoria de Justiça do Meio Ambiente. A deputada argumentava, em seu pedido, que a proteção do patrimônio público cultural é de competência de todos os entes da federação, nos termos do artigo 23 da Constituição Federal. O MPE negou a intervenção justificando que não tem a competência para imiscuir-se no caso, pelo fato de a Cinemateca fazer parte da administração pública Federal. Também anotou que o Ministério Público Federal já diligencia os acontecimentos desde 15 de julho de 2020 e, nove dias antes do acidente, tinha notificado o governo federal quanto à possibilidade de incêndio.

A audiência entre o MPF e os responsáveis pela Cinemateca aconteceu no dia 20 de julho, na 1a Vara Federal Cível de São Paulo, no âmbito de uma ação civil pública apresentada pelo Ministério Público. Da primeira reunião, em 2020, participaram o juiz federal Marco Aurelio de Mello Castrianni, o procurador da República Gustavo Torres Soares – que assina a ação contra o governo –, um advogado da União, o secretário adjunto da Secretaria Especial da Cultura, a diretora do Departamento de Políticas Audiovisuais e representantes da Associação de Moradores da Vila Mariana e da Associação Paulista de Cineastas.

O MPE cita reportagens sobre o caso para comunicar o andamento das providências. “O Ministério Público Federal (MPF) acompanha de perto as consequências do recente incêndio em um dos depósitos da Cinemateca Brasileira. Ainda estão sendo constatados os prejuízos. No atual momento devem ser priorizados o salvamento do material restante e a prevenção de nova tragédia. Só depois de finalmente implantada uma nova entidade gestora para a Cinemateca se deverá pensar na apuração de responsabilidades individuais, embora a Polícia Federal já esteja, cautelarmente, cuidando da perícia criminal no local, para ser investigada a causa do incêndio. O senso de urgência do MPF continua o máximo, como formalizado ao Poder Judiciário desde 15 de julho do ano passado, data do ajuizamento de ação civil pública, com requerimento de medidas liminares emergenciais, então negadas pela Justiça Federal de primeira instância”.

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