Artur Nabantino Gonçalves de Azevedo. Reprodução
Artur Nabantino Gonçalves de Azevedo. Reprodução

Apesar de dar nome a um dos mais importantes teatros do Brasil, o dramaturgo maranhense Arthur Azevedo (1855-1908) ainda é, infelizmente, menos reconhecido do que deveria, como afirma a professora doutora em Teatro Angela de Castro Reis, titular do departamento de Ensino de Teatro da Unirio, em conversa exclusiva com Farofafá.

De hoje (6) até a próxima quarta-feira (8), às 19h, ela ministra a oficina online “Arthur Azevedo e o teatro brasileiro na virada do século XIX”, em que destacará a produção do autor no teatro musicado brasileiro, além de traçar as linhas mais importantes de sua bem sucedida carreira no jornalismo e no teatro.

Realização do Centro Cultural Vale Maranhão, a oficina disponibiliza 50 vagas a interessados/as em geral. As inscrições devem ser feitas pelo e-mail [email protected], com o envio de nome e telefone do/a interessado/a.

A professora doutora Angela de Castro Reis, que ministra oficina de hoje a quarta-feira. Foto: divulgação
A professora doutora Angela de Castro Reis, que ministra oficina de hoje a quarta-feira. Foto: divulgação

TRÊS PERGUNTAS: ANGELA DE CASTRO REIS

ZEMA RIBEIRO – Uma coisa que percebo em comum entre a época em que Arthur Azevedo atuou no teatro e na imprensa é que, muitas das vezes, os próprios autores de teatro exerciam o papel de críticos. Você concorda com essa percepção? E a que você credita isso?
ANGELA DE CASTRO REIS
– Sim, eu concordo com essa percepção. Tem uma questão bem específica da história da crítica no Brasil, que não é minha especialidade, então eu não vou entrar nisso, mas o que aconteceu também é que havia, no século XIX, um número imenso de periódicos, imenso, imenso, jornais aos montes, revistas também, muitas, e também não havia um contingente tão grande assim de pessoas para trabalharem naquele monte de jornais. O próprio Arthur Azevedo fazia muito isso, o que acontecia é que às vezes havia poucos jornalistas, um ou dois, que se revezavam entre todas as funções daquele periódico, então daí também a febre dos pseudônimos no jornalismo do século XIX, por que eles precisavam escrever várias colunas, falar. Então é muito interessante que o próprio Arthur Azevedo, tem relatos, que ele criticava as próprias peças dele, às vezes de maneira muito bem humorada, até irônica, mas por isso, por que era preciso que poucas pessoas exercessem muitas funções no jornalismo.

Qual o lugar exato de Arthur Azevedo na dramaturgia brasileira? É um autor menos valorizado do que deveria?
Sem dúvida nenhuma. O Arthur Azevedo foi vítima de preconceito da intelligentsia da época, da qual ele fazia parte. Ele inclusive era um paradoxo ambulante, por que ele fazia parte daquele grupo de intelectuais, Machado de Assis e tal, eram considerados o máximo da intelectualidade brasileira, fundadores da Academia Brasileira de Letras, e ao mesmo tempo era o principal autor popular do período. Então ele foi muito atacado por vários colegas, considerado responsável pelo rebaixamento da dramaturgia etc. O que acontece é que essa intelectualidade tinha uma expectativa de que o teatro brasileiro fosse igual ao europeu e naquele período, no fim do século XIX, já estava ali fazendo um teatro, os dramas românticos, que tinha como tema a burguesia, estavam voltados para questões da burguesia. O Arthur Azevedo não participa desse projeto, quer dizer, participa em parte, mas ele se volta para um teatro de matriz popular, um teatro de longa duração, voltado, que buscava retratar, falar e colocar em cena todas as parcelas da população brasileira. Então, ele fazia um teatro também que estava de acordo com a cena, que se construía em cena. A dramaturgia do Arthur Azevedo não seguia aquele padrão europeu de ser um texto que deveria durar para sempre, uma joia literária. Ele fazia textos que se completavam com a cena, que estavam em jogo com a cena, por isso eram considerados menores. Como a crítica teatral do século XX, e também os historiadores de teatro que começam a se constituir na mesma época da crítica moderna, nos anos 40 do século XX, se baseiam nesse pressuposto, Arthur Azevedo sempre foi visto como um autor, assim, um animador, um grande animador cultural, mas não um bom dramaturgo. Então, respondendo ao fim à sua pergunta, eu acho que ele não tem o lugar que ele deveria ter: ele é uma figura importantíssima no nosso teatro e não é valorizado como deveria, não tenho dúvida disso.

Quais os principais cruzamentos entre a atividade jornalística e teatral de Arthur Azevedo, no sentido de sua obra acompanhar o cotidiano, as transformações sociais e a política de sua época?
O cruzamento entre a atividade jornalística e teatral de Arthur Azevedo é completo, total. O teatro do século XIX ainda é um teatro muito ligado ao jornalismo, não existia a dramaturgia como uma atividade autônoma, o cara que apenas escrevia para teatro, isso não existia. Todos os dramaturgos do século XIX são também jornalistas. Especificamente o teatro de Arthur Azevedo é um jornalismo encenado. Se você pensar que as revistas de ano, chá de revista, começa como revista de ano, que eram encenações dos principais acontecimentos do ano anterior ou do ano que se findava, por que as estreias aconteciam no fim de dezembro ou no início de janeiro, no máximo em fevereiro, as revistas eram coladas na atualidade, como o jornal. Ninguém está interessado em ler as notícias do mês passado, a gente quer saber o que está acontecendo agora, o que acabou de acontecer. Claro que quando o jornal era impresso, no século XIX, o prazo de validade era um pouquinho maior. Mas ainda assim existia uma ligação imediata com a atualidade, que é própria do jornalismo. Então, o teatro do Arthur Azevedo é completamente jornalístico. As revistas de ano, sem dúvida, mas tudo o que ele escrevia, ele estava ligado, os contos dele, as crônicas, ele tem uma ligação imediata com a cidade, com os acontecimentos. Ele era uma pessoa extremamente atenta ao que acontecia à sua volta; então, mesmo quando ele escrevia crônicas teatrais, ele estava falando do que acontecia ali na cidade, no seu entorno, na sociedade na qual ele vivia. É intrínseco, eles são muito colados: o teatro do Arthur Azevedo e o jornalismo, sua atividade jornalística, são quase que expressões em suportes diferentes, na cena teatral, e na folha impressa. O suporte é diferente, mas a expressão é a mesma, ele está falando a mesma coisa.

Serviço: oficina online “Arthur Azevedo e o teatro brasileiro na virada do século XIX”. Com a professora doutora Angela de Castro Reis. De hoje a quarta-feira, pela plataforma zoom. 50 vagas. Inscrições gratuitas pelo e-mail [email protected]
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