Claudette Soares

A voz aveludada da cantora carioca Claudette Soares completa 82 anos (e 72 de carreira) e emoldura uma história plena de sobressaltos. “Princesinha do baião” quando iniciante, nas asas da moda lançada por Luiz Gonzaga, ela começou a gravar em 1954, viu a bossa nova surgir em 1958 e adaptou-se à novidade. Para estrear em LP, demorou tanto quanto a colega mais adaptada Nara Leão, e só viu Claudette É Dona da Bossa surgir em 1964, com canções de Tom JobimVinicius de MoraesBaden Powell, Roberto MenescalRonaldo BôscoliDurval Ferreira, Bebeto CastilhoTheo de Barros Silvio Cesar. Esse último ela homenageia no disco que marca os 82 anos, o recém-lançado Se Eu Pudesse Te Dizer Tudo Que Sinto (Discobertas).

Depois de gravar Marcos ValleCarlos LyraEumir DeodatoOscar Castro NevesPingarilho e outros integrantes da patota da bossa, deu uma primeira guinada em 1968, ao lançar, à revelia de muitos, o álbum Gil-Chico-Veloso por Claudette Soares, devotado às obras emergentes dos jovens Gilberto GilChico Buarque Caetano Veloso. O flerte tropicalista afastou-a da bossa mais tradicional e culminou numa série explosiva de discos populares, que misturavam baião, jovem guarda, samba-rock, toada moderna e pilantragem e onde Claudette gravou Jorge BenRoberto Carlos, TaiguaraAntonio Adolfo & Tibério GasparChico Anysio Nonato Buzar, Cesar Camargo Mariano, Luiz Gonzaga, Dorival Caymmi, Nelson Ferreira, Arthur VerocaiTim MaiaIvan LinsAldir Blanc, SivucaMilton Nascimento, Edu LoboFrancis HimeCarlos Imperial e muitos outros.

O desvio da estrada principal bossa-novista custou-lhe certa marginalização dentro do sistema de gravadoras, e Claudette desacelerou após uma dupla de LPs gravados com o mestre Dick Farney (em 1976 e 1977). Novo impulso ela só foi tomar em anos recentes, a bordo do desmonte da indústria fonográfica e da resistência de selos pequenos e independentes, que lhe têm bancado gravações a granel. Ainda neste ano deve sair um segundo CD, dessa vez dedicado à obra de Maysa. Leia abaixo entrevista com Claudette Soares.

Claudette nos anos 1960
Claudette nos anos 1960

Pedro Alexandre Sanches: Vamos começar falando do disco novo? Por que Silvio Cesar?

Claudette Soares: Ah! Eu adoro. Cheguei a gravar três músicas dele. Um dia, na casa do meu produtor, Thiago Marques Luiz, nós estávamos pensando, puxa, que coisa linda, ele tem tanta música bonita. É interessante, porque praticamente tem músicas só dele, não tem parceiros. Tem um ou dois só, como Ed Lincoln, do conjunto do qual ele foi crooner junto com Emílio Santiago. Eu cantei com Ed Lincoln, claro. Sou a cantora dos pianistas, dito pelo Ruy Castro. Sou a destruidora de lares dos pianistas, segundo Ruy Castro, meu guru (ri). Mas tenho mesmo essa formação, por causa talvez de Tom Jobim, da bossa nova. Minha música é pianística. O piano é muito completo, dá mais condições harmonicamente falando. E aí saiu a ideia, de um show de repente. Mas um show, sem registrar? Thiago é muito homem de disco. “Que tal a gente fazer um CD?” Fiquei enlouquecida, porque esse sonho eu persigo, como vários que venho fazendo.

PAS: Não se fala muito do Silvio ultimamente…

CS: Exatamente. Eu fui a primeira cantora a documentar, ninguém até agora fez um disco da obra dele. Graças a Deus, ninguém lembrou de fazer um disco cantando Silvio Cesar. Acham que ele é muito elitista, e a música “Pra Você” foi gravada pelo Roberto Carlos, fez sucesso com Roberto. Estou muito feliz, porque é mais um sonho realizado. Tem músicas lindas. É engraçado que ele não é popular.

PAS: Como você, ele teve um período bem popular, com influência do samba-rock.

CS: Exato. Mas quando você canta algumas coisas dele, todo mundo lembra. Agora, o nome Silvio Cesar, é mais difícil, talvez porque… Silvio sempre foi advogado. Ele trabalha ainda como advogado. Não sei se ele se achava mais compositor, mas sempre teve uma voz linda, sempre cantou muito bem. Ele não teve uma meta, como eu, de só cantar, só cantar.

PAS: De cara você quis convidar Silvio pra cantar uma música?

CS: Ah, sim. Nem fui eu. Eu tive a maior felicidade. Na hora que pedimos a autorização pra ele, ficou enlouquecido, e falou: “Eu quero gravar uma”. Jura que você vai gravar?, escrever a contracapa, você vai ter que escrever. Ele disse na hora: “Tem que ser o ‘Nós Dois'”. Então tá bom, gravamos juntos essa música.

PAS: Ele tem umas letras fortes, né?, “Eu Quero Que Você Morra”…

CS: É muito louco, né? É uma coisa linda, eu já falei muito essa frase, “eu quero que você morra”, dentro de mim, pra eu ficar livre. É uma coisa simbólica. Não sou uma pessoa muito de dramalhão, mas Mauro Ferreira disse que eu caí no dramalhão, seria meio brega. Minha leitura não é muito assim, né? A música pode levar facilmente, mas quando você canta aparece a doçura, a beleza… Silvio Cesar é muito chique como homem, sempre foi, mas a música dele também é. Parece que leva pro lado do dramalhão, mas não.

PAS: E nós diríamos que é um disco de bossa nova?

CS: Eu levo muito pra bossa, sempre levei. Mas é o sambalanço dele. A parte de samba, de balanço, é bem ele. Foi um movimento que veio depois da bossa nova.

PAS: Com Ed Lincoln.

CS: Com influência do Ed Lincoln e do conjunto que eles tinham com Silvio e Emílio Santiago de crooners. Depois veio o Orlandivo, que se juntou ao sambalanço.

PAS: Você já tem um próximo disco pronto também? Pode falar alguma coisa?

CS: Ah, pode. Você vê que coisa maluca, o mundo é ruim pra quem não sabe esperar. Minha maior vingança é estar viva. Quanto disco meu está saindo, né? É uma coisa inexplicável. Você acha que eu imaginava que com 82 anos ia estar cantando? Nunca.

PAS: E com a voz intacta.

CS: Pois é, ainda estou com a voz! Antes do disco do Silvio Cesar, fiz um show cantando Maysa, no ano passado. Como o nome da Maysa é forte – a música é, mas ela, a Maysa… Esse disco vai sair agora, no fim do ano ou no começo do próximo. Que coisa maravilhosa. Já tem muita coisa pela frente. Me cobram muito um disco de Caetano VelosoGil e Chico. Tem muita coisa, só peço saúde, e a minha voz ainda está podendo.

PAS: Saúde está bem?

CS: Graças a Deus.

PAS: Qual é o segredo, Claudette?

CS: Ah, é gostar de viver. Nunca vivi muito de passado. Você vê pela minha discografia meio pequena. É muita loucura, de repente a moda é isso, eu vou cantar isso, vou me perder. Sempre fui muito entusiasmada pelo meu trabalho. Agora tenho o Baile da Claudette, que venho fazendo há dois anos, e eu canto “Baba Baby” (de Kelly Key, 2001), querido. Mas dentro da minha voz. As pessoas pedem. Gente, eu canto “Baba Baby” nesta altura da vida! São o que antigamente chamava-se de pocket show, eu aprendi muito com Miéle e Ronaldo Bôscoli, nos shows que a gente fazia, como o 1º Tempo: 5 x 0, onde tive a sorte de lançar o Taiguara pro disco. Daí talvez venha. Mas acho que o aprendizado de falar rápido, pra dar tempo, foi com a televisão, que sempre foi cruel. Você é convidada pros programas, ai de você se não falar rápido.

"1º Tempo: 5 x 0" (1966), de Claudette Soares e Taiguara
“1º Tempo: 5 x 0” (1966), de Claudette Soares e Taiguara

PAS: Você tem o hábito de falar rápido?

CS: É, pra dar tempo.

PAS: Nós temos todo o tempo que precisar hoje, viu?

CS: Pois é. Às vezes tem um tema no programa, você vai, fala do tema, quando chega pra falar da sua musica é muito rápido. Então sempre aprendi a falar logo enquanto dá, porque depois não vai dar mais tempo. Susana Vieira fala mais rápido do que eu, que maravilha (ri).

PAS: Quero lhe perguntar um pouco do seu passado também, pra falar de uma história tão rica. Primeira coisa é que você é uma carioca que veio parar em São Paulo. Está aqui há quanto tempo?

CS: Desde os anos 1960. Eu vim aos 20 e poucos anos.

PAS: Em qual Rio de Janeiro você nasceu? Como era?

CS: Eu nasci numa maternidade em Laranjeiras, está até hoje lá, mas sou carioca de Copacabana. Copacabana é um bairro que eu amo. Ipanema, Leblon, Barra, tudo é lindo, mas Copacabana… E eu morava perto do Copacabana Palace. Eu via aquelas estrelas internacionais, aquelas cantoras. Sempre tive o problema sério de nunca ter conseguido cantar lá. Naquela época, você cantava e mudava a roupa, mas as roupas lindas, longas ficavam pra você. Eu dizia “ah, eu quero cantar”, mas era por causa da roupa, entendeu? Nunca consegui.

PAS: Porque não deu tempo, ou o quê?

CS: Não. Sempre teve os cortas, corta daqui, corta de lá. Sempre, até hoje cortam, né? A gente vai aprendendo que não é muito como a gente quer. Não consegui realizar esse sonho. Já fui ao Copacabana Palace, mas nunca tive a sorte de cantar lá. Mas nunca fiquei muito presa, sempre quis fazer coisas diferentes. Tanto que na década de 1960, no auge, vou gravar “Como É Grande o Meu Amor por Você” (1967), do Roberto Carlos, e Jorge Ben, com os sambas-rock. No auge da bossa nova, eu gravei o primeiro samba-rock, “O Cravo Brigou com a Rosa” (1969), com Os Originais do Samba, do Mussum. Jorge Ben Jor sempre deu apoio, naquela batida, nos vocalises, até chegar a “Que Maravilha” (1969)…

PAS: Passando por “Carolina, Carol Bela” (1969), que décadas mais tarde virou sucesso com DJ Marky e os DJs de música eletrônica.

CS: Nossa! Eu adoro estar sempre na contramão. É muito engraçado isso. A gente fica ouvindo hoje Silvio Cesar, aquelas leituras dele, é uma bossa que não é uma bossa, com algo a mais. Antonio Adolfo também tinha isso. Eu gravei “Canoeiro” (1970), do Dorival Caymmi, e o Dorival ficou doido. Encontrei ele na Odeon: “Como você levou diferente!”. Era moderno, né?

PAS: Você fugia, e foge, do samba mais tradicional, não é? Tem uma razão?

CS: Engraçado. Talvez pela cabeça. Jamais gostaria de ter nascido agora, de ser uma cantora jovem hoje. Elas não vão ter realmente a sorte que eu tive. Eu cantei com os maiores músicos. A minha cabeça sempre foi de músico. A minha casa é frequentada até hoje por músicos. Por exemplo, quando fui substituir a Sylvia Telles no Hotel Plaza, onde – o Carlos Lyra graças a Deus fala isso muito bem – nasceu a bossa nova. O Beco das Garrafas vem depois. Ali no Plaza ela cantava com Luiz Eça, gente, para com isso, e eu fui pra substituí-la. Era uma grande amiga, e me coloca lá no lugar dela, minha grande madrinha. Eu já cantava baião na Tupi, era a “princesinha do baião”. Mas eu cantava aquele balãozinho diferente. Sivuca era um grande acordeonista e tocava piano muito bem, fazia as coisas muito jazzísticas. Minha criação foi jazzística, apesar de eu não ser cantora jazzística. Aprendi com Frank Sinatra, com aquelas cantoras maravilhosas, Ella Fitzgerald, todas.

PAS: O começo com baião foi porque o baião estava muito na moda?

CS: Muito na moda, e eu fui escalada. Ali era um passo pro contrato. Eu disse: por que não? Afinal de contas, Luiz Gonzaga é maravilhoso. Ele me adorava, dizia que eu era metidinha a besta. Eu já vivia com aquela turminha, Durval FerreiraMaurício Einhorn, a gente já vivia na turma da bossa nova. Depois eu faço o primeiro show na faculdade de arquitetura, pelo meu primeiro grande anjo da guarda, que foi o Ronaldo Bôscoli. Ele dizia: “Você nunca vai ser uma cantora de baião”. Ele brincava muito comigo. Mas eu sempre gravei, sempre tem um baião nos meus discos.

PAS: Nunca renegou.

CS: Exatamente. Faziam muita coisa comigo, a turminha. Tinha uma turminha, diziam “a princesinha do baião”, como se fosse pejorativo. Muitos faziam isso comigo. Não é o caso de citar pessoas conhecidas dentro do meio musical. Eu dizia: com muita honra, sou mesmo.

PAS: Se eu fizer uma comparação muito ruim, pra eles é como se você cantasse “Baba Baby” na época?

CS: “Baba Baby” eu até acho bonitinha, viu?

PAS: Mas o baião era lindo de morrer.

CS: Exatamente. É como se fosse alguma coisa completamente horrorosa, fora dos padrões musicais, uma coisa brega, vamos dizer assim.

PAS: É como a bossa nova compreendia o baião, não?

CS: É  como compreendiam. Agora você imagina essa mesma turma quando eu canto Roberto Carlos, em 1967. Ai de mim. Foi meu divisor de águas, e Roberto fez duas músicas pra mim, “De Tanto Amor”, que foi aquele sucesso, e “Você”. Canto mesmo, nunca tive problema nenhum. Se o compositor que não pertence a essa turma moderna, entre aspas, chegar e me mostrar uma música, você acha que vou dizer que não? Porque ele é o fulano? O que importa é o que ele está trazendo pra mim. Imagina, nunca tive mesmo. Eu sempre cantei muito o que eu quero. É claro que quando você era contratada pelas grandes gravadoras, até dizer que não queria… Então tem muito pouca coisa que gravei e que não era aquilo, não era aquele arranjo, mas eu tinha que me acomodar. Acho que hoje é o maior período da minha vida. Essas cantoras jovens não vão saber o que é ter um contrato e ser obrigada, muitas vezes. Eu prefiro ter essa minha discografia pequena, porque pelo menos é muito honesta, dentro do que eu pude fazer.

PAS: Você começa a cantar com 10 anos, portanto em 1947. E o primeiro LP só vai sair em 1964. Que demora é essa?

"Claudette É Dona da Bossa" (1964)
“Claudette É Dona da Bossa” (1964)

CS: Olha, está vendo? O mundo é ruim pra quem não sabe esperar. Teve uma época que eu falei muito mal dessa gravadora do Recife, a Rozenblit. Eu só não, éramos eu, o Jorge Ben Jor, o Tim Maia. Ela tinha filial aqui em São Paulo, a gente assinou contrato, mas a gente não tinha empresário, advogado. Os contratos eram unilaterais, vim a saber quando João Araújo, o pai do Cazuza, me levou pra Philips. Lá nunca dava, era sempre renovado. Foi muito duro pra sair da gravadora.

PAS: Depois de sair esse disco? Eu queria entender melhor por que ele demorou tanto pra sair.

CS: Exatamente por isso. Eu gravei muita coisa no Rio, em 78 rpm. A bossa nova estava no auge, era a música disso e daquilo, vai vender… Graças a Deus, quero falar sempre, ela não pertence mais ao Brasil, ela é internacional, chique pra vida inteira. Aqui ela seria um movimento velho, né? Quem queria gravar bossa nova? Tinha o rock’n’roll, a Celly Campello, que era uma graça, no auge. Ninguém queria. Ninguém queria investir.

PAS: E você queria cantar bossa nova?

CS: Claro. A bossa estava estourada aqui em São Paulo, no João Sebastião Bar, eu vim pra São Paulo pra fazer o movimento, a mando do Ronaldo Bôscoli, “São Paulo é um país”. Adoro ser carioca, mas adoro São Paulo. E aí demorou muito pra eles terem coragem de lançar. E o Fausto Canova, que deu o título “a dona da bossa”, era um jornalista, e ali eu fiz um segundo disco, com vários músicos. No primeiro disco, eu já cantava com Pedrinho Mattar Walter Wanderley, mas quando chego e vejo um menino de 18 anos, que era Cesar Camargo Mariano, digo “não!, você vai gravar comigo!”. Do primeiro disco saíram vários músicos, foi aqui que lancei Cesar como músico e arranjador. Mas ele não teve coragem de fazer o disco inteiro, disse “só faço seis, por favor”. A outra metade eu gravei com a orquestra do Erlon Chaves, que era um grande maestro. Logo depois a gente veio fazendo vários discos com Cesar, que tinha uma batida completamente diferenciada de tudo, até hoje. Por isso que demorou. Fiquei com muita raiva dessa gravadora que não me deixava sair, mas agradeço, porque eles tiveram coragem de investir.

PAS: Estou aqui pensando que os moços da bossa nova gravaram antes das moças. Nara Leão também foi começar só em 1964. Era difícil ser mulher e querer cantar bossa nova?

CS: Que graça que era a Nara. Não é por ser mulher, não. A bossa nova era difícil. Porque tinha uma pressão muito grande. Os inimigos – e isso é dito pelos grandes psicólogos – sabem antes de você. Eu não sei por quê. Quando você está com um projeto escondido, não precisa esconder, eles já sabem antes que vai acontecer alguma coisa. Eles sabiam que isso seria o maior movimento musical de todos os tempos, de todos os séculos. E tinha um Tom Jobim, um Vinicius de Moraes, um Carlos Lyra e outros e outros. A mentalidade musical ampliou. Ah, porque era música de universitário, eles eram mais inteligentes. Não eram, não. A música era diferenciada. O João Gilberto, e tudo. O que você faz com isso? Vamos acabar, tem que destruir isso. Isso é um complô, cortando mesmo. Realmente, quando chega um homem como Wilson Simonal, musical, espetacular, o primeiro cantor do Brasil que chegou pra fazer uma abertura do Sergio Mendes – ele era menor, não tinha tanto sucesso como Sergio Mendes. E aí ele arrasa, não sobrou pra Sergio. Chegou lá, levantou a galera, agora é fácil todo mundo fazer. O que se faz? Não, ele está crescendo muito. Como se destrói? Vamos inventar que ele é isso, isso, isso. Foi provado que não, mas depois de destruí-lo. Comigo, tive sorte, sabe por quê? Se alguém ficou muito incomodado porque a Censura achava que eu cantava diferente e liberava tudo pra mim, problema sexual deles, não é? Eu queria ver o disco sair, não fiz nada pra eles. Por exemplo, eu estava num teatro nos anos 1970 cantando “Apesar de Você”. Eles tiraram de todo mundo. Você tinha que apresentar pra Censura. Eu cantava. “ah, com ela pode” (ri).

PAS: Você cantou, mesmo a música proibida?

CS: Claro! Eu cantei na temporada inteira no teatro, quase um ano, “Apesar de Você” e “A Tonga da Mironga do Kabuletê”. Porque a Elis Regina, que era baixinha, era censurada, porque o jeito de cantar era muito politizado. Tinha uma força, né? Comigo eles não achavam. Com outros também. Acho que o Milton Nascimento também, pela voz melodiosa. Não sei. Eu nunca tive esse problema. A preocupação é só de cantar, cantar, cantar. Mas, por exemplo, quando gravei um disco cantando Caetano, Gil e Chico, você não sabe o que eu sofri. Teve gente que disse, até dentro de uma certa mídia, “imagina, cantar um negócio que não tem nada a ver”.

PAS: Achavam que não tinha nada a ver com você?

CS: Eu não queria esse rótulo de cantora de bossa nova como a Nara não quis. A primeira vez que pude, eu disse, para o jornalista Artur Xexeo, no Globo, “eu sou a ovelha negra da bossa nova”. E sou. Eu vim da bossa nova, canto bossa nova, mas sempre quis fazer algo mais, como a própria Nara. Ela cantou sambistas que eram tão considerados menores naquele momento. Eu sempre quis ser chique, fazer uma leitura moderna. A Sylvinha já fazia isso, eu sou dessa escola. Sou geminiana, né? É meu jeito, que é que eu posso fazer? Eles falaram que eu era oportunista. Que só o Chico tinha meu perfil, Caetano e Gil não. O tempo provou que tudo bem, que não tinha nada a ver. E vocês aguardem, que grandes surpresas virão. Vocês nem imaginam. Eu tenho que estar sempre fazendo alguma coisa, eu preciso disso, mas não saindo de dentro daquele círculo musical, de outros compositores jovens que vêm chegando.

PAS: Você citou Simonal, e há outros artistas negros, como Alaíde Costa Johnny Alf, que tiveram dificuldade também de se colocar na bossa nova.

CS: A Alaíde vai te falar isso, não estou falando demais, mas eu e ela ficamos sempre à parte. Tirando Tom Jobim e Vinicius, esse grupo sempre deixou a gente, sempre discriminou, a partir do momento que nós viemos pra São Paulo. “Ah, elas são paulistas.”

PAS: A explicação foi essa? Você, Alaíde e Johnny vieram pra São Paulo.

CS: Tudo que aconteceu no Rio depois, tantos anos de bossa nova, nunca fomos chamadas. E eu estou dormindo na pia, de tão preocupada que fico. O santo anjo da guarda Thiago faz o meu disco com Alaíde. Até Faustão falou duas vezes. Quando vim, eu chamei Alaíde, “vem pra reforçar”.

PAS: Por que você veio?

CS: Porque Johnny Alf e Dick Farney já estavam aqui, mas eles nunca fizeram coisa de movimento. Então a gente começou esse movimento, com grandes jornalistas, pra reforçar o que era o movimento que rolava no Rio. Eu nunca fiquei preocupada com essa discriminação. Estou dizendo por mim, já que tenho 82 anos, posso falar. Vou falar o seguinte: eu tocava muito em novelas da Globo – aliás, não altera nada hoje se tocar ou não tocar, porque o mundo mudou muito. Mariozinho Rocha, que foi meu grande diretor na Odeon, produtor dos discos com o Dick, disse uma vez pra mim: “Você virou paulista”. Não entendi por quê. Ele recriminava muito eu e o Dick. A partir daquele momento, enquanto ele esteve lá, eu nunca mais entrei em nada. Ele saiu, e eu estou viva pra ver. Eu digo o seguinte: o que eu preciso é saúde, é continuar com minha voz, e preciso disso, de pessoas como Thiago Marques Luiz, gravadoras que acreditam, como a Discobertas, que lançou meu disco novo, a Kuarup, que lançou o disco com Alaíde (em 2018). Eu preciso disso, e de palco, e do público que vem. Quando vim pra São Paulo, com 20 e poucos anos, eu já não gostava de cantar em televisão, porque eu era “uma gracinha”, imagina agora com 80. Não precisa me chamar. Eu quero palco, eu gosto de palco e de estúdio de gravação. Mas se eu não tivesse público como é que eu ia cantar, viver da minha música? Tem gente que vai ver a gente, né? Eu gosto de desafio, acho que a resposta é essa, gravando. Ano que vem vai ter uma bomba, uma coisa sensacional que está por vir. É isso que faz a gente ficar viva, com vontade de trabalhar sempre. É como eu digo, enquanto eu puder cantar, estiver no palco, de sapato alto, eu vou.

PAS: Como foi abrir mão da praia de Copacabana pra vir morar aqui?

CS: Aí doeu muito. Minha mãe dizia que fui trocada na maternidade, porque gosto de frio, não bebo chope – gosto de vinho e de uísque. Foi um susto, eu cheguei aqui no final de 1960. Minha mãe enlouqueceu, meu pai sempre dando força. Eu disse: “Mãe, eu tenho que acreditar”. Eu disse: Claudette, você vai ser mais uma cantora, nunca vai ser musa de bossa nova no Rio. Você também tem cara de não querer muito. Então vai pra São Paulo, você vai criar uma história, todo mundo vai ver que você trouxe a bossa nova. Tudo que eu tive, o DVD, o livro escrito pelo Rodrigo Faour, tudo foi pra contar essa história. Quando chamei Alaíde pra vir também muita gente falou: “Você está louca, vai trazer uma cantora maravilhosa, sua concorrente?”. Mas não existe isso. Alaíde agradece até hoje ter vindo pra São Paulo. Eu vou sempre ao Rio, nunca deixei de estar presente, mas eu tinha que vir. Acho que a minha história fonográfica começa em São Paulo, a partir do Cesar.

PAS: O segundo disco na Rozenblit tem muitas músicas do Marcos Valle

O segundo LP, "Claudette Soares" (1965)
O segundo LP, “Claudette Soares” (1965)

CS: Ah, tem. “Ao Amigo Tom” (1971) ele fez pra mim. Mas musicalmente minha vida começa em São Paulo. A partir do Cesar, me desculpe, é que entro no mundo de gravação mesmo. E sempre os grandes, Antonio Adolfo, João Donato… Por isso que eu digo que se estivesse começando uma carreira hoje eu acho que não seria cantora. Seria muito difícil pra mim. Não estou vivendo de passado, pelo amor de Deus, mas tenho muita pena dessas meninas que estão chegando agora, porque a informação musical… Se não correr atrás, se não ouvir… Eu venho de ouvir rádio, meu pai era gerente de vários cinemas chiquérrimos nos anos dourados da Cinelândia. Ele me jogava, às vezes o filme era proibido e eu assistia escondida. Eu ficava vendo aqueles musicais, Doris Day, Sinatra, meu Deus! Eu sou igual ao Roberto, canto por causa de Sinatra. Amo Tony Bennett também. Meu pai, tadinho, tinha que comprar aqueles discos, disco importado era muito caro. Comprar o som era caríssimo. Eu devo muito à cabeça musical do meu pai. Sou muito feliz de ter nascido quando nasci. Talvez por isso gosto muito mais de músico, por causa dessa convivência jazzística. Até hoje, quando gravo com Leandro Braga e tantos outros. Só agradeço.

PAS: Quando você gravou “A Resposta” (1965), do Marcos Valle, você estava chamando o pessoal da bossa nova do Rio pra briga?

CS: A música foi exatamente por isso, né? “Falar de morro cantando de frente pro mar”…

PAS: Deve ter tido consequências.

"Chico-Gil-Veloso por Claudette Soares" (1968)
“Chico-Gil-Veloso por Claudette Soares” (1968)

CS: É, mas engraçado, como leitura minha não. A briga, onde incomodei mais, foi com Caetano, Gil e Chico, com Roberto Carlos. O disco de Caetano, Chico e Gil é o máximo, fez 50 anos. Foi um dos discos mais importantes da minha vida, sabe por quê? Foi em 1968. O João Araújo achava que esse disco, no auge da ditadura, só o Gilberto Gil conseguiu gravar uma música comigo. E o João, “não vai sair, você e o produtor vão pagar o prejuízo”, era o Manoel Barenbein na época, fiz muita coisa com ele. Tive que cantar pra eles autorizarem, e foi aí que descobri que meu sussurro dava certo. Diziam que não, que era muito diferente. A minha leitura era diferente. Eu não sou alienada, mas sempre achei que meu foco é cantar. Não sou alienada, mas acho que uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. Nunca fui ativista, respeito tudo, mas sempre tive esse foco. Mas você tem razão, isso tudo, os discos seguintes, era muito diferente da bossa tradicional. Tudo foi muito discutido por essa turma. Foi muito discutido, muito mesmo. Aliás, Tom Jobim é um grande exemplo disso, né? Ele teve grandes parceiros, mas sempre procurou os atuais que estavam chegando, como o Chico. Sabe o que é isso? É você se atualizar, não ficar vivendo daquilo que você foi. Meu show sempre vai ter o grand finale, “Hoje”,  “De Tanto Amor”, “Primavera”, claro. Eu tenho que registrar. Sou muito antipática, costumo dizer que sou cantora lado A. Eu quero aplauso, vivo pra isso. Não quero saber quanto vou ganhar, a maior frustração é com os aplausos. Quando você tem os aplausos, aquilo te alimenta, é o teu dinheiro, teu cachê, é tudo. Claro, tem que gravar os lados B também, mas vai entrando ali nos meios. Psicologicamente você quer o sucesso. Mas eu sempre estive na contramão mesmo. Os exemplos do Cesar e do Antonio Adolfo, realmente, são muito fora do tradicional da bossa nova.

"Meia Volta - Rosa da Gente - Trem de Ferro" (1969), de Claudette Soares
“Meia Volta – Rosa da Gente – Trem de Ferro” (1969), de Claudette Soares

PAS: Eu, e muita gente que conheço, tenho como favoritos Meia Volta – Rosa da Gente – Trem de Ferro (1969), Feitinha pro Sucesso (1969) e No. 3 (1970), os que fogem da curva, como você está falando. O que aconteceu nesse momento?

CS: Foram os arranjos do Antonio Adolfo, espetacular. Ele leva pra um lado meio Beatles.

PAS: O arranjo de “Glória, Glorinha” (1970) é clube da esquina antes do clube da esquina. Milton copiou depois?

CS: Ah, sensacional (ela se empolga e cantarola). Nem quero falar, mas não é muito incrível? Juro por Deus, se você ouvir esses trabalhos, musicalmente falando, é muito moderno. É muito à frente. Imagina quando entro no estúdio pra fazer samba-rock do Jorge Ben, é muito doido. Eu adoro. E sempre o pessoal: “Mas você vai fazer?”. Digo: vou, quero. O mais importante é agradar primeiro a você. Cantar uma coisa que vai te doer é muito ruim, né? O que vai de encontro à sua não realidade, só pra fazer sucesso, é muito ruim.

PAS: No seu coração, que lugar esses três discos ocupam?

CS: Ah, primeiro. É como eu disse no livro do Rodrigo Faour,  quando ele perguntou quem eu mais amei. Eu disse todos. Como não sou mãe, é mais ou menos isso. Não posso fazer uma diferença do Antonio Adolfo pro Cesar, porque é muito bom, é muito perfeito, é muito moderno.

"Feitinha pro Sucesso ou Quem Não É a Maior Tem Que Ser a Melhor" (1970), Claudette Soares
“Feitinha pro Sucesso ou Quem Não É a Maior Tem Que Ser a Melhor” (1970), Claudette Soares

PAS: E tem esse título maravilhoso, à la Simonal, Feitinha pro Sucesso ou Quem Não É a Maior Tem Que Ser a Melhor…

CS: Ah, então. Sabe o que foi isso? Foi um programa do J. Silvestre, apresentador lindo, alto, de olhos azuis, Esta Noite Se Improvisa. Estavam lá várias pessoas, Maria Bethânia, Chico Buarque, todo mundo fazia. E eu, num desses programas, minha amiga até o fim da vida, Clara Nunes. Toda vez que ela entrava pra cantar o microfone estava sempre baixo. E ela, alta, dizia: “Meu Deus, microfone baixo!”. Falou a primeira vez, a segunda vez, e o público ria. “Gente, mas toda vez tem que estar baixo!” Eu levanto, boto a mão na cintura, digo assim: “Meu amor, quem não é a maior tem que ser a melhor”. Gente, a plateia veio abaixo. Aí a Atlantic, que tinha postos de gasolina no Brasil, ficou enlouquecida, porque, foi sem querer, eles tinham esse título. E aquele menino Rivelino, um jogador meio baixo, era o garoto-propaganda da campanha. Eles me acharam maravilhosa, fizeram o lançamento, fizeram milhões de discos, e a campanha. O nome era Feitinha pro Sucesso, aí acrescentou Quem Não É a Maior Tem Que Ser a Melhor. Tem uma tiragem, eu loirinha, no meio de vários bonequinhos, e o Rivelino. Só por causa disso eu ganhei o patrocínio (ri). E todo mundo começou a achar que eu briguei com a Clara, mas que nada.

PAS: Eu pensava que o título era por causa da Elis Regina. Ela também era pequena.

CS: Também, mas não foi. Foi a Clara Nunes. Elis também era pequena, mas eu dizia pra ela: você é peixes, eu sou escorpião, eu te devoro, fica quieta. Abafa.

PAS: O disco de 1971 é da mesma época de Ela, da Elis, e eles têm capas muito parecidas. Parecia que vocês duas seguiam na mesma faixa.

"De Tanto Amor" (1971), de Claudette Soares
“De Tanto Amor” (1971), de Claudette Soares
"Ela" (1971), de Elis Regina
“Ela” (1971), de Elis Regina

CS: É, parecia mesmo. Eu tenho o Corpo & Alma (1975), logo depois a Simone gravou um disco com esse mesmo nome (em 1982). Francis Hime tinha feito essa música pra mim, com Ruy Guerra. Quase não sai, porque Ruy Guerra era mal visto pela Censura.

"Corpo e Alma" (1975), de Claudette Soares
“Corpo e Alma” (1975), de Claudette Soares

PAS: Conta um pouco da experiência de gravar Roberto Carlos? (Claudette gravou, dele, “Como É Grande o Meu Amor por Você”, em 1969, “As Flores do Jardim da Nossa Casa”, em 1970, “Não Quero Ver Você Triste” e “De Tanto Amor”, em 1971, “Proposta” e “Você”, em 1974.)

CS: Ah, falar do Roberto… Você não tem ideia. A primeira que ele autorizou foi “Como É Grande o Meu Amor por Você” (1969). Roberto e Erasmo Carlos têm uma coisa que é muito linda. “Eu posso mexer na harmonia?” Eles entregam pra você.

PAS: Nem todos são assim?

CS: Nem todos são assim. Agora tive uma felicidade, viajei muito num show com Ayrton Montarroyos, esse menino lindo, que tem a cabeça igual à minha.

PAS: Entrevistei ele, falou muito de você.

CS: Ah, falou também? A cabeça dele é a minha quando eu tinha 24 anos. Eu disse pra ele: “Não vença, porque quem vence festival some”. Sempre é o segundo que é o melhor, né? Fizemos um show do nada, fizemos um programa de televisão juntos no Canal Brasil, onde eu canto “Eu Te Amo Tanto” (1998), que Roberto fez pra esposa, Maria Rita. E eu tive que ir no show dele, pra poder liberar. E aí ganhei um presente, ninguém sabe. Eu nunca fiz o especial dele, nunca, nem no auge. E sempre achei ótimo.

PAS: Seria veto da Globo?

CS: Eu como cantora quero o quê? Quero música. O especial amanhã todo mundo vai esquecer, mas a música fica. Quando canto “De Tanto Amor” no Baile a mulherada grita, canta. Fica no inconsciente. Mas fui lá pra ele autorizar, e recebi o maior presente da minha vida. Ele disse: “Você pode cantar tudo, tudo que você quiser”.

PAS: Um disco inteiro, se você quiser?

CS: Isso pra mim é a coisa mais maravilhosa. Na época foi um horror, ele fez “Você” quando eu entrei na Odeon, levada pelo Dick Farney.

PAS: Foi em 1974?

"Claudette Soares" (1974)
“Claudette Soares” (1974)

CS: É, essa capa é muito feia, né? Nossa senhora (risos). Hoje, gravando com Thiago Marques Luiz, a gente escolhe, tudo é escolhido. Naquela época, nas gravadoras grandes – graças a Deus eu não dependo mais delas -, era o que eles queriam. Você não podia abrir a boca. É casamento. Assinou o nome, depois, pra dizer por que vai separar, tem que explicar pro juiz. Na Philips eu tive capas até que bonitas, né? Cynira Arruda, uma grande fotógrafa, fez a capa do disco com canções do Tito Madi.

"Fiz do Amor Meu Canto" (1976), de Claudette Soares
“Fiz do Amor Meu Canto” (1976), de Claudette Soares

PAS: “Chove Lá Fora”…

CS: Linda, né? Mas, voltando a “De Tanto Amor”, é um caso típico de uma gravadora que tem um produtor que acha que sabe tudo. Fiquei mais de seis meses no teatro cantando a música, as pessoas saíam enlouquecidas. Um dia o dono do teatro, que está vivo até hoje, Orlando Miranda, disse pra mim: “Roberto e Erasmo estão aí!”. Roberto foi lá perguntar por quê. E nesta noite estava André Midani, que foi outro anjo da guarda meu, que era o presidente da Philips. Se encontraram lá. Conclusão: “Por que não grava?”. Por quê? Porque o seu produtor artístico não quer que eu grave – você sabe quem é -, diz que não vai vender, que essa música é feia. Fui descobrindo, no decorrer da vida, que se tem uma cantora mais importante você não pode fazer mais sucesso que aquela. A cantora não tem nada a ver com isso, coitada, ela não é culpada (a Philips tinha, à época, Elis Regina, Gal Costa e Maria Bethânia). André falou: “Como?”. Aquilo veio abaixo. “Chama o Antonio Adolfo”, ele dava muita sorte pra mim. Antonio vai pro estúdio, faz aquele arranjo, sucesso. E agora, o produtor?

PAS: O produtor era Roberto Menescal?

CS: O Menescal, que não acreditava.

PAS: Ele era um daqueles bossa-novistas do Rio.

CS: Não acreditava, não sei por quê. Não sei se foi a palavra dele, tinha mais de um produtor. Não posso ser leviana. Tinha mais de um. Mas sei que a produção dizia que essa música ia ser um fracasso, que não tinha o perfil do Roberto. E Menescal era o produtor do disco. Não sei se foi ele.

PAS: Mas enfim a música entrou por causa desse episódio?

CS: Eu só gravei porque Roberto, Erasmo e Midani estavam lá nesse dia. O disco sai, eu não andava na rua. Lindo. Sempre fui muito chique (ri), eu não peço. Nunca pedi, nunca. Roberto disse: “Um dia vou fazer a música”. Mas demorou, demorou pra ele fazer. Basta dizer que quando eu casasse com esse pianista, eu quero ser o padrinho. Por isso que ele foi.

PAS: Quem é o pianista?

CS: Júlio César. Sou divorciada, mais feliz do mundo, é bom que se diga isso (ri). Por isso ele foi padrinho, escolheu a igreja. Depois de “De Tanto Amor” ele fez “Você” pra mim, quando eu fui pra Odeon. Dick ficou injuriado, “como?, é primeiro lugar!”. Saí da Philips com um sucesso, é inacreditável, pirei. E eu casei, todo mundo achou que me afastei porque casei, mas não era. Chega uma equipe na minha casa dizendo que eu tinha que gravar qualquer coisa, mesmo que fosse droga, pra vender. Eu disse não. E o contrato foi rompido, e eu fiquei sem gravadora. Aí o Dick Farney, que me adorava, me leva pra Odeon, faz uma proposta lá, eles me quiseram. Ele tinha a ideia de fazer vários discos comigo, mas infelizmente morreu. Ia ter até em inglês também, ele adorava. Mas tanto é que gravei “Proposta”, não tem música, imagina, nunca liguei pra Roberto pra cobrar, Deus me livre. Eu tenho vergonha, não cobro mesmo. Mas ele sabe tudo, tanto que quando entrou no teatro aquele dia ele sabia o que o músico da época fez comigo. Ele tocava pra trás, tocava errado. Fizeram um complô pra eu tirar a música do show, porque cada vez que eu entrava vinha abaixo. Não sei por quê, Roberto sabia de tudo, por isso ele foi. “Não precisa me contar que eu sei.” Conclusão: o sucesso foi maravilhoso, acho que ele sabia que eu tinha ido pra Odeon, sem eu falar nada – eu não tinha intimidade pra ficar ligando, imagina.

PAS: Então você teve de enfrentar forças poderosas pra gravar Roberto Carlos?

CS: Sempre. Sempre. Tanto que até hoje sou a única cantora que tinha tudo pra fazer um disco cantando Roberto Carlos e nunca fiz.

PAS: Por quê?

CS: Porque nunca deixaram.

PAS: Mas agora pode ser, com Thiago.

CS: Ah… Aguarde. Você é muito esperto, você gosta de música. Grandes acontecimentos vão vir por aí, aguarde. O mundo é ruim pra quem não sabe esperar. Eu não esperei o Silvio Cesar? E aí, conclusão da história: vou pra Odeon, gravei “Proposta” e um dia Roberto liga pra mim de Belo Horizonte, minha mãe achou que era trote. Disse: “Sei que você vai pra Odeon, então vou te dar uma música nova”. Ele cantou por telefone (cantarola), “você que tanto tempo faz…”.

PAS: Saiu na sua voz antes de ele gravar?

CS: Claro. E depois a Bethânia regravou. Eu gravei primeiro, nesse disco aí. Há controvérsias, dizem que não, mas ele fez pra mim, eu fui a primeira. Isso é muito lindo. Eu sempre quis isso. O próprio Chico, quando Nara casou e saiu do Brasil, eu cantei muita coisa dele, “Realejo” (1967), “Bom Tempo” (1968), tudo com Cesar Camargo Mariano. Eu fui muito intérprete dele naquela fase, fiz um show maravilhoso com MPB 4 cantando Chico. Gil gravou “Clara” (de Caetano Veloso) comigo. Caetano é muito engraçado, cada vez que encontra comigo ele fala: “Ela acha que Gil gosta mais dela do que eu” (ri). Eu achava, burra, idiota, ignorante, mas ele já não estava mais no Brasil, por isso não pôde. Gil conseguiu gravar “Clara”, e eu amo todos eles. Estava pensando outro dia, são poucos os grandes compositores vivos hoje, presentes. Eles três são a grande força, né? A gente tem que aproveitar enquanto estão aqui vivos, maravilhosos, mas a música vai ficar sempre.

PAS: Você citou antes o Taiguara, é um muito importante que foi embora cedo.

CS: Ah, muito, muito. Quando morre, como foi o Johnny Alf, digo, meu Deus, a gente vai ficando cada dia mais órfã. Eu, como intérprete, sou de uma geração que… Você acha que vou ter capacidade de fazer música como esses compositores?

PAS: Nunca tentou?

CS: Nunca. Hoje é moda, se você não é cantora-compositora você não é cantora. Digo que sou só cantora, devem pensar “que porcaria”. É muito doido. Mas pra fazer música como fazem hoje é melhor não ser. Deixa eu quieta que é melhor.

PAS: Você nunca nem experimentou?

CS: Não, não tenho talento. Não sei notas. Primeiro, tenho uma mão que não dá nem pra tocar nada, piano, violão, nem pensar. Minha mão é muito pequenininha – eu sou toda pequenininha (ri).

PAS: Qual é a medida?

CS: Um metro e meio com sapato alto ou sem sapato, fica a seu critério. Ela não fala a verdade (risos). Muito pequena, muito pequena. Mas Deus sabe o que faz, porque se eu tivesse de 1m70 pra cima eu seria insuportável. Eu sou o cão chupando manga, nasci no dia das bruxas. Escorpião com ascendente em áries, sou ruinzinha.

PAS: Fala um pouco dos dois discos com Dick Farney?

"Tudo Isto É Amor" (1976), de Dick Farney e Claudette Soares
“Tudo Isto É Amor” (1976), de Dick Farney e Claudette Soares
"Tudo Isto É Amor Vol. 2" (1977), de Dick Farney e Claudette Soares
“Tudo Isto É Amor Vol. 2” (1977), de Dick Farney e Claudette Soares

CS: Ah, nem me fala. Maior prestígio. Eu sabia o prestígio que ele ia me dar, e ele: “Você está maluca?”. Mas teve muitas colegas, muitas, que cobraram dele. Ligavam na casa dele, ele botava no viva voz elas falando mal de mim. Mas foi ele que quis, me achava muito feminina, muito mulherzinha cantando sussurrado. Ele gostava muito de mim, e eu era apaixonada por ele. Mas ele era tão distante de mim, jazzista. Enquanto eu estive no Rio, ele era uma coisa intocável. Minha amizade foi em São Paulo, quando vim é que fiquei mais amiga dele.

PAS: É curioso que você tem uma conexão com Dick Farney, Tito Madi, que são mais velhos que você, de uma geração anterior. Por quê?

CS: É verdade. Você pode reparar, eu sou o Tito Madi cantando, tenho muito dele. Ele tem um agudo pra dentro. Tenho uma identificação vocal muito séria com ele. O disco com músicas dele foi um presente, só não cantou comigo porque teve um problema pessoal.

PAS: E agora vai sair Maysa, que é dessa mesma geração. Falta Dolores Duran.

"Canção de Amor" (2017), de Claudette Soares
“Canção de Amor” (2017), de Claudette Soares

CS: Pois é. Que coisa engraçada. Isso tudo eu persegui. Você acha que eu poderia cantar aquelas músicas como no disco Canção de Amor, inspirado no livro do Ruy Castro? Imagina. “Canção de Amor”, gravada por Elizeth Cardoso, “Ouça”, de Maysa… Eram interpretações tão fabulosas que ninguém acreditava, ninguém deixava muito. Hoje todo mundo canta tudo, ninguém dá referência pra ninguém. O disco termina nos anos 1990, com “Resposta ao Tempo”. Quando Thiago falou “Tatuagem” (1973), “ah, não vou gravar, não”. “Não vai? Virou covarde?” Quer saber? Vou. Então tenho que fazer uma leitura diferente dela. Eu já tinha feito “Se Eu Quiser Falar com Deus”, num disco com Leandro Braga (MPB, 2001). Elis sempre foi muito forte, “Maria, Maria”, me desculpe, Milton Nascimento é com ela mesma. Quando ela diz “Maria”, ela diz. Levava pra um lado mais politizado. Então em “Se Eu Quiser Falar com Deus” ela fala com ódio, eu gravei bem dócil. Fiz mais uma oração. Essa é a beleza, cada cantora tem um jeito. Minha amiga Alaíde gravou Milton Nascimento completamente diferente de tudo que Elis gravou.

PAS: De Milton você só gravou uma, né?

CS: É, “Tarde” (1974). Porque Elis era muito forte, eu morria de medo. Uma vez fiz um show com participação do João Bosco, “você acha que eu gostava mais da Elis que de você?”. Falei “eu acho”. “Você está maluca.” Porque ela imortalizou, né?

PAS: Dá medo de cantar?

"Foi a Noite - Canções de Tom Jobim" (2007), de Claudette Soares
“Foi a Noite – Canções de Tom Jobim” (2007), de Claudette Soares

CS: Meu amigo Aldir Blanc escreveu uma contracapa linda minha, do disco de Tom Jobim. Eu sempre tive muito medo de gravar eles dois. Mas ainda vou realizar esse sonho, falei pro João. Mas ela é tão forte naquele momento, tem que esperar o tempo, gente. Não dá pra você competir. Tem que esperar amadurecer. Já que o tamanho está igual, hoje me respeitam mais pela idade. Pelo tamanho nunca vão respeitar. A idade me deu essa força. “Tatuagem” foi uma coisa incrível, um desafio maluco da minha cabeça. Mas procurei fazer diferente, levei pro lado da dor, me lembrei da peça Calabar (1973). E “Resposta ao Tempo” é uma gravação definitiva (por Nana Caymmi). Aldir falou que lembrou de mim quando gravou – ele tem uma voz linda, canta muito bem. Ele levou muito pro lado de “Primavera”, falei: é por ali que eu vou. Fui pelas águas dele. Deu tudo certo.

PAS: Claudette, aí Dick morreu e você saiu da Odeon? Foi isso?

CS: Não. Ainda fiz alguma coisa depois. Que que eu fiz depois do Dick, gente?

PAS: Porque aí você deu uma parada, não foi?

CS: É, foi quando dei uma parada. Eu tenho um disco depois do Dick, sim, qual foi? Mas o grande diretor de lá, Milton Miranda, um gentleman, saiu. Quando sai é mudança de governo. Saiu, a coisa ficou meio esquisita. Mas falei: tudo bem. Quando fico pressionada eu sou meio bicho, quero sumir. Eu queria morrer igual a elefante. Juro, não queria que ninguém soubesse. Não precisa fazer festa. Sei que não vou ter, porque não sou popular mesmo, sabe, todo mundo na rua? Não, não quero ninguém na rua dando adeus pra mim. Eu vou ser cremada. Queria ser realmente um elefante, que, quando vai morrer, vai pro meio da floresta, não quer que ninguém veja ele morrer. Eu sou muito assim, sempre fui. Você vê que sou muito teatral, né? Sou dramática. Eu queria, queria mesmo. Não precisa televisão nenhuma falar, é um favor que me faz, não quero. Sou muito parecida com a Elis, por isso que a gente tinha problemas.

PAS: Tinha?

CS: Depois que morre você vira maravilhosa, né? Já vou pro inferno mesmo, claro, é bom, porque lá já posso aprontar tudo. Freddie Mercury também dizia que ia pro inferno, Elis também. Falo assim: já que estou aqui, aquela que não gostava, ahá, jogo do palco! Vai cair do palco de cara. Já estou no inferno mesmo. É tão bom poder falar, falar de você enquanto está aqui. Depois que morre é tão cômodo, né? Não precisa me homenagear, não, não precisa falar de nada que eu fiz, porque vai quebrar a cara. Até parece que sou cruel (ri), não sou, não. Tenho um amigo que diz que sou o brinquedo assassino. É um dos maiores amigos que tenho, falei: imagina se você fosse meu inimigo. Parece que é meiga, mas é o cão. É por causa do signo, não sou, não.

PAS: Você nasceu no dia das bruxas?

CS: É, eu queria ser feiticeira. Já que não pôde, vai ser bruxa mesmo. Sabe você olhar pra uma pessoa e ela se desintegrar? Olha como eu sou cruel. Infelizmente não tenho esse poder, sou bruxinha só.

PAS: Como é fazer 82 anos?

CS: Ah, minha maior vingança, estar viva. Mais um ano viva. Ainda tem muita gente pra eu enterrar. Enquanto eu puder estar no palco, inteira, eu fico. Eu sempre me preparei, muito engraçado isso. Essa minha parada, que não foi por causa de casamento, imagina, foi por coisa mesmo minha.

PAS: Não foi por causa das gravadoras também?

"Vida Real" (1993), de Claudette Soares
“Vida Real” (1993), de Claudette Soares

CS: Eu via que eu ia num caminho sem volta. Pessoal quer venda depois do Dick, que foi sucesso, e você diz: para, vai ser uma coisa falsa, vou cair numa armadilha terrível. Então dei aquela acomodada, depois retornei, em 1990. Dizem que fiquei parada dez anos, imagina, palhaçada, não foi nada disso. Ficava assim devagar e sempre. Porque televisão, se não aparece, parece que você não existe. E como eu nunca gostei muito… Mas tudo bem, tem que ir mesmo, é a nossa profissão. É muito pra pessoas lindas, caras e bocas. Eu já fui bonitinha, já fiz tudo que tinha que fazer. Mas gosto mais de palco mesmo. Essa parada foi exatamente por isso, chegou num ponto que, espera aí, está tudo errado. Aí eu volto, o Ruy Castro, mais uma vez, me levou pro Jonas Silva, e eu fiz o disco com a mão no rosto, uma foto linda da Vânia ToledoVida Real. Aí começo outra vez. Depois Thiago começa a me chamar pros projetos, até chegar ao Tom Jobim, em 2007. Depois fiz um disco lindo, que é A Dona da Bossa ao Vivo (2011). Voltei, voltei fazendo tudo isso aí. Não gosto muito de bicho, talvez porque seja muito parecida com bicho. Fico meio acuada, quero ficar quieta, ir pra um lugar, dar um tempo, depois eu volto.

PAS: Não falamos muito de João Gilberto, perdemos ele há pouco tempo.

CS: Ah, pelo amor de Deus, é mais um luto. João sempre foi assim, as pessoas começam a  fazer muito mito, que ele não recebia, não falava. Ele era assim. Eu não sou parecida? Ele envelheceu, viu que não queria mais subir no palco, é um direito dele. Eu acho assim, no dia em que eu não puder mais cantar eu não subo mais no palco. Me retiro feito um elefante, ou como o gato. Vou ficar na minha. João sempre foi assim, recluso. Eu, não, estou assim agora. Eu tenho uma passagem muito engraçada com ele. Não gostava de falar, era meio Actor’s Studios, aquela fase dos atores que falavam pouco, James Dean. E era muito amigo do Walter Wanderley, e quando eu cantava na Baiuca, eu vim pra São Paulo e o Pedrinho Mattar foi encarregado pelo Ronaldo Bôscoli de tomar conta de mim. Tinha uma porta que se abria na Baiuca, na praça Roosevelt, e João tinha um apartamento na esquina da Ipiranga, num prédio chiquérrimo, hoje nem adianta dizer o que virou. Morava o Geraldo Vandré ali também. E João tinha fases que descia – era muito amigo do Walter, gravou com ele -, abria a janela e dizia: “Walter, estou aqui”. Ele vinha falar comigo, e eu não tinha muita paciência, porque ele falava devagar. Ele dizia: “A Claudette atira pedra quando o trem passa” (ri). Adoro. Muito elétrica.

PAS: Quem gravou o “Trem de Ferro” primeiro? Você ou ele?

CS: Foi ele.

PAS: Acho que a sua é antes.

CS: Será? Não posso dizer. Fiquei muito feliz quando gravei “Hô-Bá-Lá-Lá” (1959), dele. Pensei: “Será que ele vai autorizar?”. Mas ele sempre gostou de mim, foi a primeira autorização que veio. Falei “ah, ele gosta de mim”. Eu convivia muito com ele por causa do Walter, depois ele saiu, foi pro Rio, estourou nos Estados Unidos. Mas é o pai de tudo, o pai de todo mundo. Aliás, eu com Alaíde convivemos muito com ele, ela até mais do que eu, quando ele cantava com os Garotos da Lua, na TV Tupi. Ele ficava ali de violão no canto, fazendo essas coisas tradicionais da música brasileira, que ele depois regrava, e fazendo aquela leitura de harmonia. Ele realmente criou toda essa harmonia, pegar aquela música e botar nesse gênero, gosto muito desse trabalho.

PAS: Quem influenciou você na maneira de cantar?

CS: Blom, dizem que foi a Julie London, né? Diana Krall faz um trabalho muito incrível, ela sussurra, é maravilhosa. Bôscoli, Menescal e Durval diziam que era Julie London. E eu não conhecia, não tinha acesso a discos como eles. Cantava sussurrado, “poxa, você canta igual”, Ronaldo me deu de presente. Eu disse: “Tomara que ela seja feia”. Não pode ser linda e cantar lindamente. E é linda, como a Diana Krall. Imagina se eu sou parecida. É que Julie London sussurra, e eu sussurro também.

"About the Blues" (1957), de Julie London
“About the Blues” (1957), de Julie London

PAS: Mas era uma influência que você não conhecia então. Não foi de propósito.

CS: Não, depois é que eu vim a conhecer, juro por deus. Mas eu tinha muita influência da Sylvinha. Eu queria ser a Sylvinha Telles, minha maior amiga. Ela dizia: “Não escuta eu cantando e não escuta mulher nenhuma. Você vai escutar homem, pra você identificar seu estilo”. Foi aí que me apaixonei por Sinatra, Dick Farney. Só ouvia homem. Gozado, nunca fui chegada a mulher cantando. Claro que eu queria ser a Dalva de Oliveira, eu garota vendo a Dalva cantar na Rádio Nacional, queria ser ela. E Nora Ney, que tinha aquela voz linda. Aí fiquei muito fora desse padrão de cantar parecido, que foi um conselho da Sylvinha. Eu cantava muito parecido com ela. E hoje tem tanta gente cantando parecido com todo mundo, né? Dick falava isso: “Por pior que você seja, seja você”. Não existe nada mais triste que “nossa, é fulana?”, e não é. Acho que identificação é a primeira coisa que um cantor deve ter. Eu acho, mas como eu sou antiga…

PAS: Perguntei por isso, porque não há ninguém que se relacione imediatamente com a sua voz.

CS: Não, é engraçado, né? Mas ainda temos grandes estrelas, com personalidades formadas. Acho que tem que ser por aí. Não acho que “ah, nasci parecida”, mentira, só se for DNA. Minha mãe, se fosse cantora, eu seria filha de peixe. Ela era igualzinha a mim cantando. Ela tentou ser artista, mas disse que não tinha capacidade, porque mandava todo mundo pra aquele lugar, dava na cara de todo mundo. Dizia que eu era boba, que eu tinha que responder. Era o temperamento dela, e meu pai muito meigo. Meu pai era musical. E minha avó também. Minha mãe só veio dizer, pasme, que eu era uma cantora quando eu gravei Roberto Carlos. “Agora você é cantora. Aquela coisinha de bossa nova, que música é essa?” Clara Nunes ia muito lá em casa, minha mãe dizia: “Fala pra minha filha cantar samba igual a você”. Todo mundo cantava melhor que eu.

PAS: Era uma certa rivalidade entre mãe e filha?

CS: Vai saber. Ela queria muito ser artista, cantora. Mas não teve muita condição de aguentar. Talvez, né? Mas depois tudo vai se ajeitando.

 

Leia aqui entrevista com Silvio Cesar.

 

 

 

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