Os cyber-índios da Gang do Eletro

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O grupo paraense de eletromelody, um dos mais inventivos da nova safra brasileira, estreia na indústria convencional de CDs e tem de driblar regras e limites das velhas gravadoras.

 

A Gang do Eletro, um dos mais inventivos grupos do tecnobrega (e/ou tecnomelody) paraense, faz sua estreia no mercado convencional de CDs com Gang do Eletro, recém-lançado pela gravadora independente Deck (de Pitty, Arlindo Cruz, Dead Fish, Falamansa, Naldo, Matanza, Sorriso Maroto e outros). É um movimento interessante de observar, porque tudo que a indústria musical artesanal do Pará nunca esteve foi adaptada aos ditames das antigas fábricas de CDs e DVDs.

A Gang do Eletro - foto divulgação

O primeiro álbum oficial tem produção do líder e inventor do grupo, o genial DJ Waldo Squash, mas é possível perceber que a conexão com uma gravadora tradicional cobra um preço à Gang do Eletro. Apenas as faixas “Galera da Laje” e “Velocidade do Eletro” sobreviveram desde CDs virtuais que circularam nos últimos anos pelos canais de download “pirata” (nesse caso nunca houve pirataria, porque é a própria Gang que espalha seus trabalhos por aí).

“Velocidade do Eletro” é basicamente a mesma faixa de antes, mas foi “lavada” das falas introdutórias em portunhol debochado e da autopropaganda declamada que os artistas de tecnobrega costumam inserir dentro das músicas. Nesse sentido, de modo geral, o CD soa mais careta e comportado que tudo que a Gang do Eletro e o tecnomelody já faziam antes.

O que está certamente mais domado e mais limitado pelo contrato com a gravadora é o uso deslavado de samples, paródias e versões que fazem a alegria não só da Gang do Eletro como de toda e qualquer gravação de tecnomelody paraense. Não têm lugar aqui delícias como, por exemplo, os samples de canções de 70 anos atrás no “Tributo a Carmen Miranda” ou o amalucado “Panamericano”, na verdade uma versão livre de “We No Speak Americano” (2010), ato pop-eletrônico creditado a Yolanda Be Cool & DCUP.

Nada disso significa que a criatividade da Gang ficou pelo caminho. Soa riquíssima, por exemplo, a visita profana ao carimbó e a gêneros nativos do Pará em “Dançando no Salão” ou “Esquenta” (essa última aparentemente atrelada pelo nome à vitrine do programa dominical de Regina Casé na Rede Globo). Outro exemplo feliz é “Vamos de Barco”, que associa ritmos pop do Caribe (reggae, ska, reggaeton) à pauleira eletrônica e a elementos da cultura ribeirinha paraense.

Limitações à parte, estão presentes todas as características que tornam a cyberflorestania da Gang do Eletro uma novidade crucial no cenário brasileiro, antes totalmente impermeável às identidades do Norte. É o que se vê, por exemplo, no videoclipe de “Velocidade do Eletro”, gravado nas mesmas ruas de Belém onde os CDs “piratas” de tecnobega, tecnomelody e eletromelody são comercializados.

As feições indígenas de Waldo Squash, Maderito, Keila Gentil e William Love não são comuns nem identificáveis no dia a dia das TVs “brasileiras”. Nem seus gestos, seus “tremes”, sua expressividade, sua gana, sua musicalidade. Gang do Eletro, Gaby Amarantos e outros nomes ainda não assimilados pelas velhas indústrias são o Brasil do Norte que se orgulha de ser o que é – e estamos só no começo do caminho para conhecê-los e reconhecê-los.

(Texto publicado originalmente no blog Ultrapop, do Yahoo! Brasil)

 

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