O intervalo de dois meses entre a encenação de Maria da Escócia, dirigida por Fernando Bonassi, e Mary Stuart, de Nelson Baskerville, permite um salutar exercício comparativo do fazer teatral. Quem teve a oportunidade de ver as duas montagens há de se perguntar se se trata da mesma história, ainda mais porque ambas bebem do texto clássico do alemão Friederich Schiller. Sim, é a mesma história, mas versões bem distintas a partir de olhares particulares que os dois diretores imprimem a esse controverso episódio da história, que, para o bem da verdade, nunca aconteceu de fato.
A peça Mary Stuart, em cartaz no Teatro do Sesi, se vale das múltiplas possibilidades cênicas e pirotecnias permitidas, como nas projeções de videmapping (a cargo de André Grynwask e Pri Argoud. No palco, as atrizes Virginia Cavendish e Ana Cecília Costa interpretam Mary Stuart e Elizabeth I, respectivamente, secundadas por grande elenco. São eles que irão encenar e dar vida a diferentes situações da trama, inclusive a armação contra a rainha da Escócia. Já na peça que foi montada em junho (Vale ler a resenha anterior) no Teatro Cacilda Becker, também em São Paulo, apenas as atrizes Bete Dorgam (Elizabeth I) e Kátia Naiane (Mary Stuart) contracenavam, diante de cenografia e iluminação quase minimalistas, mas extremamente eficazes.
Desta vez, a trama ganha certa imponência e requinte, uma vez que Baskerville quis levar o espectador a mergulhar numa história do universo medieval, mas sem deixar de fazer conexões com o tempo presente. Embora essa premissa soe desnecessária, porque histórias clássicas não precisam de justificativas para serem retomadas, o diretor consegue fazer essa repaginação da obra clássica de Schiller a partir da sobreposição de tempos, numa clara tentativa de reafirmar que injustiças são sempre cometidas. A adaptação é de Roberto Icke.
Virgínia Cavendish fragiliza seu personagem injustiçado por uma estúpida e familiar disputa de poder, que luta para ser ouvida enquanto aguarda seu veredito presa no calabouço de um castelo. Já Ana Cecília Costa, interpretando a impiedosa Elizabeth I, dá a sensação de deixar de lado um certo protagonismo que deveria ocupar, quase como que se desculpando pelo desfecho que terá de tomar.
Mary Stuart é um drama, e nesta montagem não cabem risos, nem humor, o que causa estranheza para um palco que costuma oferecer gratuitamente peças de teatro para uma plateia afeita a esse gênero mais leve.