Ivo Milazzo é um dos convidados confirmados do Festival Internacional de Quadrinhos, que acontece em novembro, em Belo Horizonte. Tem muitos outros convidados, mas Ivo é um caso especial, ao menos para mim. Conheci Milazzo em 1993. Fui apresentado a ele na Livraria Muito Prazer. Eu tinha um Gol verde a álcool que soltava fumaça, e ele pediu carona. Senhores, meu Gol verde era realmente a vergonha da cidade, fiquei encabulado. Mesmo assim, levei o Ivo até a casa do seu anfitrião paulistano, o Wagner. Sempre reconto essa história. Fiquei trêmulo ao conhecê-lo, ele é o quadrinista que deu vida a KEN PARKER, um gibi que é uma das pedras fundamentais da minha vida. Eu cresci lendo KEN PARKER no interior do Paraná. Foi por meio de KEN PARKER que eu descobri Walt Whitman. Ivo e Giancarlo Berardi tornaram essa série, levemente inspirada no filme Jeremiah Johnson, de Sydney Pollack, numa oásis de humanismo na interior da mais popular literatura pop.
“Quando fiz Ken Parker, a preocupação era não fazer um western tradicional”, contou Milazzo. “O cinema e os quadrinhos já estavam inflacionados pelo gênero”. Segundo ele, o diferencial era a presença da natureza como protagonista. “Ken Parker é um solitário, um homem do século 19 que anda pelas pradarias enfrentando as contradições típicas do seu tempo”.
No ano 2000, Milazzo veio a São Paulo de novo. Num final de semana, ao descer a Serra do Mar para ir à praia com a mulher, ele parou num quiosque da Rodovia dos Tamoios para comprar suvenires de índios brasileiros. No meio de tudo, apontou para um colar e disse: “Aquilo não é brasileiro, é americano”. De fato, tinha até etiqueta de importação. Era um daqueles círculos artesanais com penas no interior, com círculos concêntricos. “Os índios americanos fazem até os acampamentos em forma de círculo, e os círculos internos formam novos círculos”, explica o desenhista. “O círculo é um símbolo sagrado para os índios americanos”, me contou Ivo, cujo primeiro personagem foi justamente um índio, e brasileiro, Tiki Il Ragazzo Guerriero.
Ele voltou em 2001 para receber o Prêmio HQ Mix no Teatro São Pedro. O teatro quase caiu de aplausos. Nos encontramos lá e eu o trouxe para tomar um chope no Astor. Ivo agora está com 66 anos, há anos não o vejo. Se bobear, vou a Belo Horizonte para tomar um chope com ele.
PUBLICIDADE
AnteriorO assassinato do Pobre Louco da Penha
PróximoDe almas & diabos
Jotabê Medeiros, paraibano de Sumé, é repórter de jornalismo cultural desde 1986 e escritor, autor de Belchior - Apenas um Rapaz Latino-Americano (Todavia, 2017), Raul Seixas - Não diga que a canção está perdida (Todavia, 2019) e Roberto Carlos - Por isso essa voz tamanha (Todavia, 2021)

DEIXE UMA REPOSTA

Por favor, deixe seu comentário
Por favor, entre seu nome