O grupo britânico Radiohead, que toca no Brasil pela primeira vez nos dias 20 e 22 de março (Rio, na Apoteose, e São Paulo, na Chácara do Jockey), anunciou em seu site oficial que a banda que abrirá seus shows na América do Sul será a alemã Kraftwerk.
“Com apoio dos convidados muito especiais: Kraftwerk”, diz o texto. Será? Dio mio! A turnê latino-americana do Radiohead começa no dia 15 de março, na Cidade do México, no Foro Sol. A última vez que o Kraftwerk esteve no Brasil foi em 2004, durante o TIM Festival (a primeira vez foi em 1998, no Free Jazz Festival). O quarteto alemão, que faz uma performance em que é indistinta a presença física dos performers (há um momento em que saem do palco e ficam robôs tocando), são tidos como um dos atos mais revolucionários da música pop moderna.
Particularmente, eu adoro Kraftwerk. Acho que é possível identificar sua influência em quase tudo que se faz na música contemporânea, coisas magníficas e coisas medíocres são feitas em seu nome. Fucei no fundo do baú e achei um trecho do texto que escrevi após sua última descida ao planeta São Paulo, em 2004:

Eles mexem nos laptops? Eles cantam de fato? Eles falam? Eles se mexem? Para que um quarteto, se podia vir um sujeito só? Seis anos depois de sua última
visita ao Brasil, os alemães do Kraftwerk continuam causando impacto. É mais ou menos como o urinol de Marcel Duchamp: sempre funciona. E sua função nunca é dizer muito, mas dizer o essencial.
Sexta, no palco principal do Jockey Club, ficou claro: o Kraftwerk é um acontecimento e não só musical. Quando surgem no palco, com quadrados vermelhos e pretos se sobrepondo no telão (eles também de ternos pretos com camisa vermelha por baixo, evocando o abstracionismo geométrico mais radical de Malevich), a platéia fica assombrada. Ao mesmo tempo em que refazem a crítica da civilização maquinista em Man Machine, exalam certa “nostalgia da modernidade”.
As imagens que o Kraftwerk apresenta, de propósito, parecem obsoletas. Velhas etapas da corrida de bicicletas Tour de France, calculadoras analógicas, aerodinâmicos calhambeques, o antigo trem “ultraveloz” Trans Europe Express (que só ia até 180 km/h, como se vê no velocímetro), labirintos de trilhos de trem. Pílulas e comprimidos caem do céu permeadas por palavras-chave: carboidrato, magnésio, endorfina, vitamina, adrenalina. E tudo termina em efervescência. “Estamos funcionando automaticamente e estamos dançando mecanicamente. Nós somos os robôs”, cantam, na clássica We’re the Robots, fechando a noite.
A máquina, a velocidade, a pressa, a comunicação, o tempo, o entretenimento.
A repetição dos temas empurra-nos goela abaixo a urgência dos temas. “Stop radioactivity”, diz o alerta nuclear, relacionando usinas: Chernobyl, Sellafield, Harrisburg. A crítica do Kraftwerk fica ribombando nas cabeças, assim como sua batida nova, já emprenhada pela tecnologia dos novos tempos.

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Jotabê Medeiros, paraibano de Sumé, é repórter de jornalismo cultural desde 1986 e escritor, autor de Belchior - Apenas um Rapaz Latino-Americano (Todavia, 2017), Raul Seixas - Não diga que a canção está perdida (Todavia, 2019) e Roberto Carlos - Por isso essa voz tamanha (Todavia, 2021)

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