O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), recebeu esta tarde em seu gabinete representantes de todo o setor audiovisual brasileiro para ouvir as reivindicações da área. O grupo entregou a Motta a carta aberta endereçada ao governo e assinada por 1,7 mil profissionais do setor, incluindo os cineastas Walter Salles, Karim Aïnouz, Laís Bodanski e Kleber Mendonça, os atores Wagner Moura e Rodrigo Santoro, as atrizes e diretoras Barbara Paz, Petra Costa e Fernanda Torres. Na carta, o grupo mostra preocupação com certa tendência em se aprovar uma lei de regulação do streaming conservadora, nociva ao interesse nacional e impregnada de um espírito de “moeda de troca” acerca de um dos maiores mercados estrangeiros no País.
Segundo fontes participantes do encontro, Motta mostrou-se receptivo à ideia de levar a votação ainda nesse semestre uma nova lei do streaming que postule ao menos uma taxação de 6% das big techs. Mais importante: o presidente ouviu todas as associações e sindicatos participantes, e demonstrou simpatia pela recondução da deputada Jandira Feghali (PC do B-RJ) à relatoria da lei que irá ao plenário. Jandira acompanhou todo o processo de debate do texto e é de longe a parlamentar mais preparada para defender os mecanismos da legislação, mas uma manobra meio insidiosa no caminho a alijou do momento chave.
Entre as entidades que estiveram com o presidente da Câmara, estavam a Associação Brasileira de Cineastas (Abraci), a Associação Brasileira de Empresas de Animação (Abranima), a Conexão Audiovisual Centro-Oeste, Norte e Nordeste (CONNE), a Associação Paulista de Cineastas (Apaci), a Associação das Produtoras Independentes do Audiovisual Brasileiro (API), a Associação Brasileira de Autores Roteiristas (ABRA) e o SIAESP (Sindicato da Indústria do Audiovisual do Estado de São Paulo), entre outras.
O Ministério da Cultura (MinC), que alega apoiar as reivindicações do setor, esteve presente ao encontro com Motta com um representante, Amauri dos Santos Teixeira, Assessor Especial de Assuntos Parlamentares e Federativos do MinC, mas ele não se manifestou. É uma postura que tem gerado críticas: muitos representantes de instituições audiovisuais acusam o governo de manter uma posição ambígua no debate acerca da regulação do streaming, quando não tendenciosa: nesta quarta-feira, o jornal Folha de S.Paulo noticiou que um defensor público pediu à Controladoria-Geral da União que apure as circunstâncias de realização de um jantar, em julho, entre representates do MinC e executivos das plataformas de streaming (Netflix, Max, Prime Video, Disney+ e Globoplay), que postulam uma taxação próxima da isenção ao Congresso. Segundo a reportagem, o encontro não constava da agenda do principal dirigente do MinC que esteve presente, o secretário executivo Márcio Tavares dos Santos, e só foi inserido no sistema 14 dias depois, após denúncias públicas.
O Ministério da Cultura divulgou nota na qual classifica os encontros como “reuniões técnicas”, e que o jantar com as big techs constava da agenda pública da ministra da Cultura, Margareth Menezes. “Tanto o secretário-executivo do MinC, Márcio Tavares, e o diretor-presidente da Ancine, Alex Braga, acompanharam a reunião no exercício regular de suas atribuições institucionais”, informou a nota. Importante lembrar que a Ancine, sob o comando de Alex Braga, chegou a participar em 2022 de um Grupo de Trabalho para propor uma proposta de regulação do streaming realizada no governo de Jair Bolsonaro que era um verdadeiro escândalo – propunha uma taxação de 1% para as plataformas estrangeiras (alíquota que seria reduzida para 0,27% em casos de investimento direto em produções brasileiras). Na prática, a Ancine apoiou a isenção total. Recentemente, um dos diretores da própria Ancine, Paulo Alcoforado, demonstrou que o estudo da agência estimando o tamanho do mercado do Video sob Demanda (VoD) que tem servido para embasar debates apresenta inconsistências, é frágil e tem furos homéricos (subestima o faturamento). A Ancine rebateu Alcoforado em uma nota pública essa semana, dizendo que o alerta de seu próprio diretor pode gerar “instabilidade em um momento estratégico para o audiovisual brasileiro”.



