O coração de D. Pedro
Finalmente voltou
Como se, embalsamado, driblasse o involuntário degredo:
Braveheart
Heart of Darkness
Beefheart
E a primeira coisa que o coração viu
Do alto do pote envidraçado do seu formol imperial
Foi um homem na calçada, morto de frio
Coberto com um banner da liquidação do Ponto Frio
Mas foi um só deslize logístico;
antes da triunfal micareta no carro dos bombeiros
Uma força-tarefa laranja esvaziou todos os canteiros
para receber esse dístico
De tão nobre aurículo
tão honrado ventrículo
e tão opaco versículo
Num implacável arrastão higienista
30 mil barracas de sem teto foram subtraídas de seus não-tetos
(e de suas estatísticas de comício)
Na paisagem guardada solitariamente pelo coração forte
do inquebrável Sir Lancelotti
Na comitiva de recepção ao coração de Pedro
Só a nata do foro privilegiado nacional
Como o inclíto senador do Partido da Ordem Social
(Que arrancou a roupa da filha de 17 anos como um animal)
Todo coração quer guardar o mundo
(não é só a lembrança de um vulto feliz de mulher)
Mas o de Pedro não tinha como imaginar
A visão dantesca do descamisado do Flamengo
que tentou arrastar a moça do jogging até um esgoto imundo
Para violentá-la em seu estuário, tremendo
(da mesma forma que um rato atacou uma pomba, no Brooklyn
Para viralizá-la, no muque)
Tempos de penúria
Difíceis até para Corações em Fúria
Imaginem para um acostumado ao sol da Ligúria
Foi então que um cartunista se lembrou
Do velho coração gentil
Do saudoso Kid Vinil:
(E eles finalmente comeram o coração de D. Pedro
Num xinxim
Ai de mim)
Braveheart
Beefheart
Heart of Glass, no peace of mind