Líderes de terreiros vão a Macaé, Anielle e Lewandowski para denunciar violação de direitos no âmbito do MinC

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Macaé Evaristo, ministra dos Direitos Humanos e da Cidadania, recebe das mãos de Pai Adailto de Ogun carta-denúncia contra o Ibram (Instituto Brasileiro de Museus) assinada por lideranças religiosas do Grupo de Gestão Compartilhada da Coleção Nosso Sagrado, abrigada no Museu da República.

Um grupo de 15 religiosos de cultos afro-brasileiros que lideram terreiros em áreas populares do Rio de Janeiro enviaram nesta terça-feira, 5, uma carta a três ministros do governo Lula denunciando violação de direitos humanos pelo Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), órgão do Ministério da Cultura. Além dos ministros Macaé Evaristo (Direitos Humanos e Cidadania), Anielle Franco (Igualdade Racial) e Ricardo Lewandowski (Justiça e Segurança Pública), o grupo, que integra o bureau de gestão compartilhada do Museu da República, no Catete, também encaminhou as denúncias para Jaime Mitropoulos (Ministério Público Federal), Yuri Michael Pereira Costa (Defensoria Pública da União), Angela Pires (Nações Unidas), e Rodnei Jericó da Silva (Instituto Raça e Igualdade).

Os líderes de alguns dos principais terreiros do Rio estão denunciando o Ibram por desrespeito e violações graves de direitos. A primeira delas diz respeito ao afastamento, sem consulta ao Grupo de Gestão Compartilhada do Acervo Nosso Sagrado (desde 2021 sob a guarda do Museu da República), do diretor do museu, Mario de Souza Chagas, em 17 de julho deste ano. Os religiosos argumentam que a exoneração de Chagas nunca foi explicada pelo Ministério da Cultura (MinC) de forma convincente, com versões sendo modificadas de tempos em tempos, e que o Ibram tem se caracterizado pela falta de transparência em suas ações relativas ao caso. Os líderes suspeitam que a saída do ex-diretor se relacione com o valor que ele atribuía à coleção afro, e veem preconceito velado no ato. “Vale lembrar que houve uma comoção da comunidade acadêmica, da Museologia e Museologia Social, sobretudo dos museus comunitários, após a exoneração, com inúmeras tentativas de conseguirmos uma audiência com a Ministra da Cultura, Margareth Menezes, para sabermos as reais motivações da mudança da direção do Museu da República, mas nunca obtivemos retorno por parte de seu Ministério”.

De fato, Margareth, que tem ligação histórica com os grupos afro da Bahia, até hoje não se pronunciou sobre o ocorrido. A presidente do Ibram, Fernanda Santana Rabello de Castro, se mostrou irredutível em relação à questão e, ato contínuo, iniciou processo para escolher o substituto do diretor demitido, Mario Chagas.

O grupo acrescenta que o período coincidiu com a etapa final de dois trabalhos importantes que envolvem de forma direta o seu conselho: encerramento dos trabalhos de pesquisa do acervo e finalização da produção da exposição Nosso Sagrado, ambas financiadas inicialmente pelo Instituto Ibirapitanga e pela Fundação Ford. “Dentro ainda de uma política de reparação que a exposição Nosso Sagrado representa, destacamos a interrupção da produção da mostra, também sem consulta às lideranças religiosas do Grupo de Gestão Compartilhada do Acervo Nosso Sagrado”. Os líderes solicitam providências “cabíveis neste caso, dada a inobservância expressa e latente da Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho)”.

O grupo acusa a direção do Ibram de agir para dificultar e impedir a inauguração da exposição montada a partir do acervo, cuja inauguração estava prevista para o mês de setembro de 2024; e também de negligência ao se recusar a responder adequadamente ao Ministério Público Federal e à Defensoria Pública da União. Conforme a carta, o Ibram e a atual gestão do Museu da República também se recusam a validar a constituição do Grupo de Gestão Compartilhada do Acervo Nosso Sagrado, ainda que tenha sido realizada a audiência pública “Respeita Nosso Sagrado”, no Ministério Público Federal, em 19 de abril de 2021, reconhecendo a constituição do conselho e nominando cada um dos terreiros que o constituem, com seus membros titulares e suplentes.

O Acervo Nosso Sagrado tem imensa relevância para os religiosos de matrizes africanas, assevera o documento. “Formado a partir de batidas policiais em terreiros de Candomblé e Umbanda, do Rio de Janeiro, nas primeiras seis décadas da República, as incursões eram instruídas por ordens de cunho racista, que criminalizavam essas práticas religiosas, vinculando-as ao curandeirismo, ao charlatanismo e ao baixo espiritismo e, com base nessas vinculações, interrompiam cerimônias religiosas, prendiam seus praticantes e confiscavam seus objetos como ‘provas do crime'”. A coleção reúne 519 itens, parte deles tombados pelo então Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em 5 de maio de 1938. Inclui indumentárias, fios de contas, assentamentos, estatuetas, espadas, instrumentos musicais, aves taxidermizadas e diversos outros pertences religiosas.

Assinam a carta-denúncia (que possui 11 páginas e dez anexos) os seguintes líderes religiosos, que enviaram representante a Macaé Evaristo, Anielle e Lewandowski:

  • Mãe Meninazinha de Oxum (presidente de honra)
  • Mametu Mabeji (Terreiro Bate-folha)
  • Mãe Nilce de Iansã (Ilê Omolu Oxum)
  • Pai Adailton de Ogun (Ilê Axé Omiojuarô)
  • Tata Songhele (Terreiro Bate-folha)
  • Pai Mauro de Oxóssi (Axé Iyá Nassô Oká Ilê Oxum / Casa de Iyá Nitinha)
  • Mãe Flávia da Silva Pinto (Centro Espírita Casa do Perdão)
  • Iyá Marcinha de Oxum (Ilê Axé Iyá Omi Layó)
  • Pai Luiz D’Omolu (Templo do Vale do Sol e da Lua)
  • Pai Anderson Ferreira Nunes (Tenda Espírita Caboclo Flecheiro Cobra Coral)
  • Pai Ricardo Ferreira dos Santos (Tenda Umbandista Caboclo Urucutum e Pai
    Zacarias)
  • Ogã Marcos Aurélio Aprigio da Silva (Ilê Omon Oyá Legy)
  • Ogã Luciano Henrique Lourenço (Terreiro Abassá Lumyjacarê Junssara)
  • Pai Thiago de Ogun (Templo do Vale do Sol e da Lua)
  • Iyawô de Oxóssi Teobaldo (Ilê Omolu Oxum)

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