Cena de
Cena de "Crime e Castigo 11:45", com Liliane Rovaris - Foto Pedro Padro/Divulgação

A grandiosidade de Crime e Castigo, obra-prima do escritor russo Fiódor Dostoiévksi (1821-1881), reside em uma literatura que recorre com desenvoltura à oralidade e à linguagem informal que transportam o leitor para dentro do protagonista Raskólnikov. Desde os primeiros parágrafos, o leitor é transportado para ruas, praças, pontes, avenidas, casas e apartamentos, numa narrativa que se apoia em descrições típicas da linguagem teatral. Essa é uma aproximação possível com o monólogo Crime e Castigo 11:45, uma releitura do romance clássico feita pela atriz Liliane Rovaris, em cartaz no Sesc Ipiranga.

O romance de Dostoiévksi foi a forma que Liliane encontrou para superar a morte dos pais. Filha única, ela encontrou o livro do escritor russo numa estante na casa dos pais e viu nesses escritos pontos de contato a partir da solidão e da chance de recomeçar tudo de novo. É o que acontece com o protagonista de Crime e Castigo, um anti-herói existencialista cuja história é marcada pelo assassinato quase sem motivo de uma velha agiota. Raskólnikov pode ser visto meramente como um frio assassino tomado pela loucura individual e que viverá uma redenção pessoal.

Mas, apesar das extensas descrições e ambientações oferecidas pelo autor, a obra clássica vai além de um romance policial, um folhetim confessional de um criminoso. A complexidade do livro se dá por uma obra narrada em primeira pessoal, por um personagem que vive num século XIX em uma nação tomada por czaristas que se locupletam com a burocracia, enriquecendo-se e deixando a população em geral à míngua. O miserável Raskólnikov, que conta centavos para sobreviver ou pagar a pensão, seria vilão ou vítima?

Liliane, em seu monólogo, procura simplificar e traduzir essa história, não raras vezes tomada como inacessível por muitos. Nas idas e vindas desse contar, ela perpassa a sua vida, a dos seus pais e a dos personagens Raskólnikov e Sônia, a “única pessoa para quem consegue contar sobre o crime cometido”. Diferente da história original, marcada pela intensa mobilidade do protagonista, a atriz fica “trancada” dentro do quarto dos pais, onde partilha a sua leitura pessoal da obra.

O monólogo, dirigido por Camila Márdila, atriz protagonista do filme Que horas ela volta, é recortado por canções de David Bowie, que Liliane ouvia em sua adolescência. Uma das cenas, em particular, fará lembrar Aftersun, longa de estreia de Charlotte Wells, que ressignificou magnificamente a canção Under Pressure. O rasgante verso “Why can’t we give love that one more chance” (“Por que não podemos dar ao amor mais uma chance“) serve tanto a Raskólnikov quanto a Liliane.

Crime e Castigo 11:45. De Liliane Rovaris. No Sesc Ipiranga, até 9 de julho, às quintas e sextas-feiras (21h30), sábados (19h30) e domingos (18h30). Ingressos a 30 reais.
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