Ancine é autuada pela 2ª vez em uma semana pelo MPF

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Ancine
Operários que foram encarregados de arrancar cartazes de filmes colados por manifestantes no tapume da sede da Ancine, no Rio

No último dia 11, às 15h18, o Ministério Público Federal (MPF) voltou a autuar a Agência Nacional de Cinema (Ancine), dessa vez por falta de transparência. O procurador que autuou a agência foi Antonio do Passo Cabral. No dia 4, uma semana antes, o MPF já tinha autuado a agência por retrocesso na edição de uma instrução normativa que mudou as regras de acessibilidade nas salas de cinema do País.

Ambas as denúncias que provocaram as autuações partiram da Associação dos Servidores Públicos da Ancine (Aspac). A nova autuação considerou factíveis um documento com 23 pontos que sintetizam atos de gestão temerária na atual condução da agência de cinema. As denúncias são gravíssimas, e envolvem desde a rotina de reuniões sigilosas da diretoria até a decisão deliberada de deixar de cobrar um tributo federal, o que é crime contra a administração pública. A conclusão dos servidores é que há uma prática reiterada da agência na ocultação de informações de gestão (o que inclui informações falsas), para burlar o controle social externo. Devido a esse corolário de irregularidades, o atual governo federal achou por bem reconduzir a atual diretoria, encabeçada por Alex Braga Muniz, para mais 4 e 5 anos de mandato. “A simples falta de transparência, por si só, já constitui ilegalidade grave”, aponta o documento.

Reproduzimos abaixo a íntegra da denúncia que foi acolhida pelo Ministério Público Federal. Segundo os servidores, as irregularidades estão nos seguintes itens:

 

1. SIGILO IRRESTRITO NOS PROCESSOS ADMINISTRATIVOS

A quase totalidade dos processos administrativos da Ancine é mantida sob a eterna classificação de “documentos preparatórios”. Trata-se de uma deturpação do art. 7o, § 3o da Lei 12.527/11, que não proíbe a publicização de documentos preparatórios, mas garante a obrigatoriedade de sua publicização após a edição do respectivo ato final. Conforme estipula o Manual de Aplicação da Lei de Acesso à Informação na Administração Pública Federal, da Controladoria-Geral da União:

“Documento preparatório, nos termos do parágrafo 3o do art. 7o da LAI, é aquele
documento que serve para fundamentar tomada de decisão. A LAI não proíbe a entrega de tais documentos, mas garante o seu acesso após a edição do ato relativo à tomada de decisão que os usou como fundamento. Em observância ao princípio da máxima divulgação, no entanto, uma negativa que se fundamente na natureza preparatória do documento deve observar alguns critérios a fim de ser adequadamente motivada. Ambos estão diretamente relacionados à ideia de risco:
em um caso, risco ao processo; em outro, risco à sociedade.
(…) De toda forma, devemos ter em mente que, em qualquer uma dessas hipóteses, caso concluído o processo de tomada de decisão, os documentos que a fundamentaram deverão ter o seu acesso garantido à sociedade, a fim de que esta possa fazer o seu controle sobre os atos públicos.”

O sigilo dos documentos preparatórios, portanto, é excepcional (apenas quando representar risco à finalidade do processo) e temporário (apenas até a edição do respectivo ato decisório). A Ancine, no entanto, não vem observando nenhuma destas restrições, usando a classificação de “documentos preparatórios” para manter a quase totalidade dos processos da agência em sigilo eterno. A necessidade de motivação específica que fundamente o risco processual não é respeitada, já que a agência adota a prática de forma irrestrita em todos os processos. O mais grave, porém, é o aspecto temporal: a Ancine não publiciza os “documentos preparatórios” nem mesmo após a edição do respectivo ato decisório, portanto o sigilo acaba sendo, na prática, por tempo indefinido, eterno, uma
situação que a legislação não prevê nem mesmo para documentos ultrassecretos. Na prática, o sigilo nos processos administrativos da agência é absoluto, algo completamente incompatível com a Constituição Federal de 1988 e com um regime democrático.

Acrescentamos, a seguir, uma lista meramente exemplificativa de processos administrativos classificados pela Ancine como sigilosos com atos decisórios já editados, ou seja, estão ilegalmente enquadrados pela Ancine na hipótese de sigilo do art. 7o, § 3o da Lei 12.527/11. Note-se que estes processos escolhidos como exemplos são especialmente relevantes para a garantia do controle social e transparência das atividades da agência, pois tratam de questões de interesse público:

● 01416.002574/2022-17 (Relatório de Gestão da ANCINE referente ao exercício de 2021)
● 01416.003248/2020-65 (Acordo de Cooperação com a MPA – Motion Pictures Association)
● 01416.001544/2022-93 (Relatório Anual de Ouvidoria)
● 01580.029962/2007-12 (Comissão de Correição)
● 01416.007197/2022-11 (Consulta pública)
● 01416.010826/2020-10 (Relatório Anual Circunstanciado referente ao exercício de 2021)
● 01580.057015/2016-02 (Quadro de sugestão de classificação de informação com restrição de acesso)
1https://www.gov.br/acessoainformacao/pt-br/central-de-conteudo/publicacoes/arquivos/aplicacao-da-lai-2019.pdf

● 1416.010816/2021-65 (Doação de bens móveis)
● 01416.008107/2020-39 (Consulta Pública Segmentos “Outros Mercados” e “Vídeo Doméstico”)
● 01416.003241/2021-24 (Revisão da Instrução Normativa ANCINE no 100/2012)
● 01416.000007/2021-45 (Revisão da Resolução de Diretoria Colegiada ANCINE n.o 81/2018, que trata do processo de elaboração normativa)
● 01416.006208/2021-56 (Revisão da Resolução de Diretoria Colegiada n.o 66/2015, que institui o processo administrativo eletrônico por meio do Sistema Eletrônico de Informações (SEI) na ANCINE)
● 01416.004371/2019-60 (Resultado Final da avaliação do Índice de Desenvolvimento Institucional (IDIN) relativo ao 11o Ciclo de Avaliação de Desempenho – 1o de julho de 2019 a 30 de junho de 2020)
● 01416.019063/2018-58 (Estatuto da Auditoria Interna da ANCINE)
● 01416.009065/2019-10 (Reestruturação regimental das áreas de regulação)
● 01416.008491/2020-70 Implantação da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) na ANCINE.
● 01416.015489/2017-51 (Revisão da Resolução de Diretoria Colegiada ANCINE n.o 78/2017, visando adequá-la à nova estrutura organizacional)
● 01416.010366/2020-20 (Apresentação de estudos sobre o Valor Adicionado pelo setor Audiovisual, referentes aos anos-base de 2015 a 2018)
● 01416.011795/2020-14 (Relatório de Gestão da ANCINE referente ao exercício de 2020)
● 01416.002168/2020-92 (Acordo com Associação Brasileira de Televisão por Assinatura – ABTA)
● 01416.011246/2020-40 (Apresentação de estudo sobre os efeitos da pandemia de COVID-19 no mercado de exibição nos meses de janeiro, fevereiro e março de 2021.)
● 01416.002050/2021-45 (Criação de Grupo de Trabalho para avaliação e proposta de revisão de indicadores das políticas audiovisuais (Plano de Diretrizes e Metas), em consonância com as diretrizes de governança pública, para posterior deliberação pelo Conselho Superior do Cinema (CSC) e Comitê Gestor do Fundo Setorial do Audiovisual (CGFSA)
● 01416.002077/2020-57 (Reapresentação do Relatório de Monitoramento das Recomendações Expedidas pela Auditoria Interna entre 2016 e 2018, com as informações complementares solicitadas pela Deliberação de Diretoria Colegiada n.o 322-E, de 2020.)
● 01416.001539/2021-08 (Apresentação do Relatório Anual de Atividades de Auditoria Interna 2020)
● 01416.001989/2020-10 (Código de Conduta Ética da ANCINE)
● 01416.009065/2019-10 (Alteração de estruturas e competências da Superintendência de Fiscalização e atualização da estrutura de cargos ANCINE)
● 01416.012274/2019-41 (Decisões de Caráter Geral – Comissões, Comitês e GT’s)

2 . INFORMAÇÕES CLASSIFICADAS E DESCLASSIFICADAS
A Ancine possui em seu site uma página intitulada “Informações classificadas e desclassificadas”, em cumprimento à Lei no 12.527/2011 e ao Decreto no 7.724/2012. Estabelece o art. 30 da Lei de Acesso à Informação:

Art. 30. A autoridade máxima de cada órgão ou entidade publicará, anualmente, em
sítio à disposição na internet e destinado à veiculação de dados e informações
administrativas, nos termos de regulamento:
I – rol das informações que tenham sido desclassificadas nos últimos 12 (doze)
meses;
II – rol de documentos classificados em cada grau de sigilo, com identificação para
referência futura;
III – relatório estatístico contendo a quantidade de pedidos de informação recebidos,
atendidos e indeferidos, bem como informações genéricas sobre os solicitantes.
§ 1o Os órgãos e entidades deverão manter exemplar da publicação prevista no
caput para consulta pública em suas sedes.
§ 2o Os órgãos e entidades manterão extrato com a lista de informações
classificadas, acompanhadas da data, do grau de sigilo e dos fundamentos da
classificação.

Pelo comando legal, portanto, deveriam estar elencadas nesta página o rol anual de todos os documentos classificados como sigilosos pela agência, bem como seus fundamentos, o que acabaria constituindo a quase totalidade dos documentos públicos da agência, classificados genericamente como “documentos preparatórios”, como demonstrado anteriormente. De forma espantosa, porém, a página da Ancine traz apenas a seguinte informação:

“De 01/01/2021 até 31/05/2022 a ANCINE não classificou ou desclassificou informações.”

Trata-se de afirmação evidentemente falsa, visando não só coibir o acesso público às informações públicas, mas também burlar a fiscalização dos órgãos de controle sobre o cumprimento da Lei de Acesso à Informação.

3. REGULAMENTAÇÃO INTERNA DA LAI (LEI DE ACESSO À INFORMAÇÃO)

Já existe um processo administrativo na Ancine que tenta regulamentar a classificação de sigilo nos documentos da agência de acordo à Lei de Acesso à Informação: o processo 01580.057015/2016-02, que propõe uma tabela (doc. SEI 1801938) especificando que grau de sigilo é aplicável a cada tipo de informação. De acordo a esta proposta, os documentos preparatórios devem seguir o “Princípio da máxima divulgação, ponderando-se verificação de risco ao processo ou à sociedade), conforme orientação do 4o Edição do Manual de Aplicação da Lei de Acesso à Informação na Administração Pública Federal da Controladoria-Geral da União – CGU” e deve ocorrer “Publicidade ao fim do prazo de execução do projeto de fomento ou quando essa informação não representar risco à regular execução da produção do projeto de fomento.”
Esta Proposta de Ação (doc. SEI 1800809 e 1801934) foi encaminhada à Diretoria Colegiada para deliberação em 23/10/2020, porém só foi incluída em pauta na Reunião de Diretoria Colegiada de 12/04/2022, quando foi aprovada por unanimidade a Deliberação de Diretoria Colegiada N.o 723-E:
“A Diretoria Colegiada decidiu por unanimidade pela manutenção do processo em pauta devido à necessidade de aprofundamento da discussão sobre a matéria.”
A proposta ainda voltaria à pauta das reuniões da Diretoria Colegiada de 20/04/2022 e 03/05/2022, sempre com a mesma deliberação sobre “necessidade de aprofundamento da discussão sobre a matéria.” Apesar desta alegada necessidade de aprofundamento da discussão, desde então o processo administrativo se encontra absolutamente parado, sem nenhum tipo de “aprofundamento da discussão”. Curiosamente o processo se encontra ilegalmente classificado como sigiloso enquanto “documento preparatório”, contrariamente à própria proposta, que simplesmente determina a necessidade de cumprimento da Lei de Acesso à Informação. O que se percebe é que a proposta está pronta para aprovação há mais de dois anos, e a Diretoria Colegiada da Ancine usa o argumento da “necessidade de aprofundamento da discussão sobre a matéria.” para protelar deliberadamente o cumprimento da Lei de Acesso à Informação por parte da agência.

4. PEDIDOS DE ACESSO À INFORMAÇÃO

O uso da plataforma Fala.br, da CGU, acaba sendo o único recurso para o cidadão tentar algum grau de acesso aos processos, mas de forma muito incerta, já que a agência muitas vezes nega os pedidos sem fundamento algum (ou com fundamentos manifestamente ilegais), e os recursos nunca são aceitos por nenhuma instância superior, a não ser quando eventualmente se tem tempo e paciência para recorrer até a instância da CGU. Em 2021 a Diretoria Colegiada da Ancine julgou 13 recursos de pedidos de acesso à informação em primeira instância, e 10 em segunda instância.

Apenas 2 foram parcialmente deferidos e nenhum foi integralmente deferido. Em 2022, todos foram indeferidos. Na prática, é como se a agência não tivesse instâncias recursais internas.
Além disso, a Ancine recorrentemente presta informações falsas ao sistema Fala.br: classifica as respostas como “conclusivas”, como se os acessos tivessem sido concedidos, mas na resposta de fato há apenas um link vazio, com a promessa de que dentro de 60 ou 90 dias será disponibilizado o conteúdo naquele link. O problema é que em casos de prorrogação de prazo, a prorrogação deve ser registrada oficialmente no sistema da CGU, já que de fato não houve ainda “resposta conclusiva”.
Isso traz no mínimo dois problemas: retira o direito de recurso do solicitante, já que quando o conteúdo for disponibilizado, ou mesmo se nada for disponibilizado no link, o prazo no sistema para recurso já terá se esgotado; e ao mesmo tempo é uma forma de burlar o controle da CGU, pois distorce as estatísticas anuais de cumprimento da LAI e impede o devido acompanhamento por parte da CGU. Dentre os muitos exemplos de pedidos de informação recentes no sistema Fala.br em que essa estratégia foi utilizada pela agência, podemos citar as solicitações de informação de protocolo 01481.000376/2022-35 e 01481.000379/2022-79.
Outro problema recorrente é o indeferimento de pedidos de acesso à informação a documentos que já deveriam ser públicos, mantidos ilegalmente em sigilo enquanto “documentos preparatórios” mesmo após a edição do respectivo ato decisório, sob a alegação de que seriam pedidos “desproporcionais e irrazoáveis, pois prejudicariam a continuidade dos serviços”, como se a transparência não fizesse parte das atividades de rotina da agência.

5. PLANO DE COMUNICAÇÃO INSTITUCIONAL

A Ancine também vem descumprindo reiteradamente determinações expressas da Lei Geral das Agências Reguladoras e da Lei de Acesso à Informação por conta da não publicação do Plano de Comunicação Institucional, cuja obrigatoriedade é estabelecida no art. 16 da Lei 13.848/19:
“Art. 16. A agência reguladora deverá implementar, em cada exercício, plano de
comunicação voltado à divulgação, com caráter informativo e educativo, de suas
atividades e dos direitos dos usuários perante a agência reguladora e as empresas
que compõem o setor regulado.”

Ressaltamos que o artigo está incluído no “CAPÍTULO II – DA PRESTAÇÃO DE CONTAS E
DO CONTROLE SOCIAL” e que outras agências reguladoras publicam anualmente desde 2020 os respectivos Planos de Comunicação Institucional em seus respectivos sites, na seção “Transparência e Prestação de Contas”, como a Agência Nacional de Saúde Suplementar.

Apesar de a Lei Geral das Agências Reguladoras ser de 2019, a Ancine não elaborou Plano de Comunicação Institucional em 2020 nem 2021. Em 2022, a Assessoria de Comunicação da Agência elaborou uma minuta, que se encontra há meses pronta para ser votada pela Diretoria Colegiada, mas nunca é colocada em pauta. Não se pode ter acesso à minuta ou aos documentos do respectivo processo (01416.003206/2022-96) porque está integralmente classificado como sigiloso enquanto “documento preparatório”, o que contraria a Lei de Acesso à Informação e o Manual de Aplicação da LAI da CGU, que não proíbem o acesso aos documentos preparatórios, pelo contrário, determinam que sua publicidade deve ser a regra, e o sigilo só se justifica quando a publicidade do documento
representar risco à finalidade do processo, como em investigações, o que não é o caso.
Solicitamos acesso ao processo via LAI através da plataforma Fala.br, mas o Assessor de
Comunicação indeferiu com a justificativa de tratar-se de documentos preparatórios, e acrescentou em seu Despacho n.o 36-E/2022/ACO (doc SEI 2526256) que o processo “foi encaminhado à Secretaria da Diretoria Colegiada (SDC), a pedido da Assessoria de Comunicação (ACO), para inclusão em pauta de Reunião de Diretoria Colegiada para deliberação. Cumpre esclarecer que, tão logo seja aprovado, o processo administrativo constará com nível de acesso público.” O Despacho é de 24/08/2022, desde então já ocorreram diversas reuniões da Diretoria Colegiada (que são semanais), e até hoje o Plano não foi colocado em pauta, sem qualquer justificativa legal ou técnica.
Tampouco a diretoria poderia alegar o adiamento por falta de tempo nas reuniões, que costumam ser extremamente breves e cada ponto de pauta costuma ser decidido e deliberado em menos de 3 minutos. Caso a diretoria não quisesse aprovar a minuta apresentada, bastaria indeferi-la ou solicitar as adaptações necessárias à área técnica, mas optou pela protelação indefinida. A inércia da Diretoria Colegiada da Ancine em aprovar uma minuta que supostamente já está pronta é ainda mais espantosa se considerarmos que se trata de um plano para o ano de 2022, e o ano já se aproxima de seu fim, inviabilizando a própria efetividade do plano.
O que se percebe é que a Diretoria Colegiada está protelando deliberadamente a aprovação de um Plano que já é legalmente obrigatório desde 2019, e assim impedindo sua publicização. A Lei Geral das Agências prevê que o Plano de Comunicação Institucional seja um dos instrumentos de controle social e de transparência, portanto sua não publicização é grave, ainda mais se considerarmos o contexto de falta de transparência generalizada na Ancine atualmente. Em resumo, o não cumprimento da Lei Geral das Agências Reguladoras é grave e está inserido num processo de crescente restrição da Ancine às ferramentas legais de transparência e controle social. Esta protelação imotivada por tempo indefinido tem o claro objetivo de obstar o controle social das ações da agência e o direito fundamental de acesso à informação dos cidadãos. Assim, solicito ao MPF a
apuração das responsabilidades pelas infrações à lei aqui apontadas, e que tome as providências judiciais cabíveis para que a Ancine aprove e publicize seu Plano de Comunicação Institucional.

6. CONTRATOS DE PUBLICIDADE

Corroborando a falta de transparência na comunicação institucional da Ancine, a agência descumpre a Lei no 12.232/2010 e Instrução Normativa SECOM/PR no 4/2010 por não publicar em seu site nenhuma informação sobre nenhum contrato de publicidade, impedindo qualquer forma de controle social. Estabelece o art. 16 da Lei no 12.232/2010:

Art. 16. As informações sobre a execução do contrato, com os nomes dos
fornecedores de serviços especializados e veículos, serão divulgadas em sítio
próprio aberto para o contrato na rede mundial de computadores, garantido o livre
acesso às informações por quaisquer interessados.
Parágrafo único. As informações sobre valores pagos serão divulgadas pelos totais
de cada tipo de serviço de fornecedores e de cada meio de divulgação.

A regra nos contratos administrativos da Administração Pública é a transparência, mas o
legislador deu especial atenção aos contratos de publicidade por seu enorme interesse público.
Além da falta de publicização dos contratos de publicidade no site da agência, todos os
respectivos processos administrativos são ilegalmente classificados como sigilosos,
transformando a comunicação institucional da agência numa atividade desempenhada à sombra do controle social.

7. ACORDOS DE COOPERAÇÃO

Os acordos de cooperação entre a Administração Pública e organizações da sociedade civil são regidos pela Lei 13.019/14 e Decreto 8.726/16. A Ancine, no entanto, vem descumprindo absolutamente todos os dispositivos destas normas referentes à publicidade e transparência. Até 2019, a Ancine só celebrava acordos de cooperação com outras entidades públicas, e todos os acordos eram publicados no site da agência. A partir de 2020, a Ancine passou a assinar acordos se cooperação com entidades privadas, sem qualquer publicação no site da agência, no Portal da Transparência ou sequer do Diário Oficial da União, além da classificação ilegal dos respectivos processos como sigilosos. Em outras palavras, a Ancine criou uma nova modalidade de acordos secretos, de conteúdo completamente inacessível ao público, completamente incompatíveis com um Estado Democrático de Direito. Já havíamos enviado representação ao MPF sobre um destes
casos, sobre um acordo secreto celebrado entre Ancine e Motion Pictures Association, jamais publicado sequer no D.O.U. Não se trata, no entanto, de caso isolado: Se enquadram na mesma situação, por exemplo, os acordos de cooperação contidos nos processos administrativos 01416.005657/2020-04 e 01416.002168/2020-92. A rigor, como a Ancine parou de dar publicidade a qualquer acordo celebrado a partir de 2020, e todos os processos administrativos da agência são mantidos ilegalmente em sigilo, fica impossível saber a quantidade exata de acordos ou convênios nesta situação de ilegalidade.
A falta de publicização dos acordos de cooperação e respectivos planos de trabalho no site da agência caracteriza descumprimento do art. 10 da Lei 13.019:

Art. 10. A administração pública deverá manter, em seu sítio oficial na internet, a
relação das parcerias celebradas e dos respectivos planos de trabalho, até cento e
oitenta dias após o respectivo encerramento.

Já a falta de publicização dos extratos dos acordos no Diário Oficial da União caracteriza
descumprimento do art. 398 da Lei 13.019 e, para além disso, caracteriza a própria nulidade do respectivo acordo, que só passa a produzir efeitos jurídicos após sua publicização:

Art. 38. O termo de fomento, o termo de colaboração e o acordo de cooperação
somente produzirão efeitos jurídicos após a publicação dos respectivos extratos no
meio oficial de publicidade da administração pública.

Reforçamos que estas exigências legais se aplicam inclusive aos acordos de cooperação que não envolvam diretamente repasse de recursos públicos, pois qualquer tipo de acordo da Administração com entidades privadas deve respeitar os princípios constitucionais da legalidade e da publicidade.
Outro aspecto que merece atenção é que a Ancine tem realizado todos estes acordos por meio da modalidade de inexigibilidade de Chamamento Público, mas a Lei 13.019 determina que, em casos de inexigibilidade, a justificativa deve ser publicada no site e/ou do D.O.U, mas a Ancine não tem dado nenhuma publicidade à inexigibilidade, outra ilegalidade que torna os respectivos acordos nulos por violação aos princípios da isonomia e da publicidade:

Art. 32. Nas hipóteses dos arts. 30 e 31 desta Lei, a ausência de realização de
chamamento público será justificada pelo administrador público.
§ 1o Sob pena de nulidade do ato de formalização de parceria prevista nesta Lei, o
extrato da justificativa previsto no caput deverá ser publicado, na mesma data em
que for efetivado, no sítio oficial da administração pública na internet e,
eventualmente, a critério do administrador público, também no meio oficial de
publicidade da administração pública.

8. CONTRATOS DE GESTÃO

A Ancine disponibiliza em seu site apenas informações mínimas sobre os contratos de gestão da agência, omitindo as informações principais: valores e identificação das empresas contratadas. É um mecanismo de transparência meramente formal, sem nenhuma efetividade, uma vez que inviabiliza o controle social de fato. Uma das normas que essa falta de transparência sobre os contratos transgride é a Lei 12.527 (Lei de Acesso à Informação), que determina:

Art. 8o É dever dos órgãos e entidades públicas promover, independentemente de
requerimentos, a divulgação em local de fácil acesso, no âmbito de suas
competências, de informações de interesse coletivo ou geral por eles produzidas ou
custodiadas […]
IV – informações concernentes a procedimentos licitatórios, inclusive os respectivos
editais e resultados, bem como a todos os contratos celebrados.

Mais explícitas ainda são as determinações do TCU, aplicáveis a toda a Administração Federal:

ACÓRDÃO No 2622/2015 – TCU – Plenário
9.2.1.8. publicar todos os documentos que integram os processos de aquisição
(e.g., solicitação de aquisição, estudos técnicos preliminares, estimativas de preços,
pareceres técnicos e jurídicos etc.) na internet, a menos dos considerados sigilosos
nos termos da lei, em atenção aos arts. 3°, I a V, 5o, 7o, VI e 8o, §1o, IV e §2o, da Lei
12.527/2011;
9.2.1.9. determinar a publicação, na sua página na internet, da decisão quanto à
regularidade das contas proferida pelo órgão de controle externo;

Perceba-se que nada disso é publicado pela Ancine em seu site. A título meramente exemplificativo, outras agências reguladoras, como a ANS, disponibilizam em seu site informações detalhadas de cada contrato, inclusive a integralidade dos textos dos contratos, com as respectivas notas de empenho.
O fato de ser possível consultar os valores dos contratos no Portal da Transparência não diminui o fato de que a Ancine não cumpre as determinações da LAI e do TCU, não publica em seu site nenhum detalhe, nenhum documento que integre os processos de aquisição, enfim, parece querer dificultar ao máximo a possibilidade de controle social de seus contratos. Importante lembrar ainda que tampouco cumpre o item 9.2.1.9. do Acórdão do TCU, uma vez que não publica as decisões quanto à regularidade das contas proferidas pelo órgão de controle externo. E o fato de todos os processos da agência referentes a contratos de gestão estarem sob a classificação ilegal de sigilo como “documentos preparatórios” torna os detalhes dos contratos públicos praticamente secretos.

9. DESFAZIMENTO DE BENS

Atualmente a Ancine só publica em seu site informações sobre alguns processos de desfazimento de bens, mas estranhamente oculta outros. Trata-se de informações de óbvio interesse público e de publicização obrigatória de acordo ao art. 8o da Lei de Acesso à Informação. Alguns exemplos de processos de desfazimento de bens sem nenhuma informação publicada no site da agência:

https://www.gov.br/ancine/pt-br/acesso-a-informacao/institucional/competencias/licitacoes-e-contratos/desfazime
nto-de-bens-18 https://www.ans.gov.br/aans/licitacoes-contratos/contratos

https://www.gov.br/ancine/pt-br/acesso-ainformacao/institucional/competencias/licitacoes-e-contratos/contratos-por-ano

● 01416.007104/2020-88 (há um link no site que não funciona)
● 01416.010816/2021-65
● 01580.055960/2015-81

Além disso, todos os processos de desfazimento de bens da agência são ilegalmente classificados como sigilosos, sem o mínimo de transparência exigida pela Lei de Acesso à Informação, inviabilizando o controle social.

10. CONSELHOS E ÓRGÃOS COLEGIADOS

A Ancine possui em sua estrutura diversos órgãos que em teoria visam garantir participação social, integridade e assessoramento técnico, mas não constam informações sobre nenhum deles no site da agência, que tem uma página específica para “Conselhos e órgãos colegiados”, mas completamente vazia. Não são mais públicas, por exemplo, informações sobre:

● Comissão de Licitação
● Comissão de Ética
● Comitê de Governança do Sistema ANCINE Digital
● Comitê de Segurança da Informação e Comunicações
● Comitê de Governança, Riscos e Controles
● Câmara Técnica de Exibição
● Câmara Técnica de Acessibilidade
● Comissão de Monitoramento e Avaliação
● Conselho Editorial do OCA
● Comitê do Observatório do Cinema e do Audiovisual
● Comissão de Raça, Gênero e Diversidade

Alguns destes órgãos colegiados têm caráter obrigatório por lei, outros foram instituídos no
Regimento Interno da Ancine e outros exercem (ou exerciam) função importante enquanto assessoria técnica e instrumento de participação social. Uma vez que a Ancine deixou de divulgar em seu site qualquer informação sobre qualquer um deles, é impossível saber sobre sua composição, suas reuniões, suas atividades e deliberações, e até mesmo se ainda existem.
Outro problema é que a escolha dos membros das Comissões de Ética e de Correição, fundamentais para a integridade da agência, já não passa por processo seletivo interno, como ocorria até 2020. A escolha dos integrantes dessas Comissões é de competência do Diretor-Presidente, mas a agência não tem nada a ganhar com o fim do processo seletivo interno, que dava transparência e democratizava o processo. Não só não há processo seletivo, como a agência não normatizou os perfis ou requisitos desejados. Até mesmo saber quem são os componentes das comissões é tarefa difícil, uma vez que a Ancine não divulga os membros da Comissão de Ética, e a última publicaçãodos membros da Comissão de Correição data de 2019, e há mandatos que já venceram.

Destacamos, por fim, que a inexistência da Comissão de Monitoramento e Avaliação, cuja
obrigatoriedade foi estabelecida pela Lei 13.019/14, impede que a Ancine monitore a execução e metas dos acordos de cooperação com entidades privadas, que a agência tem firmado também sem qualquer publicidade, conforme Representação MPF 20220074253/2022(PR-RJ-00094015/2022).

11. CONSULTAS PÚBLICAS

A consulta pública é uma das principais ferramentas de consolidação da participação social na Administração Pública, e foi definitivamente consagrada na Lei Geral das Agências Reguladoras (Lei 13.848/2019), que a tornou obrigatória:

Art. 9o Serão objeto de consulta pública, previamente à tomada de decisão pelo
conselho diretor ou pela diretoria colegiada, as minutas e as propostas de alteração
de atos normativos de interesse geral dos agentes econômicos, consumidores ou
usuários dos serviços prestados.
§ 1o A consulta pública é o instrumento de apoio à tomada de decisão por meio do
qual a sociedade é consultada previamente, por meio do envio de críticas,
sugestões e contribuições por quaisquer interessados, sobre proposta de norma
regulatória aplicável ao setor de atuação da agência reguladora.
§ 2o Ressalvada a exigência de prazo diferente em legislação específica, acordo ou
tratado internacional, o período de consulta pública terá início após a publicação do
respectivo despacho ou aviso de abertura no Diário Oficial da União e no sítio da
agência na internet, e terá duração mínima de 45 (quarenta e cinco) dias,
ressalvado caso excepcional de urgência e relevância, devidamente motivado.
§ 3o A agência reguladora deverá disponibilizar, na sede e no respectivo sítio na
internet, quando do início da consulta pública, o relatório de AIR, os estudos, os
dados e o material técnico usados como fundamento para as propostas submetidas
a consulta pública, ressalvados aqueles de caráter sigiloso.
§ 4o As críticas e as sugestões encaminhadas pelos interessados deverão ser
disponibilizadas na sede da agência e no respectivo sítio na internet em até 10 (dez)
dias úteis após o término do prazo da consulta pública.
§ 5o O posicionamento da agência reguladora sobre as críticas ou as contribuições
apresentadas no processo de consulta pública deverá ser disponibilizado na sede
da agência e no respectivo sítio na internet em até 30 (trinta) dias úteis após a
reunião do conselho diretor ou da diretoria colegiada para deliberação final sobre a
matéria.

Ocorre, porém, que a Ancine vem descumprindo tanto a determinação legal de realizar consultas públicas quanto, nas consultas públicas realizadas, a determinação de publicizar seus resultados.
Numa Consulta Pública, os cidadãos e entidades civis se empenham em contribuir, portanto o mínimo que se espera é que seus resultados sejam públicos, mas nem sempre é o que ocorre na Ancine. Um exemplo é a “Consulta Pública sobre Normatização do tratamento, pela ANCINE, de notícias de violações de direitos autorais na Internet e as respectivas medidas de contenção de danos”

(processo 01416.003145/2020-03), que recebeu contribuições até 03/04/2021. As
contribuições recebidas só foram publicadas em setembro de 2022, um ano e meio após o prazo legal, após questionamentos da Associação de Servidores Públicos da Ancine. O mais importante, porém, é o resultado da consulta pública, porém, que consiste no seu relatório de consolidação, com as respostas da agência às contribuições, conforme determina o art. 9o da Lei Geral das Agências Reguladoras, e nunca foi publicado. E nunca houve qualquer encaminhamento da Consulta Pública, denunciamos o descumprimento da Lei Geral das Agências Reguladoras pela Ancine, pois a agência deixou de realizar consulta
pública obrigatória para flexibilizar a regulação do direito de acessibilidade de pessoas com deficiência a salas de cinema, dentre outros problemas na referida alteração normativa.

nenhuma regulação sobre o tema foi proposta ou aprovada, enfim, nada foi feito a partir das contribuições do sociedade, o que faz que a Coordenação de Combate à Pirataria da Ancine atue sem um arcabouço normativo que regulamente suas atividades. Não se trata, porém, de caso isolado. Alguns outros exemplos de consultas públicas que nunca tiveram seus resultados publicados pela Ancine são:

● 01416.000315/2020-90 – Minuta de alteração da Instrução Normativa no 125, a qual
regulamenta a elaboração, apresentação, análise, aprovação e acompanhamento da
execução de projetos audiovisuais realizados por meio de ações de fomento indireto e de
fomento direto
● 01416.009845/2020-01 – Notícia Regulatória acerca da revisão normativa sobre lançamento
comercial de obras audiovisuais fomentadas
● 01416.005791/2020-05 – Notícia Regulatória sobre a avaliação dos resultados regulatórios do
Instituto do “Poder Dirigente”
● 01416.006469/2020-95 – Proposta de Agenda Regulatória da ANCINE para o Biênio de 2021
a 2022
Importante destacar também que, em todos os exemplos citados, houve também descumprimento § 3o do art. 9o da Lei 13.848, pois não foi disponibilizada Análise de Impacto Regulatório para Consulta Pública, apenas as respectivas minutas de normas regulatórias. Uma simples minuta sem a análise técnica correspondente sobre seus impactos regulatórios obviamente não é suficiente para que as pessoas e entidades possam formar uma opinião tecnicamente embasada sobre o tema, portanto é um prejuízo enorme à efetividade das Consultas que, afinal, não tiveram divulgação de seus resultados.
É preciso reiterar, ainda, que todos os processos administrativos de consultas públicas encontram-se ilegalmente classificados como sigilosos enquanto “documentos preparatórios”. Toda esta falta de transparência, além de ilegal, é um desrespeito à participação social, às pessoas e entidades que enviam suas contribuições. Sem publicização dos resultados, as consultas públicas perdem seu sentido e finalidade.

12. AUDIÊNCIAS PÚBLICAS

Outro instrumento de participação social consagrado na Lei 13.848 é a audiência pública, que não é obrigatória da mesma forma que a consulta pública, mas é extremamente importante para a construção democrática e transparente das normas regulatórias de grande impacto social. O que a lei estabelece como obrigatória é a publicidade dos relatórios de audiências públicas e outros meios de participação dos interessados:

Art. 12. Os relatórios da audiência pública e de outros meios de participação de
interessados nas decisões a que se referem os arts. 10 e 11 deverão ser disponibilizados na sede da agência e no respectivo sítio na internet em até 30 (trinta) dias úteis após o seu encerramento.

Desde 2019, porém, quando entrou em vigor a Lei 13.848, a Ancine não realizou nenhuma audiência pública. Realizou, no entanto, três reuniões com entidades da sociedade civil sobre a flexibilização regulatória do direito de acessibilidade das pessoas com deficiências às salas de cinema. Não publicizou, no entanto, nenhuma ata, relatório ou qualquer informação sobre tais reuniões nem sobre reuniões das câmaras técnicas ou qualquer outra com a sociedade civil, em desrespeito expresso ao art. 12 da Lei Geral das Agências. Reunião pública sem nenhuma publicidade configura uma reunião secreta, à sombra do debate público e democrático, se reduz a conchavo de bastidor, prática ilegal
completamente contrária aos princípios da participação social e da transparência que deveriam justificar a própria existência de tais reuniões.

13. OBSERVATÓRIO BRASILEIRO DO CINEMA E DO AUDIOVISUAL (OCA)

Um dos instrumentos regulatórios utilizados pela Ancine é a publicação de dados, análises, relatórios e informes sobre o mercado audiovisual, de forma a fornecer suporte técnico aos próprios agentes do mercado para a auto-regulação, e também visando a transparência pública através da prestação de contas à sociedade sobre os resultados das políticas audiovisuais. Desde 2008, estas publicações eram feitas prioritariamente através do Observatório brasileiro do Cinema e do Audiovisual (OCA), hospedado no próprio site da Ancine. O OCA costumava ser uma importante fonte de informações para agentes do mercado, pesquisadores acadêmicos, servidores públicos, jornalistas, amantes do
audiovisual e sociedade civil em geral, sendo o site brasileiro mais completo em volume de dados sobre a indústria audiovisual. Ultimamente, no entanto, as publicações do OCA foram reduzidas de tal forma que muitos de seus principais relatórios e informes estão desatualizados há anos.
A publicação de dados sobre recursos públicos, fundamental para a transparência e controle social, está desatualizada desde 2018 em muitos relatórios. A quantidade de relatórios publicados vem diminuindo anualmente. O OCA publicou, por exemplo, 10 relatórios sobre o ano cinematográfico de 2018, e cinco sobre o ano de 2020. Sobre o ano de 2021, houve até agora apenas duas publicações.
Esta redução das publicações é consequência direta do esvaziamento da estrutura do OCA, que até 2020 possuía uma coordenação própria, e agora é atribuição de uma coordenação que, pelo Regimento Interno, precisa ainda dar conta de outras 10 competências. Como se não bastasse, a Ancine extinguiu o Conselho Editorial do OCA e o Comitê do Observatório do Cinema e do Audiovisual, que tinham importante função de assessoria técnica e editorial, parte essencial do processo de validação de qualquer trabalho de pesquisa. Sem estes conselhos, perde-se também o rigor técnico e científico que deveria nortear os trabalhos publicados. Na verdade, devido à falta de transparência, ninguém sabe ao certo se estes órgãos colegiados foram formalmente extintos ou simplesmente deixaram de ser convocados.
Destacamos que as publicações do OCA não são úteis apenas para agentes do mercado e
pesquisadores, pois servem à toda a sociedade enquanto mecanismo de transparência. A própria página do OCA reconhece que nele “são disponibilizados os Dados Abertos da Agência, em atendimento ao Decreto no 8.777, de 11 de maio de 2016, que instituiu a Política de Dados Abertos do Poder Executivo Federal”.
Não apenas o OCA, mas todo o site da Ancine vem sendo esvaziado de sua função. Os dados de fomento estão desatualizados há pelo menos dois anos, e toda a seção referente a Transparência apresenta um grave déficit deliberado de informações básicas, conforme demonstrado ao longo do presente texto. Até mesmo a seção “Transparência ativa” está desatualizada desde 2020, o que retira toda a efetividade da suposta transparência da agência, que está mais para inercial que ativa.
O site da Ancine tinha ainda a função de ser um centro de notícias sobre o audiovisual brasileiro, com divulgações constantes sobre o lançamento de todos os novos filmes brasileiros, a participação brasileira em festivais e workshops internacionais, era o canal onde profissionais do audiovisual e público podiam acompanhar o desempenho do audiovisual brasieiro, mas ao longo dos últimos anos têm sido raras as publicações no site da agência, que entrou em estado vegetativo. A agência, abdicando de seu papel institucional, até deixou de divulgar em seu site os novos lançamentos de
filmes brasileiros em salas de cinema, após uma denúncia, em 2019, de que teria censurado a divulgação do lançamento do documentário “Torre das donzelas”, sobre uma prisão política feminina da ditadura militar.

14. PLANO DE DIRETRIZES E METAS

Na reunião do Conselho Superior de Cinema de 21/10/2021, a Ancine apresentou os resultados do Plano de Diretrizes e Metas para o Audiovisual 2011-2020, e ficou responsável pela condução dos trabalhos do GT responsável por elaborar o PDM seguinte. Até hoje, no entanto, a Ancine não apresentou os resultados do PDM 2011-2020, não apresentou qualquer proposta para o PDM seguinte nem debateu sua elaboração com servidores ou sociedade. Além disso, o respectivo processo administrativo referente ao PDM 2011-2020 segue classificado como sigiloso, uma análise técnica que é feita justamente com o objetivo de máxima divulgação dos resultados das políticas
audiovisuais na última década. Considerando a importância do PDM para a avaliação, planejamento e controle social das políticas audiovisuais, é grave que ainda seja mantido em sigilo tanto tempo depois de sua conclusão.
Igualmente preocupante é o longo atraso na aprovação de um novo Plano de Diretrizes e Metas para a década atual. A indústria audiovisual tem um ciclo longo em sua cadeia produtiva, e na quase totalidade das vezes cada obra leva anos entre o desenvolvimento inicial e sua distribuição final, portanto a eficiência e efetividade das políticas audiovisuais dependem de um planejamento de longo prazo, sem o qual a atuação da agência acaba por ser imediatista e casuístico. É importante também que o processo de elaboração do novo PDM seja democrático e participativo, com possibilidade de contribuições de servidores, profissionais do audiovisual e sociedade civil, mas não é o que tem ocorrido, com a elaboração do novo PDM ocorrendo em sigilo absoluto.

15. COMBATE À CORRUPÇÃO (ENCCLA)

Em 2021, a Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (ENCCLA, articulação de diversos órgãos de controle como MPF, TCU, CGU, PF, RFB, etc), realizou diagnóstico da situação de diversos órgãos federais quanto a seus mecanismos de combate à corrupção (processo 01416.006700/2021-21). O Relatório de Diagnóstico (doc SEI 2290979) classifica a Ancine no nível vermelho, o mais alto nível de “risco de suscetibilidade à corrupção” devido à baixíssima adesão da agência às medidas mais básicas de prevenção e combate à corrupção. Nas respostas da própria Ancine ao questionário (docs SEI 2085004 e 2088726), já se pode perceber a pouquíssima atenção que a gestão da agência dá a medidas de transparência e integridade. A agência deu respostas totalmente negativas, por exemplo, aos seguintes questionamentos:
● Questão: 9 – Sua organização estabeleceu um sistema de decisões com poderes balanceados e segregação de funções?
● Questão: 12 – Sua organização estabeleceu política e práticas de gestão de relacionamento com entidades e pessoas que recebam dela recursos financeiros ou que dependam de seu poder de compra
e/ou regulação?
● Questão: 13 – Sua organização estabeleceu processo de gerenciamento de riscos e instituiu mecanismos de controle interno para a prevenção e o combate à fraude e à corrupção?
● Questão: 19 – Sua organização implementou controles para detectar indícios de casos de fraude e corrupção nos registros de suas atividades?
● Questão: 23 – A sua organização possui a prática de avaliação dos controles preventivos contra a fraude e corrupção?
● Questão: 24 – A sua organização avalia a cultura e gestão da ética e da integridade?
● Questão: 26 – Sua organização estabeleceu uma sistemática de divulgação de relatórios que tratam de fraude e corrupção?
● Questão: 27 – Sua organização mantém um plano de resposta a fraude e corrupção?

Na verdade, todas as respostas da agência quanto às questões dos tópicos Investigação e Correção são negativas, pois a agência não adota nenhuma das práticas propostas. Mesmo a resposta à questão 2, sobre comportamento ético e íntegro da alta direção, foi quase totalmente negativa, o que revela que a falta de preocupação com a questão da integridade vem desde o topo da gestão. Este descaso com a transparência e integridade, aliás, pode ser percebido no próprio processo, uma vez que a Ancine prestou diversas informações falsas em suas respostas. Por tudo que já expusemos sobre o reiterado descumprimento da Lei de Acesso à Informação, percebe-se facilmente que as seguintes respostas da agência são falsas:

Questão: 14 – Sua organização promove a cultura da transparência e divulgação
proativa de informações, utilizando-se especialmente dos meios de tecnologia?
2 – As principais informações da minha organização estão prontamente disponíveis
ao público e atualizadas na internet em formato aberto, pesquisável e exportável,
sem necessidade de identificação ou registro do interessado.
4 – Minha organização disponibiliza as principais informações em formatos
compatíveis com as necessidades especiais das pessoas com deficiência.
Questão: 15 – Sua organização regulamentou internamente a Lei de Acesso à
Informação – LAI?
1 – Minha organização normatizou internamente o funcionamento de seu Serviço de
Informação ao Cidadão (SIC e e-SIC) em todos os canais.
2 – Minha organização normatizou internamente os critérios para classificação de
informações sigilosas por autoridade específica ou Comissão de Reavaliação de
Informações Sigilosas e definiu as penalidades em caso de descumprimento, bem
como as instâncias recursais.
Questão: 18 – Sua organização promove a cultura da prestação de contas e
responsabilidade pela governança e gestão?
1 – Minha organização mantém atualizadas informações completas sobre a gestão
em seu site na internet (objetivos, indicadores, metas, prazos e resultados
alcançados).
3 – Minha organização divulga em seu site na internet seus documentos relativos a
procedimentos e processos de contratação e contratos firmados, execução
orçamentária e financeira, além de gestão de pessoas e benefícios oferecidos.

Ora, como já foi demonstrado no item 3 da presente denúncia, a proposta de regulamentação interna da LAI na Ancine (processo 01580.057015/2016-02) aguarda aprovação da Diretoria Colegiada há mais de dois anos, portanto as respostas à questão 15 são flagrantemente falsas. É extremamente grave que a agência preste informações falsas aos órgãos de controle, ainda mais num processo que pretende avaliar justamente o nível de integridade da agência.
Como consequência do diagnóstico extremamente negativo, a Ancine aprovou um plano de ação de combate à corrupção (doc SEI 2338502), mas curiosamente o plano não prevê a implementação da maioria das medidas de combate à corrupção sugeridas pela ENCCLA porque a agência considera que os procedimentos internos existentes já suprem as necessidades. Ao mesmo tempo, a agência afirma já ter implementado diversas ações que nunca realizou de fato, informando falsamente que “adota processo seletivo para seus cargos com divulgação de critérios e resultados, inclusive os de
direção” e que “mantém sua normatização interna da Lei de Acesso à Informação (LAI) no sítio da organização, em local de fácil acesso”.
Assim, ao prestar informações falsas, a gestão da agência vem deliberadamente burlando os órgãos de controle, enquanto impede o controle social de suas atividades. A consequência óbvia é o aumento exponencial do risco de suscetibilidade à corrupção, conforme o próprio Relatório de Diagnóstico da ENCCLA.

16. ÍNDICE DE GOVERNANÇA E GESTÃO PÚBLICAS (TCU)

Em 2021 o Tribunal de Contas da União divulgou os resultados da avaliação de diversos órgãos federais do Índice Integrado de Governança e Gestão Públicas (IGG), processo
01416.003448/2021-07. Apesar de o TCU ter recomendado expressamente em seu relatório apublicização, a Ancine não o publicou nem divulgou: “O TCU fará divulgação das informações do levantamento, mas, em atendimento ao princípio da transparência, recomenda que essa organização também publique em seu próprio site e divulgue as informações contidas neste relatório. “No relatório de 2021 o desempenho da Ancine piorou drasticamente em comparação ao relatório anterior, de 2018. O índice geral de governança e gestão (IGG) ficou em 48%, abaixo da média das agências reguladoras (60%) e do resultado da própria Ancine em 2018 (65%). Da terceira colocação entre as agências reguladoras em 2018, a Ancine caiu para o penúltimo lugar.
Mais uma vez, o desempenho da Ancine foi distorcido por diversas respostas falsas fornecidas pela agência (doc SEI 1994857). Apenas a título de exemplo de respostas que não correspondem à realidade, a agência respondeu de forma positiva, total ou parcialmente, às seguintes questões:
1121. Os membros da alta administração e de conselho ou colegiado superior estão
comprometidos com a integridade
1131. A escolha dos membros da alta administração é realizada com base em
critérios e procedimentos definidos
3111. Transparência ativa e passiva são asseguradas às partes interessadas
3112. A organização publica seus dados de forma aderente aos princípios de dados
abertos
3121. A organização presta contas diretamente à sociedade
3122. A organização publica extrato de todos os planos de sua responsabilidade e
respectivos relatórios de acompanhamento

3124. Mecanismos para apurar indícios de irregularidades e promover a responsabilização em caso de comprovação estão estabelecidos

A agência não adota de fato nenhuma destas medidas, conforme já demonstrado exaustivamente nos tópicos anteriores. Quanto ao plano de ação elaborado a partir do diagnóstico do TCU (doc SEI 2090447), grande parte dos prazos estabelecidos já venceram sem que as respectivas ações tenham sido implementadas, como “A escolha dos membros da alta administração é realizada com base em critérios e procedimentos definidos” e “A organização torna públicos os documentos relacionados com cada contratação, contemplando as fases de planejamento, seleção do fornecedor e gestão
contratual, excepcionados os casos de sigilo amparados pela legislação”, ambas com prazo definido para dezembro de 2021. Assim, da mesma forma que já demonstrado no tópico anterior referente ao diagnóstico da ENCCLA, a agência burla os órgãos de controle ao prestar informações falsas e não adotar as boas práticas de gestão sugeridas.

17. MONITORAMENTO DA MATURIDADE CORRECIONAL (CGU)

Em 04/10/2022, a Controladoria-Geral da União fez um alerta preocupante sobre o nível de
integridade da Ancine (doc. SEI 2574704). Em sua avaliação do Modelo de Maturidade Correcional, classificou a Ancine no nível 1 de Maturidade Correcional, o pior entre 6 níveis, e a agência atingiu apenas 4% do mínimo necessário para atingir o nível 2. Trata-se de mais um indicador importante de órgão de controle externo apontando a falta de instâncias e procedimentos adequados para garantir a correição, transparência e integridade da agência. Não obtivemos acesso à íntegra do respectivo processo porque a Ancine classificou o mesmo como sigiloso.

18. ÍNDICE DE DESEMPENHO INSTITUCIONAL (IDIN)

Até 2019, a Ancine publicava em seu site e no Diário Oficial da União os resultados do IDIN – Índice de Desempenho Institucional, com as principais metas anuais da agência. A partir de 2020 a Ancine não publica mais na página correspondente os resultados do IDIN, que agora integram o Plano de Gestão Anual. Ao contrário do que era feito anteriormente, a Ancine, publica apenas as taxas de resultado de cada indicador, sem especificar a sistemática de aferição e fórmula de cálculo, que davam transparência e ajudavam a entender o significado de cada indicador. A quantidade de indicadores analisados também caiu, de 28 em 2019 para 20 em 2021. A forma de cálculo dos indicadores, porém, não permite uma efetiva transparência sobre os resultados das atividades da
agência, pois são estabelecidos de forma tão genérica e tendenciosa que o cumprimento da maioria das metas não teria como ser menor que 100% – de fato, a média dos indicadores de 2021 foi de 96%, o que obviamente não ajuda num diagnóstico técnico, já que os resultados são sempre “perfeitos”. Apenas a título de comparação, observe-se a complexidade dos índices de metas anuais da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), que fornecem um diagnóstico infinitamente mais preciso sobre o desempenho da agência em suas diversas atividades.

Um dos indicadores, porém, chama particularmente a atenção: a “Emissão de Notificação Fiscal de Lançamento para Cobrança de Condecine”. A Condecine é a principal fonte de recursos do Fundo Setorial do Audiovisual, e a arrecadação e cobrança da chamada “Condecine-título” (art. 32, I, da MP no 2228-1) é de competência da Ancine. Este indicador diz respeito à cobrança da referida contribuição daqueles agentes econômicos que não o fizeram dentro do prazo legal.

Sistemática de Aferição: Esse indicador diz respeito à cobrança da CONDECINE.
A Superintendência de Fiscalização (SFI) realiza o procedimento administrativo de
lançamento dos créditos tributários, formalizando os valores correspondentes à
CONDECINE quando ocorrido o fato gerador e o pagamento não houver sido feito
com correção, adotando as providências cabíveis para o seu cumprimento. A SFI
deverá . expedir, de ofício, Notificação Fiscal de Lançamento (NFL) para que o
sujeito passivo pague o tributo devido, acrescido dos encargos e penalidades legais,
ou apresente impugnação, conforme regulamentação da Instrução Normativa no
60/07 e alterações posteriores.

Até o resultado do IDIN publicado em 2019 (referente ao ano 2018), a Ancine cumpria 100% desta meta de cobrança da Condecine. No resultado publicado em 2020, no entanto, o resultado referente a este indicador foi “ação não executada”, o que se repetiu em 2021. Devido à falta de transparência, não é possível saber o efetivo impacto desta ausência de cobrança sobre os recursos destinados ao Fundo Setorial do Audiovisual. É inegável, no entanto, que nenhum órgão possui autonomia para decidir informalmente não cobrar um tributo devido, e ao abrir mão de seu papel fiscalizatório a Ancine prejudica ao mesmo tempo os cofres públicos e as políticas audiovisuais do FSA.

19. GESTÃO DE RISCOS

Apesar de a Resolução da Diretoria Colegiada 78/2017 ter estabelecido a necessidade de
elaboração e aprovação de um Plano de Comunicação Gestão de Riscos, até hoje, 5 anos depois, a Ancine ainda não possui nenhum plano, o que obviamente prejudica a transparência e integridade da agência, e faz com que os riscos sejam enfrentados de forma casuística e amadora, contrariamente ao princípio da eficiência administrativa.

20. AGENDAS AUTORIDADES

Até mesmo a agenda das autoridades publicada no site da Ancine é meramente formal, com o onipresente “despachos internos” que não especificam os particulares que os gestores recebem em seus gabinetes ou outros locais, nem trazem qualquer informação sobre tais reuniões. Note-se que, no questionário da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (ENCCLA), sobre o qual já falamos anteriormente, a Ancine respondeu que já atende às seguintes recomendações sobre transparência das agendas de autoridades, o que não é verdade, como pode ser confirmado através de uma rápida consulta ao site da agência

● Membros da alta direção da minha organização divulgam os registros (data, hora, tema,
conteúdo etc.) de suas reuniões com particulares ou sua gravação.
● A agenda de reuniões da alta direção da minha organização com particulares é divulgada.

21. SOLICITAÇÕES NÃO RESPONDIDAS

Ao longo dos últimos anos, houve diversas tentativas por parte da Associação dos Servidores Públicos da Ancine (Aspac) de tratar os assuntos aqui abordados diretamente com a Diretoria Colegiada da agência, mas nunca conseguimos qualquer retorno aos e-mails e ofícios solicitando reunião. Para além do descaso com o diálogo democrático que este silêncio representa, nos ofícios protocolados a Aspac fez diversas solicitações de reunião, de informação, de anulação de contratos ilegais, etc. Tais solicitações foram protocoladas (e geraram processos administrativos) com base no direito constitucional de petição (art. 5o, XXXIV da CF/88), e a falta de qualquer resposta ou encaminhamento descumpre ao mesmo tempo a Constituição Federal e o art. 49 da Lei 9.784, que estabelece prazo de 30 dias para resposta da Administração. Seguem alguns protocolos com exemplos de ofícios protocolados pela associação e nunca respondidos:

● 00000.004814/2022-37
● 00000.004803/2022-57
● 00000.004818/2022-15
● 00000.005044/2022-40
● 00000.005228/2022-18
● 00000.005298/2022-68
● 00000.005306/2022-76

22. EDITAL INDEPENDÊNCIA 200 ANOS

Através da Deliberação Ad Referendum 97-E, de 12/09/2022, o Diretor-Presidente da Ancine aprovou, alegando urgência, o Termo de Cooperação com a Secretaria Nacional do Audiovisual e o lançamento da Chamada Pública SNAV/MTUR/FSA – Produção TV/VOD – Independência 200 anos – 2022, com recursos de R$ 30 milhões para obras audiovisuais sobre os 200 anos da independência brasileira. Esta deliberação foi ratificada pela Diretoria Colegiada três dias depois, em 15/09/2022, através da Deliberação de Diretoria Colegiada 1816. Apesar da alegada urgência, porém, um mês depois o edital permanece sem publicação, e o respectivo processo (01416.010065/2022-68) segue classificado como sigiloso. O que causa ainda mais estranhamento na publicação considerada “urgente” do edital é o fato de o então Secretário de Fomento à Cultura ter afirmado publicamente
que os recursos se destinariam a projetos de obras “pró-armas”, uma vez que “A arma de fogo foi fundamental pra que garantíssemos a nossa independência.” (sic) A se confirmar esta promessa, estaria caracterizado um claro direcionamento indevido da política audiovisual, e neste contexto a publicidade do referido edital e do respectivo processo se fazem ainda mais necessárias.

23. PARECERISTAS EXTERNOS FSA

Após anos de paralisia do Fundo Setorial do Audiovisual, em 2022 a Ancine voltou a lançar diversas chamadas públicas, totalizando o valor de R$ 650 milhões. A seleção dos projetos contemplados é feita por comissões mistas de servidores e pareceristas externos. Um dos aspectos que chama a atenção nos novos editais, no entanto, é que, de forma inédita, este ano a Ancine está convidando pareceristas para trabalhar gratuitamente, para um serviço que exige alto grau de profissionalismo, capacidade técnica e dedicação. Este trabalho gratuito se torna ainda mais estranho quando consideramos que o Decreto 8.299, que regulamenta o Fundo Setorial do Audiovisual (FSA), reserva 5% dos recursos arrecadados anualmente para as despesas operacionais de seus editais e chamadas públicas, como pagamento dos pareceristas externos (como sempre foi feito em todos os editais anteriores). Além disso, a Lei Orçamentária Anual de 2022 prevê R$ 12 milhões para despesas operacionais do FSA, e o Portal da Transparência, da Controladoria Geral da União, demonstra o valor de R$ 12.006.000,00 empenhado em 2022 para esta mesma finalidade. Ou seja, os valores para pagamento dos pareceristas externos existem, ou existiam e foram gastos, mas a falta de transparência da Ancine na execução dos recursos públicos impede que saibamos como os R$ 12 milhões reservados para despesas operacionais do FSA foram gastos, gerando um prejuízo aos profissionais pareceristas e à própria política audiovisual, uma vez que os editais deixam de ter o nível necessário de dedicação profissional técnica. Além disso, a Ancine não tem respondido os e-mail e ofícios de entidades de profissionais do audiovisual com questionamentos sobre o trabalho
voluntário que a agência pede.

 

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