A poucos dias de desincompatibilizar-se do governo paulista para disputar as eleições de outubro, o atual governador de São Paulo, João Doria, busca garantir o controle das principais instituições culturais para influir além de sua gestão. Isso inclui algumas das joias mais reluzentes da “coroa” paulista, caso do Museu do Ipiranga, reformado a um custo de R$ 211 milhões e que será gerido por uma nova fundação, já aprovada pelo Ministério Público Estadual (MPE).
Atualmente, a gestão do Projeto Novo Museu do Ipiranga é feita pela Fundação de Apoio à USP (FUSP), que tem outros setores para cuidar e atuou apenas para viabilizar a reforma nesses últimos três anos. Já a nova fundação está, neste momento, constituindo sua futura diretoria para um período de quatro anos de mandato. Aí está o ponto: o governador Doria indicou o nome de uma subordinada para ocupar a presidência do Museu do Ipiranga, a atual Secretária Executiva de Cultura e Economia Criativa do Estado, a advogada Claudia Pedrozo.
O problema com o nome de Claudia Pedrozo é que ela responde a dois processos na Justiça Federal por ações das quais teria participado quando integrou as equipes de seu atual chefe, Sérgio Sá Leitão, no Ministério da Cultura e na Agência Nacional de Cinema (Ancine). A decisão sobre o prosseguimento de um desses processos está a cargo do Superior Tribunal de Justiça (STJ) neste instante.
Claudia é braço-direito de Sérgio Sá Leitão, outro que (a exemplo dos secretários federais Mario Frias, André Porciuncula e Sergio Camargo) tem falado em sair candidato nas eleições de abril, mas quer assegurar influência quando já não tiver mais cargo público. Claudia Pedrozo foi secretária executiva e chefe de gabinete de Sá Leitão quando este foi titular do Ministério da Cultura de Michel Temer. Ela já tinha sido chefe de Gabinete de Sá Leitão quando ele chefiou a Secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro.Também foi diretora de Administração e Finanças da RioFilme na gestão de Leitão e depois presidente da empresa, indicada, evidentemente, pelo ex-chefe. Em 2019, ela chegou a ter os bens bloqueados pela Justiça devido ao processo da Ancine.
O Museu do Ipiranga passou por uma reforma que carreou o maior volume de incentivo da história da cultura brasileira, segundo declarou Antônio Lessa, coordenador de Museus e Relações Institucionais da Secretaria Estadual de Cultura e Economia Criativa. A expectativa é de que, após as obras, o novo museu receba até 900 mil visitantes em seu primeiro ano de funcionamento e cerca de 1 milhão de pessoas nos anos seguintes.
A carioca Claudia Pedrozo faz parte de uma espécie de força-tarefa que Sá Leitão usa para consolidar sua influência nos cargos que ocupa, e que se espraia também pelos organismos híbridos da administração pública, como as Organizações Sociais – o caso da Associação Paulista de Amigos da Arte (Apaa) é exemplar, toda a diretoria é composta por prepostos do atual Secretário de Cultura de São Paulo. A Apaa, que também é alvo de uma denúncia de improbidade administrativa na Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social, acaba de renovar o seu contrato de gestão para gerir R$ 200 milhões do orçamento da secretaria pelos próximos 5 anos.
A questão também é de qualificação para o cargo no Museu do Ipiranga. Antes de se tornar colaboradora do secretário, Claudia Pedrozo foi secretária municipal de Planejamento de Maricá (RJ) e secretária de Administração da Prefeitura de Nova Iguaçu (RJ). No caso da Apaa, a diretora também é uma colaboradora próxima, a ex-secretária de Cultura de Niterói, Danielle Nigromonte, trazida por Sá Leitão a São Paulo para a gestão de cultura.
O Museu Paulista foi inaugurado em setembro de 1895 como Museu de História Natural. O edifício foi projetado pelo engenheiro e arquiteto italiano Tommaso Bezzi (1844-1915) e construído entre 1885 e 1890 para marcar o lugar da proclamação da Independência, no dia 7 de setembro de 1822. Seus jardins foram encomendados ao belga Arsênio Puttemans. O museu foi incorporado à Universidade de São Paulo em 1963, especializando-se em história da cultura material brasileira e tornando-se um acervo de referência para a pesquisa sobre a sociedade brasileira, sobretudo nos séculos XIX e XX.
Seu edifício, tombado pelo patrimônio histórico municipal, estadual e federal, está situado dentro do complexo do Parque Independência, e é o museu público mais antigo de São Paulo e um dos mais antigos do país. Ele deverá ser reinaugurado no dia 7 de setembro, data do Bicentenário da Independência, e a obra é objeto de disputa entre os governos estadual e federal.