O bumba-meu-boi como conheci. Capa. Reprodução
O bumba-meu-boi como conheci. Capa. Reprodução

Há uma comunhão entre o alumbramento da infância e a capacidade de escrita em dona Zelinda Lima, algo que tornamos a perceber em “O bumba-meu-boi como conheci” [Fecomércio/MA-Sesc/MA, 2019, 120 p.], que ela lança hoje (8), às 19h, na Sala de Exposições do Condomínio Fecomércio (Av. dos Holandeses, Jardim Renascença II), dentro da programação da 14ª. Aldeia Sesc Guajajara de Artes.

Do encantamento de menina até a velhice – completa 93 anos em novembro – a paixão permaneceu a mesma. “Naquele momento mágico, envolvida na beleza do espetáculo”, escreve rememorando a primeira vez que viu um grupo de bumba-meu-boi dançando, “não me passou sequer pela cabeça, que estava me deparando com uma das mais importantes manifestações da cultura popular da minha terra e com a paixão da minha vida. Paixão de trabalho, paixão de estudo, paixão de vida”, registra no capítulo Uma palavra final.

Zelinda Lima, com o passar dos anos, acabaria se tornando uma das mais importantes folcloristas do Maranhão, por falar em paixão de vida, ao lado do esposo Carlos Lima (in memorian) – bastante lembrado ao longo deste novo livro. “O bumba-meu-boi como conheci” mescla história, memória e afeto. Dona Zelinda revela seu baú, compartilha-o conosco, numa prosa leve e fluida, despretensiosa e, por isso mesmo, bastante didática.

Ressalta aspectos importantes do bumba-meu-boi, fazendo aproximações e comparações. Entende a dinâmica da cultura popular, longe de purismos ou de confundir tradição com aquilo que não evolui. Comenta grupos, auto, sotaques, toadas, personagens, amos, donos, rixas, num delicioso passeio que vai dos tempos em que apresentações de grupos poderiam terminar em briga (e mortes) até certa institucionalização dos grupos, pagos para dançar em arraiais, organizados (“até demais”, chega a afirmar), com tempo exíguo, o que contribuiu, por exemplo, para que se torne cada vez mais rara a apresentação do auto. Dos bois de promessa aos bois para inglês ver, embora ela não utilize esta expressão.

Com caprichado projeto gráfico de Cláudio Lima, o material é fartamente ilustrado por fotos de Márcio Vasconcelos, Maria Quilana Viégas e do acervo pessoal – numa, por exemplo, se vê sua filha Deborah Baesse no batizado do Boi de Leonardo, em 1975; noutra, a própria dona Zelinda com o artesão Nhozinho, que tão bem retratou as rodas de bumba-meu-boi, peças que podem ser vistas no rico acervo que constitui o museu que leva seu nome, na Praia Grande.

Entre azulejaria, culinária e cultura popular, é inestimável a contribuição de dona Zelinda Lima para a cultura do Brasil, seja como gestora pública, seja como escritora – com este, são oito livros publicados. Nela, a paixão é a fogueira que mantém afinada sua memória, instrumento com que nos presenteia com uma prosa deliciosa.

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