Mário de Andrade, de quem foi amigo, às vezes o definia como gênio visionário, às vezes como louco.

O português Francisco de Castro tinha dinheiro e tinha uma obsessão – construir um tipo de condomínio na metrópole que o projetasse enquanto líder comunitário e também lhe garantisse o futuro financeiro.

Em pleno Ano Zero do Modernismo, 1922, ele começou a construir uma vila no coração de São Paulo que se tornaria um monumento ao kitsch, ao pastiche: a Vila Itororó, uma área 10 mil metros quadrados no centro da cidade. Um ecletismo que resvala na provocação.

A vila, se fechar os olhos e imaginar, se assemelha às utopias perdidas que ainda habitam certas cidades do mundo (como Cristiânia, em Copenhague, na Dinamarca, uma comunidade no centro da cidade que tem sua própria Constituição).

Francisco de Castro usou, talvez pioneiramente na arquitetura, o conceito de reciclagem. Mandou rebocar os restos do Teatro São José, que havia sido reconstruído ao lado do Viaduto do Chá (segundo nos informa o leitor Roberto Abrantes), e usou suas carrancas neoclássicas na ornamentação do seu palacete – que é o centro da vila.

Fez a primeira piscina pública da cidade, no centro de seu conjunto.

Francisco de Castro morreu e a vila iniciou um progressivo processo de deterioração, que atingiu seu ápice há dois anos.
Virou cortiço, os últimos moradores foram expulsos em 2013.

E agora o velho sonho de se devolver a Vila Itororó à cidade parece ter tomado forma nos desvãos de suas ruínas. Um plano de R$ 54 milhões está em marcha, e isso já é imensamente sabido. Há um centro cultural provisório no galpão da entrada, que está abrigando apresentações artísticas e debates.
É possível agendar visitas e percorrer o casario com um guia extremamente bem-informado.

Fomos num grupo de 13 ontem, a 8ª visita desde que tudo começou.
Havia dois franceses, dois fotógrafos das imediações, estudantes de história.
O francês quis saber se a água do riacho Itororó que ainda corre nos fundos da casa, em algumas cisternas cobertas por lajes, é potável.

Sim, ela é própria para o consumo humano, talvez seja usada para regar uma horta comunitária que o projeto prevê ali nos fundos.

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* Publicado originalmente em El Pájaro que Come Piedra

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3 COMENTÁRIOS

  1. Boa noite, só uma observação importante.
    A parte do texto onde diz que foram utilizados restos de ornamentos do antigo Teatro São José do final do século XIX, não está correto.
    Os ornamentos utilizados para a decoração do palacete de Francisco de Castro, foram retirados da demolição do extinto Teatro São José que havia sido reconstruído ao lado do viaduto do chá, e inaugurado em 1909.
    Foi demolido em 1923/24, após a Light and power company, para a construção do edifício Alexandre Mackenzie (Shopping Light).
    O Teatro São José que foi incendiado no final do século XIX, localizava-se na Praça João Mendes.

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