O que foi que aconteceu com a MPB? (parte 2)

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O leitor João Baptista Lago traz uma importantíssima colaboração à discussão lançada por este FAROFAFÁ sobre como o que conhecemos como música popular brasileira vem dilapidando seu próprio patrimônio (aparentemente sem perceber).

Trata-se de uma pesquisa da Forrester Research sobre hábitos de consumidores online no Brasil e no México. Involuntariamente (pelo menos de nossa parte), estabelece-se um forte diálogo entre os resultados do estudo e o texto “O que foi que aconteceu com a música popular brasileira? (parte 1)“, aqui publicado ontem.

Na caixa de comentários desse nosso texto, João Baptista chegou a conclusão contundente cotejando informações científicas de Forrester e elucubrações empírico-jornalísticas de FAROFAFÁ. Reproduzo o comentário do leitor (com grifos meus), porque ele sabe explicar melhor do que eu:

“O tamanho do avanço da Internet sobre a mídia televisiva no Brasil, segundo pesquisa fresquinha do Forrest Research: ‘Os brasileiros gastam aproximadamente 23,8 horas por semana na Internet, e assistem apenas 6,2 horas de TV’. Nesse ‘três vezes mais que a TV’ inclui-se o tempo dispendido no Youtube, ou seja: é por onde a MPB, atualmente, mais trafega. Então, o ECAD pretender restringir a audiência de videos do Youtube, significa um golpe duríssimo contra a MPB, por ser ali que é mais executada. Ali? Não apenas, porque boa parte desses videos é embevedada no Orkut e Facebook”.

Tentando avançar alguns milímetros à compreensão de João Baptista: a MPB, transfigurada na imagem espectral sem rosto chamada Ecad, ameaça ver nos consumidores de internet o “inimigo” (“o inimigo sou eu!!!/ o inimigo é você!!!”, berrriam os Titãs em 1988) a ser combatido, penalizado, punido, desmonetarizado.

Desde a gloriosa era dos festivais da TV Record (emissora hoje controlada pela Igreja Universal do Reino de Deus), a música brasileira ocupou lugar marginal na programação de nossas emissoras – quando muito como trilha de novela orquestrada monoliticamente há décadas por Mariozinho Rocha, ex-compositor, ex-integrante de um conjunto de MPB de protesto chamado Grupo Manifesto e ex-homem forte de gravadoras multinacionais.

A “nata” MPB ainda conserva migalhas milionárias do tipo ter uma música na abertura da novela de Aguinaldo Silva (qual mesmo é a abertura da novela atual) ou de Gilberto Braga. Fora isso,  tal elite foi alijada da grande vitrine televisiva cuja fortuna ajudou a construir, como descobriria em sangue a grande Elis Regina, ao perceber (ou não) por conta de quais interesses havia liderado uma passeata da TV Record contra a presença de guitarras elétricas na nossa música, em 1967.

[Pausa: Gilberto Braga é irmão de Rosa Maria Araújo, coautora do musical “Sassaricando”, ao lado do crítico musical Sérgio Cabral (pai). Segundo sabe de bastidores a elite cultural brasileira, o grupo do atual governador carioca, Sérgio Cabral (filho), e do atual presidente da Funarte, Antônio Grassi, trabalha para emplacar a irmã de Gilberto Braga como substituta da irmã de Chico Buarque na vaga de ministra da Cultura do Brasil. Não é de cultura (ou é?) que estamos falando. Fim da pausa.]

De costas para as câmeras, a candidata Dilma Rousseff abraça Chico Buarque, num dos atos inaugurais do segundo turno da campanha presidencial, no Teatro Casa Grande (RJ), entre personalidadess como Juca Ferreira, Fernando Morais, Antonio Grassi, Alcione e Sérgio Cabral (pai) - Foto Ivone Perez - 18/10/10

Ultimamente, a MPB “chique” andou até voltando de mansinho à programação da toda-poderosa Globo, nas madrugadas de Serginho Groisman ou de programas que homenageiam a nata MPB valendo-se da coalhada das novas gerações – enquanto isso, Record e a maioria das demais emissoras “abertas” transmitem cultos religiosos.

Sem espaço nas TVs, para onde migrou a música brasileira e mundial, da índia baiana de cabelos negros Gal Costa à índia paraense de cabelos louros Gaby Amarantos? Para a internet. Para o YouTube. Para o Orkut. Para o Facebook.

Gananciosas (e falimentares), as garras musicais-industriais afiam-se em direção a nós e descobrem a pólvora da guerra: “O inimigo!!!!!!!!!! É você!!!! Cortem-lhe a cabeça!!!!!!!”. Querem cobrar de nós para que ouçamos, amemos e difundamos – aqui de casa, sem receber um centavo por esse trabalho de fãs-formiguinhas em prol de suas-nossas cigarras favoritas – a delícia que eles criam.

O Ecad se engalfinha há anos com a Globo e com as demais emissoras, “abertas” ou “fechadas”, para receber dinheiro (estipulado pelo próprio escritório, sem regulação nem mediação) pela execução pública do patrimônimo musical brasileiro em suas telas. Está corretíssimo em exigir receber.

O conglomerado Globo-etc. reage, bate pé, vai à Justiça, deposita em juízo. Está corretíssimo em exigir não ser cobrado à extorsão.

Jamais Ecad, Globo etc. envolveram o consumidor nessa disputa entre ricos e poderosos.

[Pausa sem pausa: a Globo é sócia do Ecad, na figura de sua gravadora de discos, Som Livre, lançadora de sucessos comerciais (e muitas vezes artísticos) como trilhas de novelas, CDs gospel, Michel Teló, Maria Gadú, Aviões do Forró etc.]

Jamais Globo, Ecad, Silvio Santos, Sony Music, editora Abril etc. nos cobraram (em dinheiro) mais que o preço energia elétrica pela música que ouvimos “livre” e “gratuitamente” em nossas TVs, rádios, fitas cassete, CDs graváveis e encartes dominicais de jornalões.

Foi assim, até que a internet tomasse conta do mundo.

Hollywood. O conglomerado multinacionais de gravadoras. Sindicatos (sempre ultrapolitizados) de TV e rádio. Birôs de compositores, editores e gravadores distribuídas pelos Ecads do Brasil e do planeta. Jornalões e revistonas. Juntos e separados, todos passaram volta e meia a se confundir e ensaiar cobrar de você e de mim o que antes não cobravam, nem cogitavam cobrar.

Sempre pareceram bondosos e satisfeitos em nos trazer diversão, entretenimento e cultura “gratuitas”. Agora parece que não mais.

Passaram, nessa confusão, a perseguir e a destilar ódio contra quem sempre consumiu cândida e vorazmente sua produção industrial. Jogaram no lixo, com agressividade, a manjadíssima máxima de que “o freguês tem sempre razão”.

Eles nos veem como inimigos (frequentemente nós também os vemos assim). Nós nos afastamos cada vez mais deles. Eles não entendem (ou fingem não entender) por que nos afastamos. Eles se ressentem de nosso afastamento, e erram grotescamente por cima de grotescos erros passados.

Não é preciso ser nenhum bidu para entender o que João Baptista Lago, leitor-consumidor deste site gratuito e não-remunerado FAROFAFÁ, nos está apontando: mesmo que a eles pareça que seus bolsos estão se esvaziando por nossa causa, o tiro que estão dando é no próprio pé. A tentativa de restrição do Ecad (sinônimo de elite da música brasileira, fora um e outro gringos intrometidos na miúda ali pelo meio) à livre circulação de seus produtos e artes entre nós, “reles” “mortais”, é um duríssimo golpe do Ecad (da MPB) contra a MPB (o Ecad).

O Megaupload aprisionado e criminalizado por Barack Obama é o monolito de Stanley Kubrick atirado contra a cabeça do país que jogou o monolito para o céu.

O Ecad injetando câncer no MinC por dentro se pensa espertíssimo, mas é apenas um agente cancerígeno bombardeando as próprias células.

Chico Buarque, que um dia foi alijado (e/ou se auto-alijou) da vitrine televisiva cuja fortuna ajudou a construir com “A Banda”, “Sabiá” e “Roda Viva” e “Apesar de Você”, hoje se finge de macaquinho cego-e-surdo-e-mudo-e-bom-moço-velho, enquanto opera nos bastidores para nos alijar do pequeno império que construiu à revelia do grande império televisivo – e cuja fortuna ajudamos a levantar com nossa idolatria.

FAROFAFÁ ama a música brasileira apaixonadamente. Torce e tenta colaborar para que o despertar da elite da música e da cultura brasileira – da ministra Ana de Hollanda a seu irmão Chico Buarque, da Universal Music à Biscoito Fino/Banco Icatu, de Fernanda Montenegro e Beatriz Segall a Cláudia Leitte e Fernanda Torres, da Rede Globo à “Folha de São Paulo” e ao “Estado de São Paulo”, dos herdeiros de Tom Jobim a Michel Teló, de Paulinho da Viola a Sharon Acioly, de Boni e Boninho a José Celso Martinez Corrêa.

FAROFAFÁ faz aqui, PARATODOS,  o convite-apelo público: nós amamos e precisamos de vocês, desistam de se suicidar, por favor. O tempo não para, mas ainda é tempo.

 

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