Baby e Pepeu, reunidos, confirmam a permanência de “Masculino e Feminino”

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Baby do Brasil e Pepeu Gomes

Embora tenham trabalhado em parceria desde a consolidação dos Novos Baianos até o rompimento do casamento em 1988, Baby do Brasil Pepeu Gomes nunca assinaram um álbum inteiro em dupla (houve um Baby & Pepeu em 1983, mas se tratava de uma coletânea de sucessos lançados nos discos individuais de ambos). Baby e Pepeu ao Vivo no Noites Cariocas é, portanto, um documento histórico e inédito, em circulação no ano em que os dois ex-Novos Baianos completam 70 anos de idade. A reaproximação começou em 2015, quando Pepeu participou de um show de Baby com o filho de ambos, Pedro Baby, guitarrista como o pai.

Sem fugir ao formato-padrão desse tipo de reunião musical, a dupla parte do princípio da revolucionária banda baiana (e fluminense, no caso de Baby, nascida em Niterói): ela canta “A Menina Dança”, de Moraes Moreira e Galvão, lançada em Acabou Chorare (1972), e ambos dividem “Samba da Minha Terra”, de Dorival Caymmi, gravado em Novos Baianos F.C. (1973). A coleção de hits originais da então Baby Consuelo passa de mansinho pela hard-MPB dos primeiros anos de carreira solo, em “Tudo Blue” (1978) e “Menino do Rio” (1979), e se ancora nos clássicos ultrapop dos anos 1980, com “Telúrica” (1981), “Seus Olhos” (1982) e “Sem Pecado e sem Juízo” (1985). A década de 1980 rende a totalidade das canções originalmente gravadas por Pepeu, “Todo Amor ao Jimi” (1980), “Eu Também Quero Beijar” (1981), “Fazendo Música, Jogando Bola” e “Planeta Vênus” (1982), “Masculino e Feminino” e “Deusa do Amor” (1983) e “Mil e Uma Noites de Amor” (1985).

A fábrica de sucessos pop foi vasta, e assim ficam de fora rock-sambas que marcaram época, como “Toda Donzela” e a canábica “O Mal É o Que Sai da Boca do Homem” (1980), “Emília – A Boneca-Gente” (1982) e “Barrados na Disneylândia”, compostas pela dupla, “Um Auê com Você” (1981), “Cósmica” e “Um Raio Laser” (1982), só de Baby, e o grito histórico “Todo Dia Era Dia de Índio” (de Jorge Ben), lançado pela cantora em estado de graça, em 1981.

Moraes Moreira, parceiro morto em 2020, é lembrado em “A Menina Dança” e “Eu Também Quero Beijar” (parceria com Pepeu e Fausto Nilo), mas não em “Lá Vem o Brasil Descendo a Ladeira” (1979), hit de força também gravado por Baby, ou “A Lua e o Mar”, hit do álbum Moraes & Pepeu (1990). Alguns dos hits não regravados devem aparecer na turnê de retomada da dupla, 140 Graus, que começou em julho com um show no Teatro Castro Alves, em Salvador, o local onde Baby e Pepeu se encontraram pela primeira vez, em 1969, no show de despedida pré-exílio de Caetano Veloso Gilberto Gil. Até o momento, a retomada da parceria não parece ter resultado em novas composições.

O acordo firmado entre os dois não ultrapassa a linha da parceria histórica, mas a evangelização de Baby, incorporada rotineiramente desde os anos 1990, se esgueira pelas beiradas, como na louvação a Deus que abre o álbum, em “Masculino e Feminino”, ou no “Menino do Rio” de Caetano, que já há algum tempo ostenta não um dragão, mas um “Jesus forever tatuado no braço”. É em “Masculino e Feminino”, a propósito, que sobrevive o fogo libertário dos Novos Baianos e de Baby & Pepeu, quando ela apimenta a letra original que compôs para Pepeu gravar e acrescenta ao antológico “ser um homem feminino/ não fere o meu lado masculino/ se Deus é menina e menino/ sou masculino e feminino” o complemento/contraponto “ser uma mulher masculina/ não fere o meu lado feminino/ porque pra parir seis meninos/ eu tive que ser muito masculino e feminino”.

Era uma vez os anos 1980, quando humanos fluidos, não-binários, trans, questionadores de gêneros etc. ainda não andavam ao ar livre, mas os cabelos multicoloridos de Baby Consuelo e Pepeu Gomes despertavam a ira da família, da tradição e da propriedade da Disney. “Não aceito preconceito”, segue cantando Baby em “Telúrica”, mesmo que a realidade não seja mais 100% assim. A permanência de “Masculino e Feminino” não é fortuita, e é apenas um dos inúmeros motivos que justificam a presença dos dois artistas no panteão da MPB e do pop de ontem, hoje e sempre.

"Ao Vivo no Noites Cariocas" (2022), de Baby do Brasil e Pepeu Gomes

Ao Vivo no Noites CariocasDe Baby do Brasil e Pepeu Gomes. Musickeria.

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