Um ano sem carnaval, sem circo, sem grandes festivais, com fonte de renda escassa para o que alimenta nosso orgulho de ser brasileiro: a cultura. Falamos, sim, da paralisação total do setor devido à pandemia, mas a ferida vem de antes. Tivemos uma sequência de descontinuidades e perseguições, marcada com a extinção do Ministério da Cultura e a
criminalização da Lei Rouanet – e toda a consequência institucional disso para o setor.
A Lei Aldir Blanc trouxe um respiro aos recentes desmontes às políticas e investimentos na cultura do Brasil, mas a crise sanitária segue ainda sem horizonte de solução, e a nossa cultura precisa de valorização permanente. Temos agora, a partir da experiência da aplicação dos R$ 3 bilhões da lei emergencial, a oportunidade de instituir uma política integrada. Isso pode ser feito estabelecendo repasses federais anuais aos entes e inaugurando um novo ciclo de fomento e estímulo à produção cultural brasileira, apesar de todos os pesares.
Seja pela falta de projetos da gestão da cultura feita pelo Ministério do Turismo, seja pelo slogan do presidente, “mais Brasil, menos Brasília”, são os estados e municípios e seus fundos locais que têm a capacidade de operar e capilarizar o investimento para que chegue até os rincões deste país diverso e profundo, até os mestres da cultura popular que assistem
desprezados a tudo isso.
Segundo dados do Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes Estaduais de Cultura divulgados nesta semana, estão em curso hoje mais de 42 mil projetos culturais financiados pelo recurso federal descentralizado aos Fundos Estaduais. São mais de 20 mil pessoas que receberam o auxílio emergencial da cultura (R$ 600 por cinco meses) operados por todos os
estados e o Distrito Federal.
Esse Brasil pulsa. De norte a sul, são festivais, oficinas formativas, números circenses, reconhecimento de trajetórias, livros, discos, filmes… financiados pela Aldir Blanc e trazendo ao conjunto da sociedade o resultado desse investimento emergencial tão importante. Muitos projetos, inclusive, propondo novos formatos em um exercício experimental que contribui
muito para o futuro das nossas práticas.
Os estados e os mais de 4.000 municípios que operaram o recurso são a prova da capacidade e da energia que os gestores e o setor cultural têm para dar conta desse recado. Ainda segundo o boletim, os estados empenharam boa parte dos recursos recebidos, mesmo com os prazos curtos, as regulamentações confusas e os atrasos no repasse.
A Lei Aldir Blanc foi uma construção coletiva, liderada pelo Congresso Nacional e com a participação ativa da sociedade civil e dos Fóruns de Gestores e entidades municipalistas. Sem dúvidas, uma das experiências mais ricas de participação popular, construção coletiva e exercício democrático que vimos nos últimos anos.
O objetivo foi socorrer o setor totalmente paralisado e afetado pelo início da pandemia, em 2020. Segundo o Observatório do Itaú Cultural, 412 mil empregos foram gerados pela lei, ajudando a recuperar quase a metade dos empregos perdidos na crise. E as necessidades seguem, um ano depois, com o agravamento da pandemia.
Estamos na reta final desse processo, ainda falta o adiamento do prazo para valer da execução e da prestação de contas, além de uma destinação cultural para o recurso ainda não aplicado – que chega a R$ 223,7 milhões nos Fundos Estaduais, fora os Municipais. O Projeto de Lei 795/2021, aprovado no Senado, chega à Câmara renovando as esperanças para o uso cultural da verba ainda nas contas.
Com isso, o setor está com um olho nos desafios da execução desse festival de sons, ritmos e Brasil e outro olho no legado desse processo. Fica como herança todo o esforço de estruturação jurídica e política das secretarias de cultura país afora. Aqui no Espírito Santo, dobramos o número de Leis Municipais da cultura em três meses. Fica o cadastramento organizado dos agentes, coletivos e empresas da cultura. Fica o registro qualitativo do
nosso ecossistema e a força econômica do setor cultural.
É patrimônio resultado dessa construção a confiança na república e em seus processos participativos. A esperança na sabedoria ancestral do nosso povo que tanto nos projeta para o mundo como nação rica e plural. Não podemos perder a oportunidade agora de costurar um futuro para cultura brasileira, que garanta seu léxico e que amplifique seu múltiplo.
Fabricio Noronha é secretário da Cultura do Espírito Santo e vice-presidente do Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes Estaduais.
Parabéns Fabrício, seu empenho como gestor de cultura do nosso Estado é impecável, admirável.
Foi um ano muito difícil para todos e apesar de tudo conseguimos nos manter confiantes e ativos, acreditando que o exercício da cultura é e foi fundamental neste momento. Muito obrigada
Grande Fabrício. Tenho orgulho desse Secretário.
Muito bacana o seu artigo. Excelente trabalho a frente da Secretaria de Estado da Cultura (Secult-ES).