Um dia após ter seu mandato como diretor da Ancine expirado, Tiago Mafra dos Santos foi nomeado como Secretário de Regulação da mesma agência por Alex Braga, que era seu superior hierárquico na diretoria. A portaria nº 165-E repôs o ex-diretor, nomeado pelo governo de Jair Bolsonaro, em um cargo estratégico na agência, o que mostra que seu grupo político não tem a menor intenção de largar o osso, para usar uma expressão popular.
A sucessão para o cargo na diretoria deixado vago por Tiago Mafra dos Santos é objeto de uma controvérsia nesse momento. O nome escolhido pela cúpula do Ministério da Cultura (MinC), o da gestora do Ministério da Educação, Patricia Barcelos, é questionado pelo setor audiovisual, que esperava uma pessoa ligada à área de produção ou artística do cinema brasileiro (ou ao menos uma consulta prévia). A própria secretária do Audiovisual do MinC, Joelma Gonzaga, preferia o nome da produtora Vânia Lima para ocupar o posto, mas foi atropelada pelos interesses de outro grupo do ministério.
A situação na Ancine transcorre entre esses dois cabos de força: o da diretoria entronizada por Bolsonaro e apoiada pelo Centrão, liderada por Alex Braga, e as pretensões divididas do novo governo, representado pelo secretário executivo do MinC, Márcio Tavares dos Santos. O nome de Patrícia veio do núcleo gaúcho do ministério, que é influenciado pela deputada Maria do Rosário (atualmente no segundo turno da eleição para a prefeitura de Porto Alegre). Enquanto as divergências correm soltas, o establishment bolsonarista passa a boiada tranquilamente na tarefa de ocupação da agência – só nos últimos dias, Alex Braga nomeou três novos servidores para a Secretaria de Regulação da Ancine, agora ocupada pelo seu aliado Tiago Mafra.
O distanciamento entre a atual gestão da Ancine e os interesses do Ministério da Cultura parecem evidentes. Na quinta-feira passada, 3, a abertura da 26ª Edição do Festival do Rio, no Cine Odeon, contou com as presenças da ministra, Margareth Menezes, da secretária do Audiovisual do Ministério da Cultura (MinC), Joelma Gonzaga; e do secretário de Cultura do Rio de Janeiro, Marcelo Calero. Não havia representante da Ancine, que tem sede no Rio. Até 13 de outubro serão exibidos mais de 250 filmes, entre produções brasileiras e internacionais, em 22 salas da capital fluminense.
Em seu discurso, Margareth falou da importância da política audiovisual para sua gestão. “Nós estamos colhendo no audiovisual brasileiro uma expansão imensa. Essa realidade se constata quando temos 12 mil novas produtoras registradas na Ancine”, discursou. “Essa palavra descentralização foi muito impactante para mim, porque no nosso caso não é descentralizar, é nacionalizar, é ampliar, porque temos um entendimento que aqui é uma grande indústria do audiovisual, e o cinema é a nossa ponta de lança dessa virada da economia criativa das indústrias culturais, mas também precisamos dar oportunidade para que esse acontecimento ganhe força e qualidade em todas as regiões do Brasil. Porque há uma nova geração que se encontrou dentro desse setor. Então é com essa visão que nós estamos trabalhando e queremos contar, sim, com todos”. O problema é que a atual política audiovisual do País é uma das mais centralizadoras de todos os tempos.