Monólogo "Eu, Romeu", com Marcos Camelo e direção de Cecília Viegas - Foto Silvia Patrícia

O ator Marcos Camelo tem a ginga de um carioca suburbano e a malemolência dos que já se acostumaram a bater com a cara nas portas da vida. Não seria diferente para encarnar um personagem tão emblemático como Romeu, da clássica peça de William Shakespeare. Ele é negro, tem baixa estatura e o mundo das aparências o afasta de qualquer ousadia de tentar o papel do amante de Julieta. Mas o traiçoeiro destino o empurrou para a trágica história do escritor inglês algumas vezes, e isso já justificaria ouvir sua versão desses episódios. Eis o mote de Eu, Romeu, peça em cartaz em curtíssima temporada no Teatro de Arena Eugênio Kusnet, espaço histórico do teatro brasileiro aberto nos anos 1950, em São Paulo.

Camelo não nasceu Capuleto, tampouco Montéquio. Em vez de Verona, seu bairro de nascença foi mesmo Rocha Miranda, na zona norte carioca. Nesse local, a luta de famílias vizinhas tem outros tons e uma violência mais rude, por assim dizer. Mas ele decidiu que queria ser ator para poder viajar para onde sua imaginação quisesse, inclusive nos templos sagrados do teatro. Só que nessas localidades até a origem faz diferença, como em Romeu e Julieta, de Shakespeare. É nesse paralelo entre as duas histórias, a escrita entre 1591 e 1595 e a sua própria, que Marcos Camelo constrói seu monólogo.

Eu, Romeu é um texto autoral, cujo mérito é deixar claro que os destinos podem e devem ser questionados. A teimosia da trajetória do ator, que insiste em interpretar Romeu, apesar dos vários conselhos para que desistisse da ideia, se revela ao mesmo tempo engraçado e trágico. Com uma performance corporal simples, mas plenamente eficiente, Camelo prende o espectador dentro da narrativa, abrindo espaço para que outros paralelos entre Shakespeare e nossas vidas surjam e se entrelacem, por mais distantes que imaginemos à primeira vista.

No palco, o Romeu do subúrbio carioca reivindica uma dramaticidade singela, como pode-se ver o amor entre Romeu e Julieta. A clássica cena do balcão, por exemplo, é construída a partir de uma reconfiguração criativa do que é estar abaixo e acima numa relação a dois. Ajuda o fato de Marcelo Camelo ser também um palhaço, cuja arte é a todo momento requisitada para dar vida ao seu personagem. Ele e a bailarina-acrobata Cecília Viegas, que assina a direção artística e o argumento da peça, formam a Adorável Companhia, com sede em Guapimirim, na Baixada Fluminense.

Eu, Romeu. Com a Adorável Companhia. No Teatro de Arena Eugênio Kusnet, sextas-feiras e sábados (20 horas) e domingos (19), até dia 29 de janeiro. Ingressos a 40 reais.
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