O resmungo em “Velha Roupa Colorida”

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Cena de "Velha Roupa Colorida" (2021), de Gabriel Alvim

Nas plataformas digitais deste sexta-feira, 24, Velha Roupa Colorida, o primeiro longa-metragem de Gabriel Alvim, atende aos princípios do gênero conhecido como “mumblecore”: é produção de baixíssimo custo, usa cenários naturais e diálogos improvisados, deixa o enredo em escanteio, passa ao largo das normas e truques de Hollywood (e da Rede Globo, no nosso caso). Inicia-se com uma gravação de vídeo em celular de cinco amigos (quatro homens e uma mulher) durante uma trilha que leva a uma cachoeira. Alguns anos depois, Rached (Dida Andrade) retorna ao Brasil de uma temporada em Nova York e procura se readaptar e reconectar os antigos companheiros de juventude e aventura.

Eles tomaram rumos variados: Carol (Louise d’Tuani) faz teatro, Jucá (Adriano Toloza) se acomoda tocando os negócios duvidosos do pai, Digão (Kauê Telloli) luta contra a depressão, Caco (Andradina Azevedo) divide-se entre esposa grávida, filho pequeno, drogas e sexo, Raul (Fabio Penna) não chega a constituir um personagem com características notáveis. A técnica dos diálogos improvisados causa estranheza positiva por romper com as encenações sempre muito bem ensaiadas e coreografadas do cinema e da TV, mas faz também com que os personagens (ou talvez, antes, os atores) soem titubeantes, sem algo relevante a dizer. O roteiro e a trama giram em círculos em vez de adotar o modelo tradicional de começo, meio e fim. O filme se faz, então, nas ausências, nos interstícios, nas omissões, nos vazios – no que não é dito nem feito, enfim.

O protagonista (se é que o termo se ajusta) Rached dá sentido extra ao termo “mumble” (resmungo em inglês), em falas balbuciantes, por vezes difíceis de compreender. Um frescor emerge da trilha sonora, feita de canções cedidas por bandas e cantores underground: Agoristas, Rios Voadores, Fernando Freitas, Sara Não Tem Nome, Carne Doce e Caio Falcão e O Bando. Ainda sobre a música, o filme remete apenas remotamente ao título, tomado de canção homônima de Belchior em 1976, mas não explicitado nem na trama nem na trilha. O núcleo de Velha Roupa Colorida tem mantido esse apego nostálgico pela canção brasileira (que, grosso modo, corresponderia aos roteiros começo-meio-fim da dramaturgia tradicional): A Bruta Flor do Querer (2013), assinado em dupla por Andradina Azevedo e Dida Andrade, utilizava verso de “O Quereres” (1984), de Caetano Veloso; o filme que Gabriel Alvin finaliza para suceder o atual é Solidão, Que Nada, filhote do rock homônimo de Cazuza em 1987.

No conjunto, o filme estaciona em um meio termo desconfortável, um pé no passado belchioriano, outro nas novas técnicas, táticas e truques que o ato eletrônico Carne Doce sintetiza com louvor. “O que há algum tempo era jovem, novo, hoje é antigo/ e precisamos todos rejuvenescer”, diria Belchior (que o disse ainda envolto pelos mitos da juventude), em promessa que os personagens de vidas desperdiçadas de Velha Roupa Colorida não conseguem cumprir.

Velha Roupa ColoridaDe Gabriel Alvim. Brasil, 2021, 74 min. Nas plataformas digitais.

 

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