“Você vai permitir que qualquer zé mané, com dez autores absolutamente insignificantes, tenha o mesmo peso de 40 mil autores importantes.” A reação de Roberto Corrêa de Mello, presidente da Abramus, traz à baila o conflito de classes sociais que emerge do imbroglio envolvendo o Ecad, os compositores brasileiros e o PLS 129, projeto de lei do Senado recém-convertido na lei nº 12.853.
A Abramus, sociedade arrecadadora que surgiu pequenininha há 31 anos e hoje governa praticamente a metade dos direitos autorais do país, se demonstra assim contrária à introdução de alguns princípios de isonomia determinada no corpo da nova lei. “Como vamos ter o mesmo peso de uma sociedade que tenha dez manés que não fazem nada, absolutamente oportunistas?”, pergunta o advogado-presidente, reproduzindo em sua fala alguns dos pilares da manutenção do status quo em sistema capitalista.
Embora do corpo de associados da Abramus constem (além de autores em pessoa física) nomes multinacionais como Warner, Sony, EMI e Universal, o presidente afirma que o critério de proporcionalidade não funciona no interior da associação: “Aqui todo mundo é igual, a Warner ou o zé da silva que toca tamborim têm o mesmo peso”. Ele nega afirmação da deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ), de que o Brasil possui 300 mil autores musicais, dos quais apenas 70 mil estão incorporados ao sistema Ecad. Mas não oferece um número alternativo àquele.
Roberto afirma não ter entendido a mudança de posição do xará Roberto Carlos, um notório alinhado ao sistema Ecad, que em 3 de julho passado se colocou contra o que o escritório pregava ao participar em pessoa da sessão de aprovação do PLS 129 no Senado. Estaria o “Rei” ali defendendo interesses da Rede Globo, da qual é funcionário histórico, contra os do Ecad? Corrêa de Mello prefere não dar resposta peremptória a esse ponto.
Abordamos também idiossincrasias dentro do sistema Ecad. Menciono que procurei, ao mesmo tempo, as duas maiores associações arrecadadoras, a Abramus e a UBC (União Brasileira de Compositores), que tem entre seus diretores os autores Fernando Brant, Ronaldo Bastos, Abel Silva e Sandra de Sá. Procurei a Abramus por intermédio de Danilo Caymmi, que estabeleceu a ponte com Corrêa de Mello e Walter Franco. Da UBC, entrei em contato com a diretora (e advogada) Marisa Gandelman, que aceitou conceder entrevista, mas recuou quando leu em FAROFAFÁ o texto “A passeata da MPB” e não aceitou sequer fazer a ponte com outros diretores da associação.
O parágrafo acima fica como testemunho das diferenças dentro do sistema Ecad, que sigo sem compreender, bem como a um convite público para que a UBC e outras sociedades se abram para FAROFAFÁ e para o convívio de nós que, aqui fora, compomos uma sociedade apaixonada por música.
Da parte da Abramus, publicamos abaixo o diálogo amplo, complexo e importante com Roberto Corrêa de Mello. Foi ele quem iniciou a conversa, antes mesmo que eu pudesse fazer alguma pergunta.
Roberto Corrêa de Mello: Eu fui um dos integrantes do CNDA, o Conselho Nacional de Direito Autoral, em sua última versão. Foi uma nomeação do José Sarney (1985-1989), o ministro da Cultura era Celso Furtado. Nós tínhamos um colegiado grande, éramos 19 integrantes. Os assuntos eram encaminhados por pauta, nomeava-se um relator, o relator relatava e os outros conselheiros votavam.
Pedro Alexandre Sanches: Como se deu sua chegada ao universo do direito autoral?
RCM: Por acaso. Faz 37 anos. Um amigo advogado me indicou um cliente da área de direito autoral. Eu não entendia nada disso. O cliente era Vinicius de Moraes. Fui amigo do Vinicius, e dele veio um monte de gente, vieram todos. Eu tinha muitas ações contra a TV Globo, por direito de inclusão, que existia no papel, mas não existia de fato. Comecei a entrar com ações em nome de Paulinho da Viola, Toquinho, Vinicius, Chico Buarque, um monte de gente. Por quê? Porque as novelas tinham trilhas sonoras deles e não pagavam o chamado direito de inclusão, que hoje se chama, equivocadamente, direito de sincronização. Bobagem, sincronizar é sincronizar.
PAS: Sincronizar imagem com som?
RCM: Exatamente, e não é isso. Nós estamos falando de incluir música em determinados momentos, na abertura, no encerramento, no background, na trilha sonora.
PAS: Você defendia esses artistas pelo direito de receber da Globo por incluir músicas nas novelas?
RCM: Sim, e eu fui ganhando as ações. Em função de eu ir ganhando, acabou sendo feito um contrato entre os editores, do qual eu não participei, e a TV Globo, visando normatizar esse direito de sincronização. A meu ver não foi dos melhores acordos, acho que os autores perderam muito dinheiro nessa história. Mas, de qualquer forma, recebem hoje o que denominam de direito de sincronização, fora a execução pública, que é do Ecad. Um dia o (advogado e compositor) José Carlos Costa Netto, meu amigo, me ligou e disse que ia ser criada uma associação nova, e eles precisavam de alguém para orientar. Vim, conversei com (o saxofonista) Demétrio Santos Lima, que está hoje muito doente.
PAS: Foi ele que fundou a Abramus?
RCM: Foi ele que fundou, há 31 anos. Ajudei, e fomos organizando. Foi duro. No começo não tinha nada. Nada. Não tinha sistema, ferramenta, gente, estrutura. Era uma coisinha. No final do mês, a gente tirava uma grana do bolso e pagava o custo. Há 12 anos, me propuseram um crescimento da Abramus como uma grande central de documentação. Todo mundo se sentia muito desconfortável entendendo que não havia um grande banco de dados. Pediram que a gente fizesse e organizasse esse banco de dados. Isso custou tempo, dinheiro, paciência e equipe. Demoramos, sem exagero, uns cinco anos.
PAS: Quando você diz que pediram, quem pediu? Os compositores?
RCM: Os artistas, os compositores, os produtores fonográficos, os editores. O Brasil é o único país que consegue distribuir direito autoral e direito conexo por uma só entidade, que é o Ecad. Só o Brasil faz isso. Eles babam lá fora, e não conseguem fazer, porque lá os interesses são muito conflitantes entre o autoral e o conexo (que se refere a direitos devidos a intérpretes, músicos acompanhantes, empresas gravadoras e outros não-autores). Fui contratando gente, teve momentos muito difíceis. Tivemos que fazer com que todos os titulares de direitos se acostumassem a documentar, a explicar o que tinham, qual era o papel do autor, do editor, do versionista, do intérprete e do produtor fonográfico. Isso foi se dando ao longo de muito tempo, até que hoje, com uma equipe de umas 30 pessoas, a gente documenta obra, fonograma e cue- sheet, que são a trilha musical do audiovisual, que vai pra televisão ou pro cinema. No Brasil temos uma base de 1,6 milhão de fonogramas, obras são 4,4 milhões e obras audiovisuais, 103 mil. De fonograma não tinha nada, você acredita?, seria muito mais se tivesse se documentado muito antes.
Mas quando Fernando Collor assume a presidência, ele resolve enxugar os ministérios, e foi acabando com tudo, CNDA, Ancine, tudo. Acabou. Como ele não podia acabar legalmente, porque isso implica alteração de constituição, o que ele fez? Ele desativou. Qual foi o sintoma que aconteceu a partir daí? Essa vida do direito autoral passou a andar pelas próprias pernas.
PAS: E gostou disso, não gostou?
RCM: Não, o CNDA não funcionava. Era brincadeira.
PAS: Era? Você era integrante do conselho…
RCM: O último presidente foi (o cineasta) Gustavo Dahl, o cuidado que ele tinha era perguntar quem entendia de música, de literatura, de dramaturgia, de crônica, e colocar cada um no setor correto.
PAS: Hoje se clama pela volta de uma estrutura como aquela. Você está dizendo que não vai funcionar?
RCM: Um conselho dos artistas, dos titulares, eu acho excelente.
PAS: Não está definido ainda como será.
RCM: Está. Está. Está. Os usuários vão estar lá (o Ecad chama “usuários” as instituições que difundem música publicamente, com finalidade de lucro, e portanto devem pagar direitos autorais ao sistema). Na verdade, todos os problemas são um só, que se chama TV Globo. Essa é a questão. Eles não pagam, está no STJ (Superior Tribunal de Justiça), a votação está empatada, dois a dois. A história é a seguinte: em 1981, o CNDA aprovou uma resolução, número 26, que estipulava os percentuais de direito autoral para televisão. Tudo era normativo. O percentual era de 3,5%, 2,5% para música e 1% para os autores do próprio audiovisual, que nunca se organizaram.
PAS: Ou seja, 3,5% do faturamento das emissoras deveria ser destinado ao direito autoral?
RCM: Sim, assim foi. Não é fácil conseguir isso junto às emissoras de televisão. Eles são muito poderosos, nós somos uma pulguinha, somos os bobos dessa história. E nós viemos, ao longo do tempo, estabelecendo como é que chegaríamos aos nossos 2,5%. Quem mandava era a Abert (Associacão Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão), que tinha um presidente que nos falou: “Não dá para vocês conseguirem isso assim. Tem que ir devagar. Vamos fazer uma gradação”. Ótimo, isso demorou décadas, mas foi. A Abert se desconfigurou um pouco, porque os interesses passaram a divergir. Havia outros interesses que não Globo, surgiram outras entidades. Um dia, no final do governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), a Globo, que estava muito mal das pernas, nos procurou e nos pediu um acordo.
PAS: Procurou quem, o Ecad?
RCM: Sim, é sempre o colegiado. “Nós não temos dinheiro para pagar os 2,5%. A gente propõe fazer uma progressão.” Ué, tudo bem. Vamos fazer devagar. “Daqui a cinco anos a gente revê, tá bom?” Tá bom. No governo Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) eles acabaram obtendo um empréstimo importante do BNDES, de R$ 2,8 bilhões (a Globo nega esse “boato”, lançado por Roberto Jefferson na folha, durante a chamada crise do mensalão), e ficaram bem. Passaram-se cinco anos, vamos negociar de novo. A Globo falou: “Não, não temos interesse em negociar, queremos pagar a mesma coisa”.
PAS: Quanto pagam atualmente, em percentual?
RCM: É uma merreca, R$ 5,4 milhões, 0,7%.
PAS: Ou seja, não houve progressão e vocês continuam brigando pelos 2,5%? Eles não depositam os 2,5% em juízo?
RCM: Não, depositam 0,7%! Só isso, mais nada. A TV Record disse: “Eu vou pagar 2,5%. Vocês dão desconto pela pontualidade?”. Uai, é óbvio, quanto?, 20%?, está feito. Nos pagam até hoje 2,5%, com 20% de desconto pela pontualidade. A Bandeirantes resolveu brigar. Ganhamos no STJ: eles pagam 2,5% do faturamento. Quem está em litígio são SBT e Globo. Mas o SBT deposita 1,7%. O problema é a Globo. Houve meses de conversa, e a Globo não, não, não. Acabou o contrato com o Ecad, e agora? Já venceu há uns dez anos, e o caso se arrasta na Justiça. Entramos com a ação no dia X, a Globo entrou com ação no mesmo dia X. Ganhamos a ação em primeira instância: 2,5%. Foi para o tribunal, nós vimos que o jogo era pesado. Não se brinca com esses caras, a parada é muito dura. Contratamos o ministro Francisco Rezek pra nos defender no tribunal.
PAS: O Ecad contratou? Quando você fala “nós”, é o Ecad?
RCM: O sistema, isso. Houve o apelo, um julgamento teratológico, dantesco. O relator deu voto e se aposentou. Rezek espuma quando fala dessa coisa. No STJ, caiu com um ministro que tem uma clara aversão pelo direito autoral e pelo sistema brasileiro, Luiz Felipe Salomão, voz contrária. A Globo comemora, bota manchete em jornal. Nós não temos acesso a jornal nenhum, nunca. Ninguém fala. Foi para o segundo ministro, João Otávio de Noronha, que percebeu que tinha algo errado. Pediu vista. Viu que o caso era delicado, ficou dois anos estudando, voltou e deu um voto que é um brinco, falando de constitucionalidade, legalidade, isonomia. Por que tratar a Globo diferentemente dos outros canais? O que eles têm de diferente? É porque ganham mais? Quem ganha mais paga mais imposto, paga mais empregado, paga mais artista, paga mais direito autoral, paga mais tudo. A terceira ministra que votou, Maria Isabel Gallotti, não deu um voto, deu uma aula de direito. E eles fizeram o possível pro Cade julgar a aberração lá deles um dia antes do julgamento da Globo. Isso tem endereço certo, aqui não tem ABTA (Associação Brasileira de Televisão por Assinatura): é a Globo. É a Globo.
A ministra disse que durante o tempo que ficou com os autos na mão, quatro ou cinco meses, vários advogados da Globo foram procurá-la, e ela fez a mesma pergunta para todos: “Há alguma outra forma de remunerar a música que não seja o do Ecad?”. “Claro que há, as music libraries dos Estados Unidos. Lá, por dois dólares no máximo você baixa uma música. Esse é o valor”. Ela disse que tinha preferido ficar quieta quando ouvia isso, e respondia ali publicamente: “É verdade, dois dólares por música, peer to peer. Se você multiplicar pela audiência da TV Globo e fizer uma mínima audiência de 45 milhões de pessoas por música, isso equivale a mais ou menos US$ 90 milhões por música. Creio que o Ecad está muito abaixo desse valor que os senhores estão dizendo que vale a pena consumar”. O ministro Raul Araújo Filho, quarto a votar, não votou conosco. Falou mal, dizendo que é um valor absurdo, que a Globo, coitada, não pode arcar com esse custo, que hoje chegaria a R$ 17 milhões por mês, mais ou menos. Recebemos R$ 5,4 milhões, que é o que eles depositam em juízo e a gente levanta pra remunerar os artistas. O quinto ministro viu que a coisa não é fácil, pediu vista, não quis votar. São cinco votos, está dois a dois. Ele falou o seguinte: “Eu não vou votar sozinho. Não quero essa responsabilidade toda”. Viu o vespeiro em que estava mexendo. Fez o seguinte: existe outro caso muito parecido, que é de uma televisão por assinatura do Paraná. Nessa, a votação está um a um. O que a turma votar nesse caso da TV por assinatura é o que ele votará no caso da Globo. E aí nós vamos ganhar, porque na outra turma, quatro vão votar com a gente. A partir daí, a emissora, antevendo o que ia acontecer, nos falou: “Nós vamos acabar com vocês. Não vai sobrar pedra sobre pedra”.João Otávio Noronha
PAS: Quem falou isso?
RCM: A Globo.
PAS: E isso vai acontecer?
RCM: Vai.
PAS: E agora?
RCM: Não sei (gargalha). Não sei.
PAS: Aí vem a pergunta que eu vim fazer: onde o PLS 129 entra nisso tudo?
RCM: Olha, nós já estudamos todas as possibilidades de execução do PLS 129. Não tem como executar.
PAS: Por quê?
RCM: Por vários motivos. Primeiro: quem vai fixar o preço do uso da obra? Cada associação? Como? Nós não temos sistema de copyright no Brasil. Copyright é direito de cópia, é sistema norte-americano. Nós não temos, nem teremos, porque o direito do autor, na Constituição, está no artigo 5º, incisos 27 e 28. É direito pessoal. Isso significa o quê? Quando uma obra do Nando Reis, que está aqui, e da Marisa Monte, que está na UBC, é executada, o preço é o mesmo. Como é que você vai dicotomizar quem vale mais? A Marisa ou o Nando? Peraí, não dá. Todo o repertório brasileiro é compartimentado, porque os autores são muitos. “Garota de Ipanema”, por exemplo, tem dois autores: Tom Jobim e Vinicius de Moraes. Tem duas editoras: a VN Produções, que fiz pro Vina, e a Jobim Music. Quantos fonogramas de “Garota de Ipanema” existem? Em torno de uns 2.000, com Fank Sinatra, Elis Regina., João Gilberto, o próprio Tom. E quem participa? O Luizão no baixo, o Cesar Camargo Mariano no piano, um monte de gente. Como você vai estabelecer valores diferentes?
O que o sistema fez ao longo dos anos? O sistema passou a decidir junto. Isso é bom? É bom, porque cria um padrão só, é justo, isonômico. A gente briga? Porra, se a gente briga. Dizem que sou gentil demais, generoso demais. Não é isso, é que não adianta enfiar goela abaixo. Tem hora que você tem que negociar, exaustivamente. Tem hora também que não dá, mas nós somos sempre pela negociação, por evitar o atrito. Evitar o atrito. Se você for muito inquisitivo, assertivo, ninguém vai lhe pagar nada, ainda mais direito autoral. Pessoal não paga nem tributo neste país. Você cria uma aversão pública, “olha aí, lá vêm os caras cobrando uma fortuna de novo”. Calma, pô, negocia, tenta buscar apoio. Não conseguimos a Record? Não conseguimos a Bandeirantes por decisão judicial? É paciência e tempo. E às vezes tem que ser mais duro. O Rock in Rio estamos discutindo até agora. Esse PLS foi gestado para beneficiar os usuários.
PAS: Eu queria uma visão sua dos bastidores dele.
RCM: Existem alguns grupos interessados, no meu artigo falo disso. Existem os usuários que não querem pagar. Quanto mais desmoralizar, acabar com o sistema, criar o caos, deixar virar uma bagunça total, melhor será.
PAS: Você generaliza essa afirmação, ou está falando especificamente da Globo?
RCM: Globo. Globo. Globo. Globo, que tem 78% da verba de broadcasting no Brasil. Globo. Depois você tem um grupo do governo, muito interessado em estatizar o direito autoral.
PAS: Qual seria esse grupo?
RCM: Você identifica os movimentos que se fazem, que eles chamam de supervisão, e no fundo não são supervisão. Vão entrando. Você viu que eles querem o acesso público ao banco de dados das obras, fonogramas e cue-sheets? Por quê? Isso tem dono.
PAS: “Eles” são os artistas que foram a Brasília?
RCM: Será que foram os artistas?
PAS: Os autores estão pedindo acesso a seus dados no sistema Ecad, não é isso?
RCM: Eles têm. Todos têm. Tudo, tudo.
PAS: O que há de novo na lei então?
RCM: Eles querem tornar o banco de dados público.
PAS: Ou seja, seria público inclusive para mim, que não sou autor musical?
RCM: Isso.
PAS: Eu gostaria de poder ver.
RCM: Ah, e aí você pode alterar, né? Ver é bom, não pode é mexer. Hoje o sistema é mais rígido, mais fácil de controlar. Mas teve uma época que era tudo no improviso. Até hoje a gente corrige muita coisa.
PAS: Estatizar é voltar a ter um CNDA como existia antes do Collor?
RCM: Não. É tomar. É criar um IBDA, um Instituto Brasileiro de Direito Autoral, com 240 cargos públicos, pagando gestão, trazendo o sistema, expropriando o banco de dados, estabelecendo e fixando preços e condições. Esse é o objetivo.
PAS: E por que estaria errado, sendo a música um valor público?
RCM: É direito privado, não é público.
PAS: É público na medida em que todos ouvimos, consumimos, pagamos.
RCM: É privado porque é dele (aponta para o compositor Walter Franco, vice-presidente da Abramus, que participa da entrevista).
PAS: Sim, mas é as duas coisas. Somos o Walter e eu que fazemos a música, ele criando e eu ouvindo.
RCM: Você é consumidor. Existe o direito do consumidor, e existe o direito do autor. Por isso nós temos o Código do Consumidor e a Lei de Direito Autoral. Toda sociedade antropocêntrica, como é a brasileira, cria mecanismos de direito. Você tem mecanismo para direito autoral, propriedade intelectual, registros públicos.
PAS: A Globo, por exemplo, é uma estrutura que privatizou um espaço público e trata como se fosse propriedade dela?
RCM: A Globo é uma concessão pública, mas trata como se fosse dela. Mas isso não é, isso é função pública. Direito autoral é pessoal. Se o Walter Franco ou Tom Zé, que também é amigo aqui da gente, disserem “não quero que toque a minha obra no programa do Ratinho“, não vai tocar. Não pode. O Chico Buarque, para quem advoguei um bom tempo, não autorizava nada para uso comercial. Nada. Eu tive que entrar com algumas ações. “Mas vão pagar…” “Eu não quero, e ponto final.” Quem vai decidir a finalidade com que a obra vai ser usada é o artista. Onde eu acho que o sistema falhou ao longo do tempo? Essa é uma boa pergunta. Eu acho que o sistema muitas vezes foi intransigente, arrogante.
PAS: Por exemplo?
RCM: Conversa, vai estabelecendo a proporcionalidade. Este é um grande mérito dos negociadores: estabelecer quanto vai ser, como pode negociar. É claro que o cara quer baixar o pagamento do Rock in Rio. Querem pagar R$ 5 milhões, nós queremos receber R$ 7 milhões. Vamos ter que chegar a um meio termo.
PAS: Quando entrevistei a deputada Jandira Feghali (PCdoB), ela afirmou que existem 300 mil autores no Brasil e apenas 70 mil recebem do sistema.
RCM: Não é verdade. Eu não sei de onde ela tirou isso. Tudo eu levava pra Jandira, ela me ajudou tanto quando Collor quis acabar com direito autoral em rádio e televisão. Aloysio Nunes (PSDB), então… Você sabe como a gente aprovou a lei 9.610? Demoramos 13 anos de trabalho. Fizemos, apresentamos para José Genoino (PT), que cansou de brigar porque viu que não ia passar. Até que levamos pro Aloysio Nunes, que era deputado federal por São Paulo. Ele falou: “Bom o projeto, tem lógica”. E apresentou. Por sorte nossa, que a sorte ajuda, FHC nomeou Aloysio ministro da Justiça. “Aloysio, será que você consegue convencer o presidente a sancionar isso?” “Vamos trabalhar.” E conseguimos. Eu fui um dos redatores da lei, conseguimos o sancionamento em 1998. E assim foi.
PAS: O Ecad está resistindo muito, mas é a história andando para frente, não? Esta era minha primeira pergunta: que avanços e retrocessos o PLS 129 vai trazer?
RCM: A história é dinâmica. O que acho é que não vamos conseguir trabalhar. Não vai ter gestão com 15% (Roberto se refere à taxa que o sistema Ecad cobra do bolo dos direitos autorais para administrá-los, atualmente em 24,5%). Aqui é um continente, não é um paisinho, não é Portugal, a Espanha. Dá para baixar até uns 20%.
PAS: A lei diz que vai baixar até 15%.
RCM: É, como? Você sabe quantos usuários de música existem no Brasil? São 530 mil. Como você vai arrecadar de 530 mil sem custos? Tem que ter máquina, gente. Não é na rua, não se arrecada nada na rua. É tudo por fatura direta do Ecad. Não tem fiscal, isso faz 20 anos que acabou isso de “fiscal do Ecad”. É tudo eletrônico, para evitar o quê? Para evitar corrupção, favorecimento, dirigismo de planilha, de obra, de escuta. A máquina tem que andar. Na minha opinião o Brasil é até caro. Com 20% nós administaríamos isso, o sistema inteiro se administraria. Eles querem que se dê publicidade para o banco de dados. Não vejo muito problema, mas você não sabe qual é o objetivo disso. Se for para que o Estado faça essa gestão, sou completamente contrário. Isso é dos artistas, eles têm o dever de cuidar da sua casa.
PAS: No seu texto você diz que eles descuidaram.
RCM: Descuidaram.
PAS: A ida a Brasília não parece um sinal de que estão tentando acordar?
RCM: Será? Eu tenho cá minhas dúvidas. A gente faz reuniões pelo Brasil. Fizemos uma aqui, sabe quantos artistas vieram? Três.
PAS: A grande maioria dos artistas não participa. Mas as coisas estão colocadas hoje como se Walter Franco e outros autores que pertencem às diretorias das sociedades estivessem de um lado, e se formou um grupo do outro lado com Roberto Carlos, Caetano Veloso e Chico Buarque.
Walter Franco: Não é verdade (FAROFAFÁ publicará, a seguir, a parte em que Walter Franco se pronuncia).
PAS: Para além da Globo, como os portais de internet estariam atuando nesse caso?
RCM: O Google tem um contrato com a gente, com o sistema. O contrato é muito duro. Tem cláusula de confidencialidade, então a gente não pode comentar. Acontece que chega um momento da insuportabilidade, porque você v ai pagar uma titica para os autores. O cara que tem 18 mil acessos equivale a R$ 1. O cara com 1,8 milhão de acessos tem R$ 100. Pô, peraí, tem limite, esses caras ganham uma nota. Então dá aí os 2,5% de direito autoral, caramba.
PAS: Mas eles estão atuando efetivamente nos bastidores do PLS 129? Como você pode ilustrar isso?
RCM: A gente vê pela movimentação toda, que é no sentido de fragilizar, desconstituir o grupo dos autores, fazer com que os autores acabem discutindo entre eles, e favorecer o usuário. E aí, esse mote é legal de pegar: o que é que o povo tem com isso? O povo tem direito a ter acesso a cultura, ponto. O que os autores têm com isso? Os autores têm direito de ser remunerados pelas suas obras. Quem tem que pagar? Quem ganha dinheiro com isso. Ninguém está falando que é para o filho da senhorinha que foi trabalhar e deixou o filho fazendo download. Não é disso que estamos falando. Estamos falando que o pessoal que ganha dinheiro e faz disso um negócio, como Google, YouTube, Globo, quem quer que seja, tem que pagar o mesmo de direito autoral.
PAS: Mas existe algo de concreto no corpo da lei que favoreça esses grupos?
RCM: Tem. Por exemplo, a coisa de criar um órgão que estabelece preços e fixa condições. Não pode, não pode. Isso não é público. Isso é privado.
PAS: O projeto de lei diz que o Ecad conserva essa prerrogativa.
RCM: Desde que cada sociedade fixe um preço diferente. Entendeu? Isso tudo vai convergir pra que uma sociedadezinha de nada coloque um valorzinho qualquer e que faça com que os usuários paguem o valor que ela quer. E o que vai acontecer com os artistas? Eles vão querer vir para quem os remunere melhor. Estou fazendo um exercício hipotético, do direito sem nexo. E como você vai aquilatar quem vale mais? É Jobim ou Vinicius?
PAS: E quanto ao ponto de cada associação ter um voto unitário na assembleia do Ecad? Está errado?
RCM: É claro que está errado. Aí você permite que qualquer zé mané com dez autores absolutamente insignificantes tenha o mesmo peso de 40 mil autores importantes.
PAS: Argumenta-se que a desigualdade só favorece a quem já é poderoso.
RCM: Ué, se assim fosse não haveria nem Abramus nem UBC. Foi como eu convenci Caetano a vir para a Abramus, há 12 anos? Estávamos eu, (a advogada) Vanisa Santiago, (a empresária) Paula Lavigne e Caetano. Caetano falou: “Sou muito amigo do Fernando Brant. Por que devo sair da UBC e ir para a Abramus?”. Paula falou assim (eleva o tom): “Eu acho que devia ter uma sociedade só!”. Isso não é democrático.
PAS: Consta que Chico Buarque propôs isso numa das reuniões entre os artistas.
RCM: Chico falou, falou.
PAS: Como é em outros países, segundo ele. Sempre se fala que “é só no Brasil…”.
RCM: Não é! A França tem 14 sociedades. Eles pensam que é assim, mas não é. É tão intrincado que estou há anos lidando com isso e às vezes fico desentendido. Nós temos aqui quase 50% do repertório do Brasil. Como vamos ter o mesmo peso de uma sociedade que tenha dez manés que não fãzem nada, absolutamente oportunistas?
PAS: Mas você me desculpe, vou usar o seu termo, a Abramus já foi mané um dia.
RCM: Lógico! Nós éramos um voto. Passamos a três, a cinco… Esse é o princípio, os partidos políticos têm proporcionalidade. A proporcionalidade é que dinamiza. Vocês viram uma peça chamada A Alma Imoral? Vale a pena, diz o seguinte: enquanto o consciente é moral, a alma, graças a Deus, é imoral. Graças a essa imoralidade da alma é que você evolui. Senão você cria um imobilismo absoluto. Possibilita, assim, que grupos oportunistas cheguem, tomem conta das sociedades e comecem a impor os preços que melhor convierem. A quem? A quem? Se nós, as sete sociedades gestoras e duas pequenininhas administradas, brigamos feito cão e gato, o que acho saudável, como você vai fazer com 50, 60 associações, todo mundo com o mesmo peso? Vira uma bagunça. Como o Congresso Nacional viveria assim? Não existe, tudo na vida obedece a um princípio de proporcionalidade. Isso é da essência da democracia.
PAS: Eu nunca tinha visto Roberto Carlos numa posição que não parecesse imediatamente alinhada com as do Ecad. O que significou a presença dele em Brasília?
RCM: Até hoje não entendi. Mas um dia nós vamos entender. Ele é da Socinpro. Roberto é um cara tão alinhado, defende tanto os direitos dele. Não sei.
WF: O próprio senador que fez a leitura fez o seguinte comentário: “Se Roberto Carlos vier, o projeto está aprovado”.
PAS: É o poder de quem tem um milhão de amigos…
RCM: Muito mais, uns cem milhões! Um senador disse: “Sou completamente contrário ao projeto, mas se Roberto me ligar e pedir…”. Vivemos uma monarquia.
PAS: É outro critério de proporcionalidade, porque ele vende muitos discos, tem muitos fãs e carreia muitos votos.
RCM: Lógico. É isso.
PAS: Roberto poderia estar meio inadvertido, sem entender o que estava fazendo lá? É pouco provável, e além do mais ele é funcionário da Globo.
WF: (Mudando o assunto.) Explique a ele como funciona a questão da hereditariedade dos direitos autorais.
RCM: Existem convenções internacionais a que o Brasil atende. Para o direito autoral são três convenções: Berna, de direito autoral, Genebra, de direito autoral, e Roma, de direito conexo. Essas convenções são fruto de conversas na ONU, onde os países se fazem representar, apresentam suas posições políticas e jurídicas. debatem e depois cada país resolve se vai ratificar as convenções ou não. Na primeira lei autoral brasileira, de 1973, o prazo de proteção era diferente, de 50 anos, inarredáveis 50 anos, sendo a vida dos filhos, a primeira geração, dentro dos 50 anos, e a vida dos netos até esgotar os 50 anos. O Brasil foi ratificando várias construções. Quando foi alterado na ONU, na renovação da Convenção de Berna, que estabeleceu prazo de 70 anos, ou o Brasil entrava ou o Brasil sumia. O sistema é mundial, e se o Brasil não seguir o sistema ele desaparece lá fora. Então o Brasil acolheu, homologou, ratificou e adotou como regime interno o mesmo da Convenção de Berna, que são os 70 anos de morte do autor.
PAS: Mickey Mouse já passou disso.
RCM: Mas os Estados Unidos não têm direito autoral. Lá é copyright. Nós não temos copyright. Esse é o grande equívoco desses caras (imagino que se refira ao grupo de Ronaldo Lemos, que atua na Fundação Getúlio Vargas e também junto ao Creative Commons). Eles querem trazer um sistema que, graças a Deus (bate na mesa), nunca vai entrar aqui. Aqui não se protege a obra. Aqui se protegem os titulares.
PAS: O que lhe faz ter convicção de que isso nunca vai mudar?
RCM: Ah, não muda. Teria que alterar a essência da Constituição, o artigo dos direitos humanos. São direitos individuais, que é o sistema europeu.
PAS: A Abramus também é um conglomerado de produtoras, editoras, gravadoras…
RCM: Que têm um voto cada uma.
PAS: …Mas a Abramus não acaba sendo uma multinacional, onde estão Warner Chappel, Universal, Sony…?
RCM: Não. Deve haver dois ou quatro titulares internacionais e 39 nacionais.
PAS: Elas não são poderosas dentro da estrutura?
RCM: Como assim? Eles participam da gestão, como qualquer outro, a Deck, a Biscoito Fino, a Som Livre.
PAS: Aqui é bom não haver proporcionalidade?
RCM: Aqui eles quiseram proporcionalidade, e eu falei: “Não, aqui todo mundo é igual”.
PAS: Por que não poderia ser assim no Ecad também?
RCM: Ué, se fizer assim você faculta o oportunismo. Como é isto aqui? Vamos dizer Caetano Velos, ele ganha xis, e a Warner ganha xis. Eles têm que ter votos diferenciados dos demais? Claro que não, porque é voto interno. Senão aí você alija todo mundo da participação. Já fui compelido algumas vezes a adotar desproporcionalidade, muitas vezes, mas aqui não, aqui todo mundo é igual, a Warner ou o zé da silva que toca tamborim têm o mesmo peso.
PAS: Isso me faz achar que seria bom o mesmo ser adotado no Ecad.
RCM: Acontece que isso é pra gerir uma associação que não estabelece preço. Aqui não se estabelece preço. Quem estabelece preço é a assembleia geral do Ecad.
PAS: Que é composta por vocês, presidentes das associações…
RCM: Sim. Procure reparar que o preço, quando é fixado, é fruto de muitos debates até chegar num resultado que pode não agradar a todos. Eu sempre procuro o preço mais baixo. O problema é que você não pode criar estruturas oportunistas. Pega um partido qualquer, o PV. Todo mundo tem um voto no PV. Mas quando vai pro Congresso, se obedece à proporcionalidade partidária. Senão não há regime, você não consegue conviver.
PAS: Seja como for, o debate vai ser aberto, e todo mundo vai ter que conversar.
RCM: Eu acho que essa lei não vai vingar. Ela não tem estrutura jurídica.
PAS: Mas Dilma Rousseff vai sancionar (a entrevista aconteceu antes da sanção, neste 14 de agosto)?
RCM: Uai, deixa sancionar. Vai pro Supremo Tribunal Federal.
PAS: Vocês já estão providenciando isso?
RCM: Não. Vamos esperar. Só depois que ela sancione.
PAS: Eu gostaria muito de entender qual porcentagem dos direitos autorais são escoados para fora.
RCM: 75% ficam no Brasil. Os estrangeiros representados por nós são 25%.
PAS: Mas não é isso que quero dizer. Muitos compositores são editados aqui por Warner Chappell, EMI Publishing… Nós somos um sistema multinacional, não?
RCM: Não, isso não existe aqui. Aqui é Brasil, não pode. O que o Brasil recebe do mundo é muito pouco. A gente trabalha pra cobrar. Isso sim a gente tem que atacar: quem não paga, os inadimplentes, os malandros, os que fraudam repertório, os que provam informações.
PAS: Eu queria falar sobre a CPI do Ecad. Você foi um dos indiciados.
RCM: Eu vou lhe pedir um favor, para não entrar nisso. Vou te dizer por quê: porque acho que não vai sair indiciamento nenhum. Mas se a gente falar é capaz de provocar.
PAS: Para mim é muito constrangedor vir até aqui e não poder tocar nesse assunto com você. Meu papel jornalístico é tocar.
RCM: É, eu sei, mas você sabe por que foi pedido o meu indiciamento?
PAS: Na realidade, foram sugeridos os indiciamentos de todos os presidentes das principais associações e de dirigentes do Ecad.
RCM: Sabe por quê? Porque em 2004 houve um déficit de caixa, e se pegou uma verba do direito retido e prescrito, que não tinha mais titulares, de uns R$ 6,8 milhões, e nós cobrimos o déficit com esses direitos que não tinham mais dono. Passou o prazo prescricional, o certo é voltar pro sistema.
PAS: Ou seja, foi feito algo irregular?
RCM: Aquilo que não tem dono, em tese, serve aos próprios autores, que foi o que a gente fez. Volta, senão o sistema quebra. O sistema tem que andar. Então nós pegamos aquilo que não tinha mais dono e cobrimos o déficit operacional. Eu acho que nós não deveríamos ter feito isso. Eu não estava na assembleia. Propuseram meu indiciamento por ser presidente da Abramus, mas eu não estava na assembleia. Eu acho que a gente deveria ter suportado o déficit, mas não é fácil. É de ano pra ano. Se nós formos cobrar hoje o que tem na rua, são uns R$ 2,3 bilhões. Só a Globo deve R$ 1,57 bilhão.
PAS: Qual é essa conta?
RCM: Os 2,5%.
PAS: Algum dia o Ecad vai receber isso?
RCM: Ah, eu acho que sim. Eu acho que vamos. Você sabe qual foi o faturamento da Globo no ano passado? R$ 3 bilhões. Viu quanto foi o lucro deles? 17% desses R$ 3 bilhões, quanto dá? A GlNos nos deve R$ 1,57 bilhão.
PAS: Esse valor está em jogo em episódios como o da CPI e o do PLS 129?
RCM: Está.
PAS: Em que a CPI mexe com isso?
RCM: Porque foi um teatro.
PAS: Promovido pela Globo?
RCM: Globo. Globo.
PAS: Então não são grupos políticos, é um grupo empresarial?
RCM: Globo. Globo.
PAS: Você afirma isso livremente, sem medo de errar?
RCM: Ao que tudo indica, não é? É o que tudo indica: que há um interesse daqueles que não têm interesse em pagar direito autoral. E aí é mais fácil desmoralizar o sistema.
PAS: O Ecad emitiu nota oficial dizendo que a lei só favorece os “usuários” . Quando fala em “usuários”, entendo que usuário é todo mundo. Eu sou usuário de música. O Ecad está querendo falar da Globo, do Google, mas simbolicamente eu sinto como se estivesse falando de mim.
RCM: Sim, é verdade. Confunde. Usuário, nessa linguagem, é quem paga, porque ganha dinheiro com o uso público de música.
PAS: O Ecad e a Globo são inimigos de fato? A Globo não ganha dinheiro com o sistema autoral também?
RCM: A Globo tem duas empresas, a Sigem, de edições musicais, que está na UBC, e a Som Livre, que é uma gravadora (e pertence aos quadros da Abramus).
PAS: A Sigem edita as obras da Som Livre?
RCM: Isso.
PAS: Ou seja, nesses aspectos a Globo também é Ecad.
RCM: Se você fizer um jogo, né?, a proporção entre o que paga e o que recebe…
PAS: Em alguma medida a Globo canibaliza a Som Livre, ao não pagar o que seria para ela mesma?
RCM: É isso aí. Sim.
PAS: É difícil, não? A Globo está entranhada em tudo que diga respeito à sociedade brasileira. É difícil falar em turma do bem e turma do mal: a Globo ao mesmo tempo é o bem, o mal, o mais ou menos, o péssimo…
RCM: Teve um presidente da Som Livre que disse: “Eu estou impedido de qualquer comentário. Eu aqui sou editora, gravadora e usuário. Não vou falar nada“.
PAS: Eu sou visto como um jornalista mais identificado com o lado anti-Ecad, digamos assim.
RCM: Eu sei disso.
PAS: Procurei ao mesmo tempo vocês e a UBC. Fui recebido pela UBC com muita hostilidade e por vocês com muita simpatia.
RCM: É mesmo? Obrigado.
PAS: Gostaria de entender que diferença é essa?
RCM: Nós somos do bem! (?)
WF: Não é direito envolver as pessoas no seu psicológico, nas suas fobias.
PAS: Não sei se fiz por merecer, mas a UBC me parece muito mais defensiva do que vocês neste momento.
RCM: Eles têm uma forma diferente de encarar. Nós somos da paz. Hoje nós estamos na frente, mas é empatado, eu diria que é muito igual. Temos R$ 1,5 milhão a mais só, é nada, desprezível.
PAS: Os artistas que estiveram em Brasília tratoraram o Congresso Nacional?
RCM: Eles não sabiam. Venderam bem o peixe para eles.
PAS: “Venderam” é um plural indefinido…
RCM: O discurso do senador Humberto Costa (PT) foi altamente convincente. Teve gente que estava do nosso lado e bateu palma, disse: “Puxa, adorei isso” . É político no palanque, os caras são profissionais. Como se chama aquilo que querem fazer, controle social da mídia? Que controle social é esse?
PAS: Aí é assunto complicado, porque sou jornalista e sou favorável…
RCM: Você é a favor do controle social? Ele não pode ser a favor!
PAS: Melhor não entrarmos nisso, senão ficamos até amanhã.
RCM: Não, vamos embora.
Vc tem que falar com quem manda mesmo na coisa toda: o Sr. José Antônio Perdomo Corrêa.
A UBC do sr. Perdomo, até o momento, parece arredia e hostil a qualquer possibilidade, Flora… O que, por si, já é meio eloquente, né?
sobre o ECAD eo ABRAMUS, quero dizer pouco e com objetivo.
Os comentarios de FAROFÁ são provas pra mim que estou tentando
me associar,que há,sim,uma barreira para muitos compsitores…
E que a globo deveria se chamar não só de globo mas de globo-lobo…
Recado mandado, Leandro!