O rock dos anos 80, o documentário de Pedro Bial sobre Mautner, lobbies variados e uma edição infeliz do Big Brother Brasil fazem “plim-plim” na tela da Globo.   

 

Os Titãs cantam “Polícia”, “Porrada” e “Bichos Escrotos” com fúria adolescente, para uma plateia de dez gatos-pingados que ainda não decoraram as letras de Cabeça Dinossauro. Não estamos, não, no Aeroanta dos anos 1980, antes de os Titãs terem se transformado numa das mais importantes bandas locais de rock. Estamos, sim, no palco comercial mais cobiçado do Brasil, o do Big Brother Brasil, versão 2013.

Ao vivo e em cores televisivas inspiradas em desenho infantil ou em festa rave dos anos 1990, Sérgio Britto (um dos não muitos Titãs remanescentes) celebrou o ineditismo daquele encontro na carreira da banda. Tratava-se do lançamento, em pleno horário (digamos) nobre da Globo, do álbum Cabeça Dinossauro ao Vivo 2012, uma homenagem nostalgicamente deliciosa ao aniversário de, er, 26 anos do clássico álbum rebelde antissistema de 1986. E tome críticas ásperas e justas à “Igreja”, à “Família”, ao “homem primata/ capitalismo selvagem”.

Tudo ali parecia meio fora de ordem, e a apatia do público “seleto” diante dos rocks de protesto da banda paulista só não soava mais constrangedora que a cena de poucos dias antes, quando Leo Jaime revivia pop-rocks de três décadas atrás como “As Sete Vampiras” e “Bambolê”. Era uma legítima prova de resistência disfarçar os bocejos, para os gatos-pingados que se sabiam exibidos ao vivo para todo o Brasil. Escamoteamentos à parte, a molecada “brother” não demonstra, definitivamente, empatia com o rock brasileiro dos 1980.

BBB, como todo mundo sabe, é uma poderosa máquina de lobby mercadológico – homens primata, capitalismo selvagem. Nesta modorrenta edição, o apresentador Pedro Bial tem se esmerado especialmente nas artes do lobbismo esfregado em nossas fuças. Noutro dia, recomendava loquazmente o filme de um “brother” seu, desconhecido para todos nós que não fazemos parte do lobby – mais um que a criançada teve de assistir dissimulando sonecas.

Antes, foi mais reto e direto ao vender repetidas vezes o peixe do documentário Jorge Mautner, o Filho do Holocausto – é o lado, er, intelectual de Bial afrontando a ignorância funkeira do elenco que a própria Globo seleciona anualmente com mãos de ferro. Um cronômetro foi providenciado no jardim da “casa”, apenas para que a trilha sonora pudesse incluir os versos esganiçados “o relógio quebrou/ e o ponteiro parou/ em cima da meia-noite, em cima do meio-dia/ tanto faz porque depois de um vem dois e vem três e vem quatro/ eu fico olhando o rato saindo do buraco do meu quarto”, do tropicalista sempre “maldito” Mautner. Um dos diretores do documentário se chama Pedro Bial. Lobbies à parte, nem Mautner nem os Titãs se converteram, ainda, nos hits desta calorenta e chuvosa temporada de verão. Em 2013, o lobby de Michel Teló ainda é mais eficaz.

Desde a primeira edição do Big Brother Brasil, o tema de abertura pertence à voz de Paulo Ricardo, ex-(e-futuro-)RPM, outro frequentador musical habituê da “casa”. Neste ano, além de Titãs e Leo Jaime, o redivivo Barão Vermelho também passou por ali. Nesses casos, a máquina de lobby parece servir à geração musical a que pertencem Bial e o diretor do programa, Boninho – justamente essa dos roqueiros oitentistas que a criançada que “mora” na “casa” ignora.

Não há moral nessa história, mas a imagem total que se compõe é melancólica, algo bem próximo à de um BBB da Depressão. A fórmula infeliz de reunir no mesmo espaço candidatos novatos e outros, er, “veteranos” condiz totalmente com a imagem de almas penadas de roqueiros rebeldes cuspidores de ira que viraram senhores conservadores de direita na maturidade – de Lobão ao Ultraje a Rigor, ainda há campo de sobra para Boninho explorar nesse setor.

Dentro e fora das festas-show, o BBB fantasmagórico vai vagando entre os feitos de novatos alegrinhos e de dois tipos de “veteranos”: os que fingem que ser “brother” pelo resto da vida é alguma espécie de paraíso (Anamara, Yuri, o recém-eliminado Eliéser) e os que arrastam corrente pela “casa”, nitidamente deprimidos (Natália e Fani, essa última em evidente e preocupante crise de abstinência de medicamentos). Nos dias de paredão, calouros e veteranos se unem em “históricas” cenas de choradeira, desesperadas como se a Terceira Guerra Mundial tivesse acabado de começar.

Não é fácil envelhecer no rock, nem na tela da TV Globo – nem na, er, “vida real”. Desde que começou, o BBB Ghostbuster, número 13, tem desfilado tédio, soluço e cansaço “adultescente” diante dos igualmente fatigados espectadores que somos nós.

 

(Texto publicado originalmente no blog Ultrapop, do Yahoo! Brasil.)

 

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1 COMENTÁRIO

  1. Jamais assisti a um único episódio (?)/capítulo(?)/minuto de BBB ao longo desses 13 anos, o que muito me envaidece e faz lembrar um samba de Luiz Ayrão que ludibriou a censura por volta de 1977. Ocorre que sua bem talhada “Rebeldia conservadora” (PAS. Bravo! 186) acerca de documentário do apresentador, assim como o preciso comentário do leitor Gilson Ribeiro acerca deste, também me fizeram lembrar o sutil sarcasmo transbordante em um conto de Lima Barreto, escrito há cerca de cem anos e intitulado “O homem que sabia javanês”. Vale o risco de parafrasear a lucidez algo escrachante de Tom Zé: com quantos quilos de medo e mediocridade se faz uma (con)tradição?

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