Fui ontem ao ginásio do Ibirapuera, assistir a mais um show do Roberto Carlos. E me emocionei muito, muito, muito, como há muito tempo não acontecia – de chorar praticamente toda a primeira metade do show.

Não sei se sei explicar por que tanta choradeira, por um espetáculo que afinal de contas não deixa de ser idêntico a todos os outros que ele promove há séculos.

Mas sei que me emocionei influenciado por uma conversa que tinha tido um dia antes, sobre o Brasil. Sobre o direito que nós, brasileiros, temos (e na maior parte do tempo não desfrutamos) de nos orgulhar do Brasil. Sobre perceber e reconhecer o que de bom, ótimo e excelente anda sobrevoando por aí. Sobre abrir os olhos e sair do círculo vicioso medíocre dos “midia victims”, do nhenhenhém enfadonho de só criticar, criticar, criticar, e só reclamar, reclamar, reclamar, do senado, do Sarney, da “mentirosa” Dilma, da gripe suína, do assassinato da menininha atirada pela janela, do inverno que não acaba, do calor que faz suar, da chuva, do sol, da lua, da nuvem. Sabe a Hiena Hardy, “ó céu, ó dia, ó vida…”?

Fui para o Ibira nesse espírito neobrasileiro, disposto a ver e admirar Roberto Carlos como algo e alguém de que tenho razões suficientes para me orgulhar muito, muito, muito. E aí foi fácil: foi só abrir a torneirinha de choradeira – difícil depois era fechá-la de volta.

É evidente que colabora à beça para esse humor o fato de que ele, o cara, está num momento especialmente iluminado. Cantando bem como o capeta, se me permitem a blasfêmia. Aparentemente seguro e sabedor do tamanho acumulado pelos seus 50 anos de música. E transmitindo com simplicidade e clareza ao público a constatação de que ele, RC, ama intensamente as canções que escreveu (quase sempre em duo com Erasmo Carlos, e isso ele esqueceu novamente de mencionar).

Um dos fios condutores centrais do meu livro “Como Dois e Dois São Cinco” (Boitempo, 2004) consiste em demarcar, sempre que possível, que desde que despontou para o “sucesso” Roberto Carlos é a cara do Brasil, Roberto Carlos é o brasileiro por excelência, Roberto Carlos é o Brasil refletido no espelho, Roberto Carlos É o Brasil.

Por isso é quase desconcertante ir até lá e vê-lo tão bem, tão encantado consigo mesmo e com suas canções. Porque se Roberto Carlos tem passado os últimos anos se tratando e se curando de suas feridas psíquicas, e se Roberto Carlos anda tão bem e tão iluminado, só posso ser fiel ao meu amado “Como Dois e Dois São Cinco” e concluir: o Brasil tem passado os últimos anos se tratando e curando de suas feridas psíquicas, e o Brasil anda tão bem e tão iluminado que dá vontade de chorar.

[Coincidência ou não, depois do show eu fui para o Bar Secreto e de repente apareceu na minha frente uma garota cearense, chamada Isadora, amiga da Karine Alexandrino (autora do disco “Querem Acabar Comigo, Roberto”). Eu e Isadora não nos conhecíamos, mas ela me disse que gostou muito do “Como Dois e Dois São Cinco”, e que Roberto Carlos, mesmo “neurótico”, a emociona demais. Foi difícil não desatar a chorar de novo, que dia, Nossa Senhora!]

Mas, então, não é só vontade de chorar. Minha torneirinha de chororô continua ligada e jorrante até agora. Aliás, acho que sei por que choro tanto: desse estranho e ainda meio desconhecido sentimento de felicidade-liberdade. E de orgulho de Roberto Carlos, ou seja, do Brasil. Chuif.

PUBLICIDADE
AnteriorEL MATADOR
PróximoVOLTA, BELCHA!!!!
Editor de FAROFAFÁ, jornalista e crítico musical desde 1995, autor de "Tropicalismo - Decadência Bonita do Samba" (Boitempo, 2000) e "Como Dois e Dois São Cinco - Roberto Carlos (& Erasmo & Wanderléa)" (Boitempo, 2004)

DEIXE UMA REPOSTA

Por favor, deixe seu comentário
Por favor, entre seu nome