“Maria da Escócia” e as relações de poder

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Cena da peça "Maria da Escócia", com as atrizes Bete Dorgam e Kátia Naiane
Cena da peça "Maria da Escócia", com as atrizes Bete Dorgam e Kátia Naiane - Foto Philipp Lavra.

Rainhas, primas e rivais. Elizabeth I e Mary Stuart protagonizaram no século 16 uma ferrenha disputa de poder que resultou na decapitação da última, 18 anos após permanecer presa, sob a acusação de tramar um complô para assassinar a primeira.  A intricada trama é fartamente documentada em livros de História, mas sobre ela ainda pairam inúmeras interpretações do papel de cada uma. Em Maria da Escócia, peça em cartaz no Teatro Cacilda Becker com dramaturgia de Fernando Bonassi e direção de Alexandre Brazil, as duas rainhas têm um derradeiro encontro fictício no qual enfrentam suas dores e as dores do mundo.

A veterana atriz Bete Dorgam dá vida a Elizabeth I, filha bastarda do famigerado rei Henrique VIII,  assumiu o reinado aos 25 anos, abrindo mão de se casar e ter filhos. Conhecida como a “rainha virgem”, ela construiu um império baseado no exercício do poder, enfrentando de forma revolucionária o mundo machista da época. Já Kátia Naiane interpreta Mary Stuart, a Maria da Escócia que dá nome à peça. Ao contrário da prima, ela era tida como uma articuladora política, que se casou duas vezes com herdeiros dos tronos da França e da Inglaterra.

Inspirada no texto Mary Stuart (1800), do alemão Friedrich Schiller, Maria da Escócia coloca, lado-a-lado, porém separadas por grades, as duas rainhas. Mary clama pelo perdão de Elizabeth I, e a rainha até que cogita essa hipótese. Mas ela se sente pressionada a matar sua prima rival para preservar o seu poder perante uma sociedade que a oprime se não for enérgica. Uma (Mary) representa o coração; a outra (Elizabeth I), a razão. A peça dá espaço para que cada rainha apresente a sua visão dos fatos, tal como num tribunal em que defesa e acusação têm espaços iguais para que depois um júri decida pelo veredito. No caso, cabe ao público imaginar responder à pergunta da rainha da Inglaterra: “Matar ou não matar, eis a questão?”

Em determinada cena, Mary invoca a sororidade para a prima. No século 16, seria difícil imaginar que isso acontecesse a partir das relações de poder. Mas a questão é que cinco séculos depois ninguém apostaria que o desfecho fosse outro. Colocadas e vigiadas no poder por homens, as duas rainhas renascentistas da montagem são mulheres fortes, mas fragilizadas pela encruzilhada que as colocam em campos opostos de uma batalha que não era delas.

Elizabeth I, após a morte de Mary Stuart, consegue fazer com que a Inglaterra se torne uma potência mundial graças à colonização mundo afora. Internamente, incentiva o renascimento das artes, com destaque para o teatro elizabetano, que legou para o mundo William Shakespeare. Ao morrer, em 1603, Elizabeth I, sem filhos, deixou o trono para Jaime, filho de Mary, reuniu os reinos da Inglaterra, Irlanda e Escócia sob o comando da dinastia Stuart.

Maria da Escócia. De Fernando Bonassi. Dias 24 (sexta) e 25, às 21 horas; e 26 (domingo), às 19 horas. No Teatro Cacilda Becker, São Paulo. Grátis.
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