‘West Side Story’, de Spielberg, corrige erros do filme de 1961

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Cena de West Side Story, na versão 2021 de Steven Spielberg
Cena de West Side Story, na versão 2021 de Steven Spielberg - Foto: Divulgação

Assobios ecoam, enquanto se vê uma área de Nova York onde os moradores sofrem com as ameaças de despejo. Jovens brancos passeiam no bairro de Upper West Side, de Manhattan, como se fossem os donos do local e começam a dançar graciosamente pelas ruas, que agora é habitada predominantemente por porto-riquenhos.

A tensão racial e a disputa pelo território se tornam motivo de briga entre as principais gangues da cidade: o grupo dos Jets é composto por jovens brancos estadunidenses, e os Sharks, por imigrantes porto-riquenhos. No meio desse duelo, floresce o amor entre Tony e Maria: ex-membro dos Jets e a irmã do líder dos Sharks. 

A inspiração para West Side Story (2021) é a peça Romeu e Julieta, escrita por William Shakespeare, em 1597. Na nova roupagem, a disputa entre os Montéquios e Capuletos também aborda temas relevantes como o racismo estrutural, xenofobia, transfobia, violência policial e o desamparo das políticas públicas em relação aos jovens em situação de vulnerabilidade social.

A peça original da Broadway foi lançada em 1957 – com composições de Leonard Bernstein, letras de Stephen Sondheim, coreografias de Jerome Robbins e libreto de Arthur Laurents. Quatro anos depois, foi adaptada para o cinema com Natalie Wood, Richard Beymer, Rita Moreno e George Chakiris nos papéis principais. 

Ao conquistar dez estatuetas do Oscar, incluindo a de Melhor Filme, a versão cinematográfica original é até hoje lembrada como um dos maiores musicais já produzidos por Hollywood. O cineasta Steven Spielberg era fã do musical desde os dez anos e, com o remake, ele evidencia a sua paixão e entrega um dos seus melhores trabalhos. 

“Muitas crianças nunca viram a peça ou o filme de 1961, então fizemos esse longa pensando especialmente em quem vai ter a experiência de ver ‘Amor, Sublime Amor’ pela primeira vez. E eu espero que daqui a 20, 30 anos, alguém faça outra versão, porque essa é uma história que precisa continuar circulando”, disse o cineasta para a Folha de S.Paulo logo depois de uma première do longa em Nova York. 

Adaptar um filme tão aclamado poderia ser um grande risco. Porém, além das cenas muito bem dirigidas – que demonstram a maturidade e genialidade de Spielberg atrás das câmeras – o diretor também corrige erros do filme passado. 

Na versão original, apenas Rita Moreno, que interpreta Anita – amiga da protagonista e namorada de Bernardo, líder dos Sharks – era porto-riquenha. Na época, o resto do elenco chegou a usar uma maquiagem para escurecer a pele e trouxe estereótipos daquela população através do sotaque carregado. 

Desta vez, Spielberg traz atores latinos ou descendentes para os papéis e não legendou as falas em espanhol em respeito à língua. O diretor também traz mais profundidade aos personagens, desde o arco de Chino, interpretado por Josh Andrés Rivera, rapaz doce e promissor que se revolta após uma grande perda, até o personagem de Iris Menas, jovem não-binário que prova o tempo todo ser suficiente para se juntar a gangue dos Jets. 

Os protagonistas, interpretados por Ansel Elgort (Tony) e Rachel Zegler (Maria), vivem um amor proibido e, apesar da rivalidade, acreditam que o amor pode encerrar com as diferenças entre os dois grupos. 

Enquanto o primeiro filme segue a fórmula original da peça, onde Romeu e Julieta se apaixonam e enfrentam todas as consequências para ficarem juntos, neste filme eles têm a oportunidade de sair em um encontro e discutir os problemas sociais que cercam o romance. 

A repaginada nas cenas também enriqueceram a narrativa. Enquanto a cena de “América”, onde Anita (Ariana DeBose) e Bernardo (David Alvarez) discutem as vantagens e desafios de ser imigrante nos Estados Unidos, foi gravada em um telhado no filme de 1961, agora os porto-riquenhos fazem a coreografia espetacular nas ruas de Nova York.  

Outro destaque vai para a cena de “Cool”, onde Tony e Riff (Mike Faist) falam sobre o porte de arma que irão usar no “rumble” (duelo). Rita Moreno, que interpretou Anita na versão original e se tornou a primeira atriz latina a vencer o Oscar na categoria de atriz coadjuvante, também abrilhanta o filme, agora como Valentina, esposa do falecido dono do estabelecimento do Docs. 

West Side Story (2021) reverência o filme antigo trazendo a diversidade necessária e continua trazendo luz para pautas relevantes levantadas pela peça que já existe há mais de 500 anos.

* Resenha produzida para o Centro de Estudos Latino Americanos sobre Cultura e Comunicação da Universidade de São Paulo (Celacc-USP)

West Side Story. De Steven Spielberg. Estados Unidos, 2021, 156 mins. Na Disney+.

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