IMS apresenta uma portentosa mostra do fotógrafo Peter Scheier, refugiado do nazismo que desenvolveu uma linguagem singular
Fotografou mulheres torcendo o braço de outras, camelôs, deficientes, filas em pontos de ônibus e operários em andaimes, assim como obras monumentais do modernismo, exposições de arte, o nascimento de Brasília, o nascimento do Estado de Israel. O fotógrafo judeu alemão Peter Scheier, que pode perfeitamente ser chamado de fotógrafo brasileiro Peter Scheier (porque trabalhou a vida toda aqui e só se tem notícia de duas fotos que teria feito na Alemanha) é objeto de uma portentosa mostra, a maior retrospectiva de seu trabalho, no Instituto Moreira Salles (IMS). Só o IMS possui cerca de 35 mil negativos do artista.
Peter Scheier, que chegou ao Brasil em 1937, como refugiado do nazismo, e tornou-se fotojornalista da revista O Cruzeiro entre 1945 e 1951, numa época em que a fotografia dessa publicação procurava emular estrangeiras como Life, Paris Match e Vu. A exposição no IMS não só destaca essas imagens produzidas por Scheier, como (abaixo delas) exibe as reportagens que ilustraram. O resultado é fascinante: é como se testemunhássemos o nascimento de uma linguagem na junção entre o esforço documentarístico e o rigor formal estético (fotografou para pioneiros da arquitetura, como Rino Levi, Gregori Warchavchick e Lina Bo Bardi).
Scheier será uma descoberta para a maioria dos espectadores que forem ao IMS, já que só houvera uma retrospectiva de suas fotos em 1970, no Masp, organizada por ele mesmo. As fotos da exposição foram escolhidas, além do acervo da própria instituição, nas coleções do Masp, da Casa de Vidro, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e do Instituto Peter Scheier. Não se sabe muito sobre sua atividade anterior à chegada ao Brasil (onde foi contador e comerciante), como salienta a curadora Heloisa Espada, da equipe do MIS. Mas há pistas de suas influências: sua biblioteca tinha livros de Cartier-Bresson, por exemplo, e ele dialogou com os contemporâneos, como Marcel Gautherot.
A singularidade de Scheier é justamente o fato de que ele enxerga o humano na articulação monumental da industrialização e da construção civil. Há sempre muitos planos em suas fotos, e uma espécie de teatro do humanismo em progresso (da fotografia sensacionalista, levemente montada, ele trouxe alguns truques da expressão facial e corporal). Uma das belas surpresas desse início de ano nas galerias paulistanas.
Arquivo Peter Scheier. Curadoria de Heloisa Espada. IMS (Avenida Paulista, 2424). Grátis. Abertura dia 25, 11h. Visitação até 24 de maio. De terça a quinta, das 10h às 20 h.