Cena do
Cena do "Baile do Menino Deus" - foto: Hans Manteuffel/ divulgação

Celebrando 40 anos e há 20 apresentado consecutivamente no Marco Zero do Recife, o Baile do Menino Deus, maior espetáculo natalino do Brasil, terá sua edição, este ano, realizada de amanhã (23) a segunda-feira (25), sempre às 20h, com transmissão online pelo youtube no último dia.

O espetáculo propõe, pelos caminhos do teatro e da música, uma reaproximação com o sentido religioso do Natal, em contraponto à lógica meramente capitalista/comercial da neve de isopor, Papai Noel, renas, shopping centers e refrigerantes.

Com duração de uma hora, o espetáculo tem acesso gratuito, tradução simultânea em Libras, a língua brasileira de sinais, audiodescrição e acessibilidade para cadeirantes.

FAROFAFÁ conversou com exclusividade com o médico, escritor e dramaturgo Ronaldo Correia de Brito, diretor do espetáculo.

O diretor Ronaldo Correia de Brito - foto: Hans Manteuffel/ divulgação
O diretor Ronaldo Correia de Brito – foto: Hans Manteuffel/ divulgação

QUATRO PERGUNTAS PARA RONALDO CORREIA DE BRITO

ZEMA RIBEIRO: O Baile do Menino Deus atingiu marcos impressionantes, em termos de longevidade e público. Quais os principais desafios na montagem do espetáculo, hoje?
RONALDO CORREIA DE BRITO: Captar recursos para manter o excelente nível de profissionais que trabalham nele e aprimorar cada vez mais a qualidade técnica do espetáculo: som, luz, palco, etc. No Brasil, 80% dos recursos da Lei de Incentivo à Cultura ficam nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, em bairros específicos dessas cidades. Apenas 20% são captados por Sul, Centro-Oeste, Norte e Nordeste. É uma desigualdade absurda.

ZR: O espetáculo acaba sendo também um contraponto a uma visão mais comercial do Natal, o que esvazia o sentido religioso da data. Sempre houve essa intenção?
RCB: O Baile do Menino Deus foi criado há 40 anos, em 1983, para mostrar às pessoas, sobretudo às crianças, o Natal brasileiro que era celebrado antes da invasão comercial do “Natal nevado”, feita pelos Estados Unidos, desde o fim da Segunda Guerra. Antes, o Brasil inteiro celebrava as festas natalinas com elementos da cultura ibérica, assimilados e adaptados pela cultura dos povos indígenas e africanos. Havia lapinha, pastoril, folia de reis, reisado, boi de reis, bumba meu boi, guerreiro etc. Tudo isso foi relegado ao estrato mais pobre da sociedade, como coisa sem muito valor. A própria Família Sagrada, Jesus, José e Maria passou a significar nada. Duvido que você encontre uma lapinha num shopping. Encontra Papai Noel, renas, personagens da Disney e neve de isopor. O Baile surgiu como reação a esse massacre cultural.

ZR: Um espetáculo nordestino, levando essa realidade geográfica em oposição ao ideário de neve que acabou se impondo como a única visão possível de Natal, quer dizer, de todo modo a gente continua falando nessa contraposição à lógica capitalista. De algum modo isso também desperta a curiosidade do público, que quer ver um Natal diferente. Você acredita que a isto se deve também o constantemente renovado interesse do público?
RCB: Sim, o Baile fala de temas caros às pessoas. Revela o sagrado de cada um, propõe a abertura de portas, o fim das fronteiras – de um mundo sem portas ando à procura, para a porta sem portas, sigo adiante – fala um dos Mateus. O outro Mateus diz: quando nasce um menino, renasce toda alegria, por mais humilde que seja é a vida que se cria, é a esperança do mundo que com ele se anuncia. O Baile sempre tomou o partido da cultura excluída, porque eram assim o Cristo e sua família de galileus, o mesmo que favelados e periféricos.

ZR: A valorização de culturas como o hip hop e de minorias como negros e indígenas no elenco é também uma marca do Baile este ano. Quero te ouvir um pouco sobre essas opções e essa preocupação.
RCB: Deste ano apenas, não, é a marca de sempre. No primeiro ano, os Reis Magos já eram representados por um ibérico, um indígena e um africano, numa referência aos povos que nos formaram. Uma das favelas mais miseráveis do Recife é o Canal do Arruda. No entanto, lá tem um grupo de dança de rua, hip hop e break, de grande qualidade. Desde o filme que fizemos em 2021, Okado do Canal e sua turma trabalham com a gente. E já teve o Grupo Bongar, da Comunidade Xambá, um quilombo urbano. Sempre incorporamos pessoas e grupos, mas tenha certeza de que essas pessoas são convidadas pela excelência que representam, por serem grandes artistas.

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Ouça a trilha sonora do Baile do Menino Deus:

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