Um acalorado debate mobilizou a França, há mais de 20 anos, em torno do direito à eutanásia. O tema, ainda polêmico por toda parte, ganhou contornos dramáticos com o caso do jovem Vincent Humbert, de 22 anos, que ficou cego, mudo e tetraplégico após um acidente de carro. Em 2012, essa história virou o espetáculo Amadeo, de Côme de Bellescize, e impactou tanto a atriz e diretora franco-brasileira Janaína Suaudeau, que ela se empenhou em trazer a peça para o Brasil, agora em cartaz no Tucarena, em São Paulo.
Janaína traduziu o texto de Bellescize com a colaboração da atriz e agora diretora Clara Carvalho e desse trabalho em conjunto resultou no espetáculo sob direção do diretor Nelson Baskerville. A peça gira em torno de Amadeo (Thalles Cabral), que tem 19 anos, é viciado em jogos eletrônicos, sonha ser um piloto de Fórmula 1, é virgem, mas está em vias de resolver essa querela com a namorada, a jovem Julia (papel assumido por Janaína). Sua mãe (Chris Couto), como toda mãe, é compreensiva, mas não deixa de se preocupar com o filho enfurnado no computador.
Duas cadeiras de gamers estão dispostas no palco antes do início do espetáculo, já dando pistas para uma narrativa em ritmo e linguagem de jogos eletrônicos. A montagem é construída a partir de cortes rápidos por passagens importantes da vida do personagem principal. Até que um grave acidente literalmente arremete Amadeo para uma cama, onde enfrentará uma “morte viva“. Resta a ele, na solidão de uma vida praticamente sem comunicação, enfrentar seu próprio alterego, Clóvis (Claudia Missura). É esse “amigo” quem irá questionar o jovem Amadeo sobre sua situação.
Outros personagens e situações surgirão, ora revelando o sentido de estar “vivo”, ora o de ter perdido para sempre um momento que poderia ter sido bom. Amadeo, o jovem, tem poucos progressos, mas consegue uma comunicação possível a partir de joysticks que ele consegue manipular com dois dedos, os únicos que o permitem se conectar com os que estão à sua volta. Na vida real, Vincent Humbert chegou a escrever o livro Eu peço o direito de morrer, com o jornalista Frédéric Veille.
O tom infanto-juvenil presente na montagem, que poderia ser prejudicial como um todo, não anula a convulsão de sentimentos que aflora após o fim do espetáculo. A peça Amadeo termina sob o signo de uma catarse em muitos da plateia, o que é natural e esperado diante de um tema tão sensível.