Desde o dia 1º deste mês, a direção da Agência Nacional de Cinema (Ancine) tem submetido seus servidores a um pente-fino de segurança irregular na saída do edifício-sede, no Rio de Janeiro. “Os volumes (bolsas, malas, pacotes, mochilas) deverão ser inspecionados por meio de detectores de metais em bastão pelos seguranças da empresa de vigilância”, anunciou um informe da direção enviado aos funcionários na semana passada. “Caso o alarme seja acionado, o usuário deverá disponibilizar o volume para revista do segurança. Para agilizar a verificação, os objetos de metal (chaves, celulares, notebooks pessoais e equipamentos eletrônicos) podem ser colocados na mesa disponibilizada para essa finalidade na recepção”.

A medida, mais um sintoma do colapso da gestão do sistema federal de cultura durante o governo de Jair Bolsonaro, causou espanto entre os funcionários da agência. “Tive que abrir minha mochila para o segurança”, afirmou uma servidora. “Cara, ter que ser revistada com detector de metal e abrir a mochila… achei muito bizarro”. Outro funcionário contou o seguinte: “Na hora da saída o segurança me chamou e me pediu para passar o detector, que obviamente tocou porque minha mochila estava cheia de pequenas coisas de metal, e ele, muito constrangido, mas seguindo ordens, me pediu para abrir e ver minhas coisas”.

Os servidores consideram que as revistas pessoais no serviço público são irregulares, segundo o Ministério Público do Trabalho, já que violam o direito fundamental da intimidade. A exceção é a Casa da Moeda, devido a norma internacional. Mas a diretoria não recuou da determinação – o argumento é que se procura , com as revistas, coibir o furto de computadores da instituição, um surto de desaparecimentos (24 equipamentos até agora, 23 desktops e um notebook) que levou inclusive à demissão de dois servidores recentemente. Esses servidores nem sequer desempenhavam funções relativas à segurança patrimonial. E, mesmo após as demissões, os sumiços continuaram.

Sucateados, vivendo crises de autoridade e de gestão, os equipamentos culturais do sistema federal de cultura experimentam uma situação jamais imaginada. As constrangedoras revistas na Ancine não foram determinadas por uma norma oficial (uma portaria ou uma mensagem institucional), mas instruídas por um simples e-mail. Carecem, portanto, de legalidade. Os servidores questionam inclusive a abrangência da medida – que aparentemente não está sendo aplicada linearmente, alcançando também cargos hierárquicos superiores (diretores, superintendentes, gerentes e secretários). Isso pode caracterizar discriminação.

A agência, não custa lembrar, possui policiais rodoviários federais em cargos de confiança, além de militares e prepostos destes em cargos-chave.  “E é preciso também transparência sobre como a agência está lidando com o sumiço dos notebooks, pois o que parece é que até agora exoneraram servidores como bodes expiatórios que não tinham qualquer obrigação de segurança patrimonial, os responsáveis estão sendo protegidos e as imagens de câmera não estão sendo usadas para apurar os culpados. A agência já teve problemas de furtos há alguns anos, e o encaminhamento da apuração foi bem mais transparente, informando aos servidores o que estava acontecendo e como a agência estava procedendo, sem necessidade de transformar todos os servidores em suspeitos”, ponderam os servidores.

Na iminência de se tornar objeto de um amplo escrutínio pelo Grupo de Transição do governo eleito de Luiz Inácio Lula da Silva, a Ancine tenta garantir a sobrevida do status quo de seu núcleo dirigente. Isso implica um fortalecimento de suas instâncias que em tese deveriam ser independentes – essa semana, a menos de um mês da posse de um novo presidente, o governo que sai nomeou um novo Auditor-Chefe para a agência, o que é um escândalo em si. Mas não é só: após anos de paralisação de seus mecanismos de fomento, sob alegações burocráticas, a Ancine publicou essa semana (a 3 semanas de expirar o mandato do velho governo) suplementação de recursos para Chamadas Públicas da área audiovisual: 30 milhões de reais para Novos Realizadores, 10 milhões de reais para Jogos Eletrônicos, 6 milhões de reais para apoio ao Pequeno Exibidor. Foram aprovados também 160 milhões de reais para operações de crédito. A liberação dos recursos na bacia das almas, recursos que se diziam inexistentes, revelam um certo cinismo da atual diretoria, reconduzida por Bolsonaro para ficar até 2026 nos postos. Há apenas um cargo vago para a diretoria – segundo o jornal O Globo informou, esse lugar deverá ser preenchido, logo no início do ano, pela indicação da roteirista Antonia Pellegrino.

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6 COMENTÁRIOS

  1. Presidente Lula: transforme a Ancine em outra coisa, por favor! Basta mudar o órgão que os mandatos se vão; eles só são estáveis se mantiver a lei atual. Aproveita e faz uma medida provisória logo em janeiro.

    É uma agência significativamente de fomento, precisa seguir o programa de desenvolvimento do novo governo, que deve cumprir as promessas de campanha e construir um órgão plural e diversificado para o audiovisual, regionalizado e periférico.

  2. Esse farofafá é muito engraçado…
    Primeiro apoia o golpe dentro da Ancine endossando a ascensão de Alex Braga a Diretor Presidente, (ex procurador chefe por vários anos e aliado forte de Manoel Rangel), e agora se faz de oposição criticando as aberrações que esse grupo sempre protagonizou na agência… Ahhh vai enganar outro trouxa!

  3. Ao insigne leitor José das Couves

    Este jornalista, responsável pela série de reportagens sobre a desarticulação das políticas audiovisuais do País nos últimos 6 anos, o desafia a apresentar UMA ÚNICA reportagem que expresse apoio a qualquer um dos dois grupos que encabeçaram o esforço antirrepublicano, antidemocrático e personalista na condução da agência federal de Cinema – um dos quais o sr. demonstra notável familiaridade. Talvez uma eventual condição de réus na Justiça por ação daninha ao interesse público tenha deixado tempo livre para operar tentativas de intimidação da imprensa livre, mas devo advertir que aqui não cola.

    Um abraço

    J.

  4. Esse blog nunca foi imprensa livre!
    Jamais se deu o trabalho de investigar fatos e apurar informações. É publicador de “release”.
    Atua sempre direcionado e pautado visando “fritar” os alvos que lhe interessam. Age da mesmíssima forma que o próprio governo que este parco redator diz criticar.
    É uma especie de “imprensa do ódio do audiovisual”.
    Para finalizar, pode continuar chamando o seu crítico de réu, da mesma forma que Bolsonaro fez durante toda a campanha e, no fim, PERDEU MANÉ!

  5. Mudou rapidamente de nome o José das Couves, mas segue sem provar o que afirma…. Desafio a mostrar UM TEXTO de apoio aos grupos de desmonte dos últimos 6 anos. Poste aqui, Pombo-correio!
    Um fenômeno essa neoconfusão mental desses ex-asseclas do fascismo: agora querem grudar no novo governo por osmose. Não cola, amigo.

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