Alex Braga Muniz (na extrema direita) e os diretores da Ancine comemorando sua aprovação no Senado com o senador Carlos Portinho, relator de sua indicação, em 2021

A diretoria da Agência Nacional de Cinema (Ancine) “sumiu” com a gravação em video de uma das suas sessões administrativas, transcorrida na quinta-feira, 15 de setembro, que tratou da revisão do Orçamento de 2022 da instituição. A censura ao conteúdo do vídeo atenta contra o artigo 16 da Resolução 102/2020, que determina a publicidade obrigatória, em meio eletrônico, de todas as reuniões da diretoria colegiada da Ancine.

O fato foi denunciado por servidores ao Ouvidor-Geral da Ancine, João Paulo Machado Gonçalves, mas há pouca expectativa de que Gonçalves tome alguma providência a respeito – seu currículo já foi amplamente divulgado aqui no Farofafá. A diretoria também decretou sigilo sobre o processo 01416.008349/2022-94, o que é ilegal (contraria a lei 12.527/11), por se tratar de matéria orçamentária e uso de recursos públicos aos quais deveria ser dada ampla publicidade. Há suspeitas de que a agência não tenha recursos disponíveis para cumprir com os compromissos da infinidade de editais que divulgou desde o ano passado, com ampla publicidade da imprensa mais amiga, mas sem resultados até agora.

“Infelizmente não se trata de caso isolado, já que a Ancine ainda não cumpre o Plano de Ação acordado com o Tribunal de Contas da União (TCU) em razão do mau desempenho da última avaliação do Índice Integrado de Governança e Gestão Públicas nem do Plano de Ação do Programa Nacional de Combate à Corrupção, que prevêem a publicidade do orçamento da agência e dos respectivos contratos administrativos firmados”, diz o ofício da associação de servidores da agência ao Ouvidor-Geral. A atual diretoria da Ancine tem negado repetidamente os recursos de pedidos de informação em 2022, sempre por unanimidade entre os diretores.

CONDECINE SOB NOVO ATAQUE

Além da ameaça de extinção da Condecine (Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional) no texto do Orçamento da União de 2023, proposta pelo governo de Jair Bolsonaro, o tributo que financia todo o cinema nacional sofreu uma nova e surpreendente investida essa semana.

Dessa vez, o ataque vem pela via judiciária. Há anos, o Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e Serviços Móvel Celular e Pessoal (Sinditelebrasil) vem brigando na Justiça para declarar inconstitucional a Condecine das Teles e fazer com que as empresas filiadas não se sujeitem à sua cobrança. O sindicato tinha conseguido liminar em 2016 para suspender o recolhimento, mas a liminar foi derrubada no STF, com o mérito julgado em 1ª instância em 2017 (quando então o mandado de segurança foi negado). Desde então o Sinditelebrasil entrou com novos recursos que vinham sendo negados, e o processo estava parado desde maio de 2021.

A má notícia veio justamente na mesma semana em que o governo enviou ao Congresso Nacional a proposta orçamentária prevendo a extinção da Condecine: o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) realizou um novo julgamento no dia 13 de setembro, e o resultado foi a declaração da nulidade da sentença de 1ª instância (sob uma argumentação nonsense de que teria havido “prestação jurisdicional incompleta e fundamentação deficiente”), determinando um novo julgamento. Acontece que, dessa vez, a sentença do TRF1 se mostra previamente favorável aos argumentos do Sinditelebrasil – e a relatora do caso, desembargadora Gilda Maria Sigmaringa Seixas, remeteu o processo para a Corte Especial do TRF1 para análise da Arguição de Inconstitucionalidade.

Para observadores do setor, a reviravolta no caso demonstra uma nova inclinação do tribunal e a coincidência de datas faz crer na possibilidade de um acordo com o governo – a previsão de extinção da Condecine para 2023 pode estar baseada não num novo projeto de lei, mas numa “dobradinha” entre governo e tribunal para a declaração de inconstitucionalidade da Condecine. Para se ter uma ideia, só a Rede Globo teria um lucro de R$ 200 milhões com o término da cobrança.

De qualquer forma, segue sendo bizarro, no mínimo, que a diretoria atual da Ancine siga fingindo de morta sobre a proposta de Orçamento 2023 pelo governo federal ou a respeito deste último recurso do Sinditelebrasil (que resultou na declaração de nulidade da sentença anterior). Esclarece barbaramente acerca de qual lado se posiciona a diretoria que Bolsonaro fez aprovar no Congresso Nacional. A extinção da Condecine significaria a consequente extinção de todo o cinema independente brasileiro, mas tal ameaça não é vista com indiferença pela sociedade civil – nesta sexta, a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro, a Firjan, por intermédio do seu presidente em exercício, Luiz Cesio Caetano, se posicionou contrária à extinção do tributo. As entidades de classe já sabem o impacto de uma medida dessas nos índices nacionais de emprego e renda.

 

 

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