Após deliberação da Comissão da Anistia, o governo federal concedeu na última quinta-feira, 22, reparação de caráter indenizatório (reconhecendo perseguição política durante a ditadura militar) a Raphael Viviani, ex-contador que trabalhou para o cantor Wilson Simonal (1938-2000) no início anos 1970. Viviani denunciou Simonal como autor de uma delação que levou o contabilista a ser preso e torturado com eletrochoques e espancamentos, uma polêmica que se arrasta há quase 50 anos. Viviani, agora na condição de anistiado político, receberá 30 salários mínimos de indenização, ou R$ 33 mil.
O ex-contador protagonizou, à revelia de sua vontade, uma das páginas mais obscuras e dolorosas da Música Popular Brasileira. Contratado por Wilson Simonal, então uma estrela da música, em outubro de 1970, foi demitido pelo cantor em junho de 1971 sob a acusação de apropriação indébita de valores da firma do artista. Em 24 de agosto, Viviani contou, o cantor levou à sua casa um agente e um colaborador do DOPS, supostamente amigos de Simonal, e o encaminharam para a repartição policial. Durante 24 horas, foi torturado para confessar, o que efetivamente aconteceu – o contador registrou de próprio punho sua confissão, dizendo que tinha gastado o dinheiro subtraído do artista com “noitadas, bebidas e mulheres”.
Viviani teve sequelas físicas com o episódio e foi aposentado por invalidez. A história que contou, amplamente contestada ao longo das décadas, acabou com a carreira do cantor, que protagonizou um dos primeiros fenômenos de “cancelamento” do País. Viviani processou Simonal, que foi julgado. Houve depoimentos de funcionários do Departamento da Ordem Política e Social (Deops) que declaravam que o músico seria informante do órgão, algo também nunca demonstrado com fatos. Simonal foi condenado pelo sequestro e cumpriu em liberdade uma pena de cinco anos de prisão.
Diversos livros e filmes abordaram o caso, como o documentário Ninguém Sabe o Duro que Dei, de Cláudio Manoel, Micael Langer e Calvito Leal, lançado em março de 2008, e o livro Nem vem que não tem – a vida e o veneno de Wilson Simonal (Editora Globo), do jornalista Ricardo Alexandre. “Paguei pelo que fiz e hoje me arrependo, mas nunca dedurei ninguém”, disse o músico numa entrevista ao jornalista Luiz Antonio Giron, em 1991.
Uma grande pisada na bola do Simonal, infelizmente. Falo isso com uma dor profunda como um novo fã do maior artista do Brasil. Minha mãe e outras pessoas da minha família reconheceram, com um grande sentimento de bom orgulho, a grandeza extraordinária desse cantor estupendo.