Ministério x Secretaria

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Caetano Veloso e Erasmo Carlos participam do Ocupa MinC RJ - Foto: Katiana Tortorelli / Mídia NINJA

8 pontos que ajudam a entender porque uma Secretaria no lugar de um Ministério é de fato um rebaixamento

Caetano Veloso e Erasmo Carlos participam do Ocupa MinC RJ - Foto: Katiana Tortorelli / Mídia NINJA
Caetano Veloso e Erasmo Carlos participam do Ocupa MinC RJ – Foto: Katiana Tortorelli / Mídia NINJA

Desde que foi anunciada a extinção do Ministério da Cultura (MinC) e a fusão de sua antiga estrutura com o Ministério da Educação, muito foi debatido e dito e pouco foi esclarecido sobre o significado dessa medida. Afinal de contas, o que muda com o fim de um ministério e a adoção de uma secretaria?

Um secretário de Cultura é realmente um primo pobre de um ministro? Por quê? Marcelo Calero, o novo secretário, vai ser figura decorativa ou vai ter voz ativa nessa interinidade? Como ficam as diversas estruturas vinculadas ao antigo ministério? Quando será possível o retorno da apreciação dos pedidos da Lei Rouanet?

Gente que conhece a fundo os meandros das atividades culturais, como Danilo dos Santos Miranda e Fernanda Montenegro, têm convicção quando dizem que é um rebaixamento, um retrocesso. A reedição, essa semana, de uma Medida Provisória criando novo status para a Secretaria de Cultura resolveu alguns problemas, como a equiparação de funções dos antigos auxiliares do MinC aos seus colegas dentro da estrutura do Ministério da Educação, agora seu hospedeiro. Mas está longe de dar conta da enormidade das antigas atribuições.

Abaixo, este blog lista 8 pontos que podem ajudar a entender quais serão as dificuldades para que ser efetive a transformação anunciada pelo governo interino.

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O ponto que diferencia de forma mais evidente o ministério de secretaria: o simbolismo. Não é praxe secretário despachar com o presidente e/ou participar de reunião de ministros. Na prática, é segundo escalão (a Esplanada dos Ministérios é muito hierárquica, esses códigos são levados a sério ali). O secretário também tem menor interlocução com outros ministros (que costumam enviar secretários para falar com secretários), menos poder, não terá facilidade de acesso aos ministros da área financeira; os orçamentos das secretarias para costurar acordos e parcerias são reduzidos. Outra coisa é que o Ministro de Estado da Cultura tinha uma maior autoridade simbólica para representar a cultura brasileira fora do Brasil. O Brasil se torna um dos poucos países da América do Sul que não tem ministério (Argentina, Uruguai, Colômbia, Venezuela, Peru têm).

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Um impacto imediato da extinção do MinC é que havia um volume de processos muito grande sendo avaliado anualmente na pasta, o que exigiu a criação de uma estrutura administrativa própria e eficiente. A medida provisória nº 726, de 12/05/2016, que extinguiu o MinC, eliminou consequentemente todos os cargos da área administrativa do Ministério da Cultura e aqueles ligados aos órgãos comuns (Gabinete do Ministro, Secretaria Executiva, Consultoria Jurídica). Com isso, todos os processos do MinC ficaram paralisados, e sua fusão com a área administrativa do MEC exigiria uma readaptação total das estruturas, no curtíssimo prazo, sob pena de causar prejuízos imediatos à sociedade.

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Uma diminuição do número de secretarias do MinC poderia ter um efeito político e administrativo extremamente negativo por diversos motivos; politicamente, políticas culturais construídas e pactuadas nos últimos anos com a sociedade civil (via consultas públicas e processos coletivos) podem se perder; administrativamente, ao eliminar as áreas de planejamento, orçamento, execução financeira, pessoal, tecnologia industrial, contratos e licitações etc., perde-se uma das condições de base do antigo ministério. A cultura e o fazer cultural têm especificidades próprias, um know how do setor e do seu público, difíceis de serem absorvidas de imediato.

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Desde 2015, o Ministério da Cultura era o responsável pela supervisão de todo o sistema de gestão coletiva de direitos autorais, essencial para garantir os direitos dos autores e criadores brasileiros e o direito de acesso à cultura pelos cidadãos. Quanto tempo levará para sensibilizar o MEC, que tem sua própria demanda, sobre a questão dos direitos autorais, e depois quanto esforço será gasto para que a Consultoria Jurídica (Conjur) do MEC entenda os meandros do direito autoral? O mesmo vale para todas as áreas do MinC, como a Secretaria de Fomento e Incentivo à Cultura (Sefic) e a Subsecretaria de Planejamento, Orçamento e Gestão (Spoa) do MinC, que formavam a estrutura gigantesca para analisar os projetos, as prestações de contas e os problemas da Rouanet.

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O MinC reúne, além do órgão principal, outras sete instituições vinculadas: Instituto do Patrimônio Histórico de Artístico Nacional (Iphan), Agência Nacional do Cinema (Ancine), Fundação Nacional de Artes (Funarte), Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), Fundação Biblioteca Nacional (FBN), Fundação Cultural Palmares (FCP), Fundação Casa de Rui Barbosa (FCRB). No caso da vinculação ao MEC, essas instituições terão que se relacionar com uma estrutura que tem outras prioridades, o que poderá prejudicar as negociações da cultura com áreas centrais do governo e demandas externas.

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Outro problema: o MinC tem responsabilidade sobre áreas que incluem atividades de fiscalização e regulação, além da guarda e manutenção de patrimônio cultural, que exigem a manutenção de estruturas administrativas próprias, para cumprir responsabilidades legais e constitucionais: patrimônio cultural (Iphan), direito autoral (Diretoria de Direitos Intelectuais, que Caetano Veloso disse ser um think tank do Estado brasileiro), museus (Ibram), acervo bibliográfico (Biblioteca Nacional), entre outros.

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Desde 2003, o MinC passou a abranger iniciativas culturais que sempre existiram, mas que estavam à margem das políticas de Estado. O melhor exemplo deste esforço foi o investimento nos Pontos de Cultura, e todo o programa Cultura Viva, com o reconhecimento e fomento pelo Estado de iniciativas focadas em temas diversos, desde o jongo até a cultura digital. Em 2014, o programa foi transformado em uma política de Estado, com a aprovação da Lei Cultura Viva (Lei 13.018/2014). Em 2015-2016, o MinC implantou uma série de aprimoramentos para que o programa não se baseie só em recursos, mas funcione como uma plataforma de articulação para o setor cultural. Quem vai monitorar essas ações e tocar adiante?

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O MinC tinha como incumbência republicana ações importantes de fortalecimento das políticas de Estado, tais como: adoção de programas (como o Cultura Viva); atualização de políticas públicas voltadas para as artes (música, teatro, literatura, dança, artes visuais e circo), com a Política Nacional das Artes; aprimoramento do sistema de financiamento da cultura, com a revisão dos atuais mecanismos de fomento e ampliação do programa Vale Cultura; investimento em políticas de desenvolvimento da economia da cultura, a fim de aumentar a participação da cultura no PIB e ampliar os agentes econômicos com atuação no setor. Mas também, entre as atribuições, aprofundar a transversalidade da cultura no Executivo, garantindo ações conjuntas com outros ministérios, como Comunicações, Ciência e Tecnologia, Meio Ambiente, Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Turismo e outros. Uma secretaria perde um pouco esse poder de diálogo transversal.

* Publicado originalmente em El Pájaro que Come Piedra

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