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Participei da festa de inauguração do mais novo teatro de João Pessoa (PB), o Pedra do Reino, um belíssimo teatro que já é um dos maiores do país, com capacidade para cerca de 3.000 pessoas. Sabe-se lá por qual erro da equipe de gestão cultural, a festa de inauguração começou com a apresentação de um espetáculo de dança de um grupo de Goiás, cuja trilha sonora era composta integralmente por cantoras da chamada nova MPB, com destaque para Mallu Magalhães e Tulipa Ruiz.

Saí de lá bastante incomodado, me perguntando em que momento o que era considerado programa infantil de baixa qualidade (Smurfs, Ursinhos Carinhosos) se tornou não necessariamente o padrão de consumo cultural, porque isso já faz um bom tempo, mas um ideal deliberadamente almejado por quem, entre outras coisas, defende o direito dos animais, o amor livre e o empoderamento feminino. Ou seja, o famoso (e perigosíssimo) cidadão bem pensante.

O espetáculo foi para mim bastante angustiante e me fez aguardar ansiosamente pelo início do show da Zélia Duncan, de quem não sou propriamente fã, mas que em comparação ao que se sucedia no palco parecia dotada de inequívoca e autêntica genialidade. A sensação foi bastante próxima da que senti na época das eleições para presidente, quando me peguei torcendo pela Dilma só pra garantir que o Aécio não tivesse chances. Diante da farsa armada pela “festa” democrática, todas as escolhas soam falsas e caricatas, como escolher o tipo de chicote e o tamanho do braço do torturador que vai te açoitar.

Enfim, considerei o espetáculo bem ruim e algo deprimente – nem falo da dança em si, mas do som que eles decidiram interpretar – o que me inspirou a escrever um texto em clima adorniano de fim de mundo. 

 ***

Em uma série de palestras sobre a canção e seu suposto “fim”, José Miguel Wisnik definiu a estrutura de certa música atual como sendo um tipo de “canção expandida”, que tem como exemplos paradigmáticos os trabalhos dos grupos RadioheadLos Hermanos. Segundo o crítico, a característica principal desse modelo de canção é não possuir um “centro” identificável, um núcleo que estruture as diversas camadas de significação, configurando-se quase como canções desestruturadas que se organizam ao redor de impulsos que se multiplicam e sobrepõem, numa espécie de transposição cancional da lógica da música eletrônica.

Creio que no caso do Radiohead é mais simples reconhecer essa “expansão”, ou “inorganicidade” constitutiva – a sobreposição de elementos soltos indeterminados -, cujo sentido é levar o ouvinte a acompanhar os diversos impulsos, muito mais do que organizar uma forma consistente e organicamente articulada. Os elementos da canção ficam meio que à deriva, gerando certa sensação de gratuidade, que pode ou não assumir um sentido mais amplo – no caso do Radiohead, creio que em muitos casos eles usam essa forma expandida e inorgânica para representar uma visão sombria da vacuidade da vida contemporânea, de grande força estética.

À primeira vista, segue Wisnik, a opção por temas suaves, vozes em tessitura média ou baixa, um tipo clean de arranjo musical etc. aproximaria essa produção mais indie do modelo de canção proposto pela bossa nova, o grande marco paradigmático da MPB “clássica”. Entretanto, pode-se dizer que estamos aqui diante do exato oposto da proposta estética de João Gilberto, na medida em que nessa canção expandida os elementos ficam “soltos”, flanando sem encontrar um centro unificador de sentido.

Na dicção de João Gilberto, todos os elementos diminuem de intensidade porque é o próprio sistema de organização do todo que deve brilhar, um forte núcleo organizador que diminui a intensidade das partes para fazer brilhar o conjunto em toda sua intensidade. Já nesse modelo de “canção expandida”, as partes são hipostasiadas e sua suavidade decorre de um processo mais geral de indiferenciação, como se o sujeito não tivesse forças para organizar um núcleo que sustente as diversas informações dispostas ao longo da canção.

Diga-se de passagem, esse é um conflito bastante caro a uma geração que tem acesso a todo tipo de material sonoro via internet sem, contudo, ter acesso a nenhuma das experiências que tornaram possível aquela matéria. Uma relação virtualizada com a experiência corresponde a um sujeito que “sabe” de tudo, mas não domina nada.

É preciso salientar, entretanto, que esse dado (esse sujeito “frágil” que se apresenta na canção expandida) por si só não é bom nem ruim, mas algo como um “espírito de época”, ligado às novas condições dos sujeitos posicionarem-se no mundo, e com as quais a arte tem que se haver, com o risco de recair no puramente ideológico. Em linhas gerais, e sem aprofundar muito, podemos dizer que na canção a emergência desse “sujeito frágil” está diretamente relacionada ao fim da indústria fonográfica, pelo menos tal como constituída até os anos 1990. É nesse momento que desaparece de cena aquele ultra-sujeito quase monstruoso que tudo pode (Michael Jackson é um bom exemplo da capacidade de articulação dos diversos campos dessa indústria) para dar lugar a esse outro que mal sustenta seu próprio peso, o ser chafurdado no vazio de sua existência.

***

Diante desse diagnóstico de fragilização perfeitamente expresso pelo modelo de “canções expandidas”, são diversas as atitudes e posicionamentos que a arte pode assumir. Em seus bons momentos, a autoconsciência dessa inconsistência fundamental pode fornecer as bases para construção de obras de grande relevância estética. Um grupo como o Radiohead, como vimos, usa essa “ausência” de substância musical como meio a partir do qual constrói uma imagem sombria da vacuidade da existência contemporânea.

No caso brasileiro, a Filarmônica de Passárgada trata essa ausência de centro gravitacional das canções com distanciamento irônico, assumindo e expondo a fragilidade como condição inescapável da arte contemporânea, enquanto Romulo Fróes reflete sobre as dificuldades de sustentação de um anti-objeto musical, que é a própria condição do ser na capital paulistana. Juçara Marçal radicaliza as experiências do Metá Metá em seu trabalho solo (Encarnado), criando um dos discos mais interessantes dos últimos tempos, em que todos os elementos da canção lutam entre si para criar uma consistente e perturbadora desarmonia que sustenta um conjunto complexo de reflexões sobre a morte. Note-se que todos esses exemplos lidam de alguma maneira com as contradições do seu tempo, oferecendo respostas diversas e potentes ao atual estado de coisas, mostrando ser perfeitamente possível produzir obras de qualidade nos dias de hoje.

Nos piores casos, entretanto, como é o caso da MPB neo-indie, a atitude principal parece ser a de um gozo perverso tirado do vazio, que nesse caso pode ser qualificado em suas dimensões de classe. Uma auto-satisfação perversa com a nulidade, um prazer sádico em fazer uma música irrelevante. Nos gêneros mais comerciais da cultura de massas, como os pagodes ruins dos anos 1990 ou o pop de baixa qualidade dos anos 1980 (é preciso dizer que existem pagodes bons e pop de grande qualidade?), a irrelevância era um “efeito colateral”, por assim dizer, do compromisso dos artistas com os valores da cultura de massas. No caso desses artistas indies da “nova” MPB – classificação por sua vez também problemática em termos de conteúdo – a irrelevância é deliberadamente defendida como o ideal da música, não como crítica, mas como espaço de auto-satisfação.

Fazer musiquinhas irrelevantes pelo simples prazer que se sente ao acordar (“eu tenho acordado cedo e me sinto ótima”): afinal, qual o grande problema disso? E digamos de uma vez, da maneira mais clara possível: a rigor, nenhum. A arte vive também do prazer hedonista, do desejo de ser e estar no mundo, pura e simplesmente. Cantar e cantar e cantar. O problemático, como sempre, é o sentido mais amplo desse gozo que, a despeito do que se diga, não se dá no vazio. O que esse tipo de canção, que criou um nicho específico, diz a respeito de certo estado de ser das coisas. Afinal, o que torna possível que esse estado de coisas seja, para ela, objeto de satisfação hedonista, e para outros, a imagem do horror, do tédio, do descentramento, etc? O que torna possível seu gozo?

Nas primeiras audições, a impressão que essas canções transmitem é de que tudo vai bem, pois ainda que os sujeitos se sintam “deslocados” e estranhos no mundo, tudo não passa de uma questão de mais amor, por favor. Palavra de ordem que se por si só não é necessariamente ideológica (vide o papa Francisco, para quem falta de amor e capitalismo são sinônimos), nesse caso marca a garantia de privilégios óbvios: para quem toma porrada da polícia, o que não é o caso dessa galera indie que não perturba a ordem em nenhuma instância, pedir mais amor soa ridículo na melhor das hipóteses, quando não conivente, pois o que se pode precisar no caso é de mais armas ou, pelo menos, de mais pernas para correr. Pior que isso, é possível reconhecer relações de complementariedade entre esse modelo fofo de ser e nossa barbárie cotidiana.

Em uma dessas intervenções de mais amor em São Paulo, um coletivo realizou um movimento de “ocupação” de uma praça do centro, com shows de bandas “alternativas”, oficinas de malabares, feira orgânica etc. Novamente, o gesto não é problemático em si, mas, como um determinado significado ideológico nunca se realiza no vazio, pode-se dizer que o principal problema dessa proposta de “ocupação” é o pressuposto de que a praça estava “desocupada” antes. Não por acaso, no dia da tal ocupação não era possível encontrar nenhum dos seus habitantes “tradicionais”: moradores de rua, usuários de crack, prostitutas etc. A ocupação com amor implica em uma desocupação que é lida como saldo positivo, repondo à barbárie à qual procurou se opor ao realizar, com amor, o gesto de desocupação violenta proposto pela gestão do governo do estado.

Mas acredito que o verdadeiro conteúdo ideológico dessa turminha neo-indie não está na afirmação de que tudo vai bem e somos felizes neste contexto atual de desagregação. Antes, ele está na busca deliberada da irrelevância como verdadeira marca de privilégio e distinção, a sensação de que as coisas não estão nada bem, mas tudo bem mesmo assim. Essa é a verdadeira perversidade: não se trata de sujeitos incapazes de reconhecer que o mundo está desmoronando a seu redor – o fracasso e a derrota do sujeito é muitas vezes o tema dessas canções – mas, por terem a possibilidade de assistir tudo de um lugar seguro, decidem “continuar tocando”, como aqueles músicos do Titanic que seguiram em seu trabalho enquanto o barco afundava.

(Existe dignidade nesse gesto? No caso da morte inevitável do Titanic é inegável que existe dignidade na escolha deliberada de como morrer – a dignidade daqueles que dirigem seu próprio destino sabendo que esse não mais lhes pertence, mesmo que essa escolha seja algo rebaixado como “seguir trabalhando”: a dignidade está na escolha, e não na tarefa escolhida. Mas no caso do mundo contemporâneo em que se inscreve o neo-indie-MPB, apenas ideologicamente se pode afirmar que estamos no caminho da morte certa, pois ela é perfeitamente evitável caso mudemos os rumos dos acontecimentos no planeta. Nesse caso, “seguir tocando” pode ser apenas mais um gesto banal de adequação).

No limite, a proposta ideológica desses grupos é tratar o terror que vivemos como um dado inevitável que é preciso aceitar, para o bem de todos. O que acontece nesse caso, portanto, é o oposto da dignidade diante do destino irrevogável: defrontando-se com o caos e a barbárie, o artista se recolhe covardemente em sua própria irrelevância, para então tratar isso como um gesto de coragem, um sujeito ousado que canta o amor onde só existe ódio etc.

Podemos dizer que o núcleo problemático dessa forma consiste em seu grau de adequação e realização da barbárie, ali mesmo onde se apresenta sua face mais descompromissada. Digamos que se trata de algo pior do que simplesmente afirmar que as coisas estão cor-de-rosa, e que vai tudo bem (a alienação em seu sentido “clássico”): trata-se de afirmar que aquilo que é reconhecidamente o mais profundo terror é, na verdade, cor de rosa. Tudo o que precisamos para encontrar a felicidade é de mais cores.

É importante ressaltar que a questão aqui não é a falta de engajamento, ou de conteúdo diretamente crítico dessas obras. O lirismo desvairado muitas vezes é mais progressista que uma militência chapada. Para voltar outra vez ao exemplo clássico da bossa nova, o que esse movimento realizou foi precisamente um processo de desemantização dos conteúdos das letras (Luiz Tatit), trazendo ao primeiro plano as relações harmônicas e melódicas que podiam então ser tratadas em conjunto pelo artista. E esse gesto de desengajamento tornou possível uma das mais radicais transformações na história da música brasileira.

Contudo, esse movimento em nada tem a ver com uma busca pela irrelevância como padrão estético. Ao contrário, seu objetivo é tornar todos os aspectos da canção igualmente relevantes de modo que, ao final do processo, o movimento acaba por dizer algo de fundamental sobre o mundo. A MPB neo-indie também diz algo sobre o mundo: conforme-se, pois é melhor assim (pelo menos para alguns).

Nesse ponto, tais artistas acabam por se parecer muito com uma figura com a qual eles pouco se identificam: Romero Britto. Com uma diferença importante, pois Romero Britto não se incomoda nem um pouco em se assumir como perfeitamente integrado a um sistema ao qual é dever do artista colorir, ao passo que a MPB neo-indie realiza essa adequação conformista por meio da imagem do deslocamento, do  alternativo, do sujeito que não se integra etc.

Evidentemente que tal postura – a busca deliberada por uma posição de insignificância tratada como esclarecimento bem intencionado e fofo – não se deve meramente a um posicionamento existencial, mas é também uma tomada de posição dentro de um mercado cada dia mais incerto. Para ficar no caso brasileiro, digamos que a linha estética que nos acostumamos a classificar como MPB, ligada ao movimento que fez artistas e intelectuais de classe média aproximar os valores da alta cultura com a canção popular, desde o início foi dependente dos altos-investimentos da indústria fonográfica, tanto em termos de produção (a produção dos discos de artistas de MPB sempre foi mais “cuidadosa” e cara do que dos cancionista ligados à música romântica e brega, com exceções óbvias, como Roberto Carlos) quanto em estratégias de divulgação e distribuição. Esses artistas sempre foram produtos mais caros que, como tal, dependiam de altos investimentos de mercado para manter sua integridade artística. Com o fim desse vínculo umbilical, provavelmente por falência múltipla de órgãos, diversas estratégias foram adotadas.

As periferias, por exemplo, tentaram forjar novos vínculos comunitários que sustentassem movimentos estéticos originais, menos verticalizados, em que enfim pudessem produzir e se reconhecer. Ao passo que o neo-indie optou deliberadamente por reduzir sua produção ao modelo de canção de elevador. Uma música com espírito de agregado, como o paradigmático José Dias, de Dom Casmurro, que não desagrada ninguém, não faz escolhas. Compositores que são a favor da natureza, a favor da vida, das mulheres, dos gays, do livre mercado, das escolhas individuais, desde que defendidas pelas pessoas certas, e nos momentos adequados. Compositoras que defendem o empoderamento feminino e criticam a gordofobia dos machos cisgênero, enquanto expõem, orgulhosas (sem nunca ter pegado um cara gordo) o seu namorado branco, forte, bonito e cult. Desprovida de tensão, comprometida com alguns.

Dito isso, creio que não está rigorosamente correto julgar essas músicas em termos de alienação, pois elas estão no geral bem antenadas com tudo que acontece, e a alienação no sentido marxista clássico diz respeito a uma espécie de desconhecimento essencial. Aqui funciona a variação fetichista da ideologia, tal como definida por Slavoj Žižek: não o clássico “eles não sabem o que fazem”, mas o “eles bem o sabem, mas fazem mesmo assim”. 

A irrelevância é uma opção estética, a escolha por não escolher, o desejo deliberado de ser música de elevador. Sem o apadrinhamento direto do grande capital, que garantia sua produção e a difusão, essa nova geração indie-MPB escolhe a irrelevância para única e exclusivamente continuar tocando, sem desagradar a ninguém, como esses programas infantis que toleramos porque são coloridos.

***

Talvez o exemplo recente mais acabado desse tipo de música que deliberadamente busca a irrelevância seja a Banda do Mar (“eu tenho acordado cedo e me sinto ótima” – postagem inútil de facebook celebrada enquanto letra de canção), espécie de John e Yoko com mais ursinhos de pelúcia. Aliás, se é verdade que esse tipo de som pode ser classificado como uma busca deliberada pela irrelevância, é preciso reconhecer que os próprios artistas têm consciência daquilo que fazem. É por isso a imagem do “mar” se aplica bem nesse caso. Não se trata evidentemente do mesmo mar de Caymmi, em que a ideia de fluxo da transitoriedade contém centelhas de vida e morte que portam o mistério da existência em experiências simples e cotidianas de pescadores no litoral baiano. Mas sim da imagem mais clichê do sujeito no mar a navegar indefinidamente sem encontrar pouso, tirando toda satisfação possível desse estado de deriva. Espécie de Aventuras de Pi sem o detalhe fundamental da presença mortal do Tigre, o que poderia ser a imagem do tédio absoluto – como por vezes acontece no Radiohead –, mas que aqui se torna a mais perfeita imagem de auto-satisfação narcísica.

Aliás, creio que outra imagem cinematográfica pertinente aqui é a dos humanos em Wall-E: aquele estado vegetativo de absoluta futilidade (e que para exisitr depende diretamente do trabalho de robos sub-remunerados) é o que a Banda do Mar nos vende como ideal de existência feliz.

Um belo exemplo desse não-estado de coisas é essa letra da Clarice Falcão, artista que capta bem esse espírito de irrelevância, mas acrescentando toques (suaves) de distanciamento irônico que funcionam menos como elemento de força estética e mais como um alerta – o que já é interessante. Pois é essa posição do eu-lírico da canção que esse nicho da produção musical contemporânea pretende ocupar enquanto posição ideal. Uma música que aceita ser qualquer coisa pra não desagradar ao sinhozinho mais perverso que existe: o público fiel. Trilha sonora da integração conformista, vendida como alternativa a outros padrões também conformistas, como o sertanejo universitário, que são interpretados como opostos, mas representam diferentes formas de se integrar a um mesmo universo em desintegração.

“Qualquer Negócio” (Clarice Falcão)

Me deixa ser

Quem faz o laço

Da gravata

Do mordomo

Que te serve o jantar

Me deixa ser

O suporte que segura

A tela plana

Da sua sala

No lugar

Me deixa usar

O pé pra equilibrar

Aquela mesa bamba

Que você aposentou

Há mais de um mês

Me deixa ser

A sua estátua

De jardim,

O seu cabide de casacos,

Só não me tira de vez

Da sua casa

Eu posso ser a empregada

Da empregada

Da empregada

Da empregada

Do seu tio.

PS: Mas pra assinalar que nem tudo está perdido, compartilho este clipe da Banda do Mar. Tudo nele confirma o que se disse: a irrelevância da letra, a pouca criatividade de arranjos, o clima de felicidade fake na dancinha sem graça dos integrantes do grupo. Poderia ser um comercial de margarina qualquer, não fosse pelo detalhe do passinho do romano construído pelo funkeiro, o único momento de verdadeira preocupação com alguma construção estética efetiva. Por isso muitos dos fãs não entenderam a presença do passinho no clipe: em um contexto em que tudo tende pra irrelevância, os momentos que apresentam algum senso de preocupação estética causam, de fato, estranhamento.

(Este texto foi publicado originalmente no site Chic Pop. O autor, Acauam Oliveira, nasceu no Rio de Janeiro, foi criado no interior de São Paulo, se formou na capital paulista e atualmente vive na Paraíba. É, em suas próprias palavras, um preto de 34 anos que defendeu o doutorado sobre música popular na faculdade de Letras da USP, pagodeiro, são-paulino e sofredor.)

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19 COMENTÁRIOS

  1. Textão dahora, daqueles que a música é o fio condutor pra explicar comportamento. Pouco acompanho a neo-indie-MBP, mas interessante que a última música dessa turma que me pegou foi da banda Biltre, que queria ser tipo Radiohead, banda que amei e que é referenciada várias vezes no texto.

    https://youtu.be/X_ZtJYhMUCw

  2. Mais um texto do tipo: ”Música TEM QUE…” ”A arte TEM QUE…” Música não ”TEM QUE..” nada, liberdade! Cada um produz o que quiser e como quiser, se não te agrada não ouça! Mas não se pode querer dizer o que a música tem que ser ou fazer ou como deve ser feita! Pra mim, essa música da Juçara não passa de um monte de ruído, mas tem quem goste (tipo você), por isso não acho que ela deva mudar, se tem público, que ela continue produzindo pra esse público. Ficar querendo dizer o que tem que ser produzido e como, afirmar o que é irrelevante ou relevante é papo chato de pseudo-intelectual…

    • Olá Elton.. concordo que a crítica não deve ser um conjunto chato de cagação de regra, e que a arte pode ser muita coisa. Mas a minha intenção com o texto não foi dizer o que a arte deve ou não fazer ou deixar de fazer, mas avaliar alguns sentidos do que essa arte neo-indie efetivamente faz. Os sentidos estão ai pra ser curtidos, mas também debatidos. Abraços!

  3. Achei o texto extremamente chato. Pesado e cheio de imposições.
    PS: não tem nenhum passinho do romano nesse clipe da Banda do Mar. O passinho do romano está presente em outro clipe, que é construído todo com base nessa ”dança”, movimento que todos entendemos muito bem.
    Pedante, no mínimo.

  4. EDUARDO NUNOMURA .
    Concordo com você , meu Comentario foi extenso .
    Explicarei os motivos .
    Você e inteligente e vai entende-los.
    Analise , a Materia foi extensa e o Autor comentou e criticou varios assuntos , cantores , musicos , musicas, politica e a querida Paraiba.
    Você deve saber que, muitos leitores podiam não entender, ou não saber interpretar , ter duvidas .
    Você deve saber que , milhões de brasileiros tem um baixo Q.I. , são desinformados e desatualizados na politica, nos politicos e na Cultura Geral.
    Alem de uma pessima educação domedisca , pouca moral e pouco carater.
    EU não acredito que você consegue realizar um Comentario em DUAS linhas.
    Porem, como você e um ” Sabio ” brasileiro , pode ser que consiga.
    Sou brasileiro e conheço muito bem o povo , sei que e normal , e comum, e subdesenvolvimento politicoe cultural , e BRASIL.
    Agradeço a Deus , por residir , com minha familia, na California, U.S.A.., ha mais de 10 anos.
    BRASIL, ame-o ou deixe-o .
    EU e minha familia preferimos deixa-lo.
    BRASIL, nunca mais , salvo se Deus determinar.
    Tenho vergonha de ser brasileiro.
    Sou patriota, mas não sou idiota.
    Bye, bye, BRAZIL.
    Good luck.
    Hug.

  5. A estética dessa música Neo Indie MPB atual, salvando algumas exceções, lembra em muito os pecados da Jovem Guarda nas idas décadas de 60-70, marcadas por uma canhestra ditadura empresarial militar. Lá como cá, o pecado é o descompromisso exposto nas letras, a falta de uma chamada à reflexão, quando todas as forças que sufocam o ser humano, sejam elas contingências políticas ou do mercado, forçam por uma tomada de consciência, por uma chamada ao questionamento. Pessoalmente, eu me identifico como indie, mas abomino algumas músicas sem conteúdo que têm sido lançadas sob esse rótulo recentemente. O artista não pode se considerar abstraído de um contexto, nem pode se furtar de cumprir o seu dever de catalisador dos anseios de mudança do povo. Não existe isso de não se posicionar sobre a barbárie, e o reconhecimento irônico do vazio existencial causado pelo fascismo do capital só tem validade se servir de um ponto de partida para um movimento de contra-ataque. O texto está irretocável.

    • Para fazer um contra ponto ao nada pelo nada da banda do mar e assemelhadas, precisamos de uma arte de protesto, uma arte que não seja panfletária, mas por meio de construções imagéticas sutis (e outras nem tanto), ensejar a uma reflexão crítica a respeito da sociedade. Precisamos de uma nova tropicália, de uma nova arte de protesto, de um resgate da cultura brasileira por meio de uma roupagem mais moderna. Ainda bem que existem o Russo Passapusso, o grupo Metá Metá com a Juçara Marçal, etc.

  6. Nossa, é exatamanete esse o meu incômodo com toda essa onda. As “pequenas coisas” se tornaram um fetiche horroroso e além de todas as considerações que podem ser feitas, é uma repetição alucinada. Devem existir umas 15 cantoras como a Tulipa Ruiz.

    Olha, bom texto.

  7. Grande texto! concordo com quem falou que se perece com uma Espécie de Jovem Guarda do século 21 eles cantam sobre “tomar sorvete com o broto” como a Jovem Guarda dos anos 60 . Esta Indie MPB canta o irrelevante com ar de culto. Além disto para mim parecem muito mais Folk Americano do que MPB. São apenas “canções de apartamento” como aquele CÍCERO.
    Alguém aí falou que existem umas 15 Tulipas Ruiz concordo são todas iguais; chatíssimas e irrelevantes.
    Esta Indie MPB não tem inovação nenhuma nem nas letras nem nos arranjos.
    MPB para mim só a dos anos 60 e 70.

  8. The Beatles? Alguém já ouviu falar? Na perspectiva que o texto apresenta, mereciam ser citados. Aposto que deve ter uma “pá” de gente que critica a nova MPB, usando os mesmos argumentos do texto, mas adoram ouvir Beatles, afinal, falar, compreender e cantar em inglês é LEGAL, CHIQUE, e me diferencia da ralé brasileira. Alguém comentou que estamos precisando de um novo Tropicalismo. Verdade! O movimento manguebeat, na minha leitura, porca e mal acabada, diga-se por sinal, atende as minhas expectativas quando sinto falta de algo tropicalista. Os cara buscaram elementos da cultura local, o que havia de mais importante na cultura de um povo “fudido”, afinal, Recife na época era considerada a 4º pior cidade do mundo para se viver, e injetaram cultura nas veias dos mangues. Ahhhhhhhhhh sim!!! Isso é engajamento. Sobre o texto, trata-se de uma leitura, muito perspicaz, mas passível de questionamento. E isso é legal, leio um texto desse, concordo em parte com o autor, e continuo ouvindo as músicas que fazem com que o sistema capitalista continue colorido rs. Daí uns dias entro em parafuso e critico todos os artistas que não usam a sua arte como forma de denunciar a opressão do capital. Depois o ódio passa … depois volta … passa … volta …

  9. Gosto do texto, inteligência, cultura e conhecimento da cena musical tem, sim, relevância em qualquer comentário sobre música. Não se trata de opor “alta” e “baixa” cultura, nem de querer “tirar a liberdade” artística, mas sim de ponderar se certos extratos da produção musical tem mesmo essa relevância que lhes é atribuída. E nisso, não me venham os “libertários” de plantão aqui querer sustentar que o mercado (musical) se auto-regula, pois desde os mesmos anos 1960 o esquema do jabá e os “acordos” entre gravadoras, programadores de rádio, os tantos programas de tv com música (a maioria com os artistas “cantando” em cima de um playback, sem músicos no palco, nada, só a gororoba que alguém insiste em defender com a lógica rasa de “cada um faz o que quer”, “se tiver seu público…”), sempre fizeram a lógica da grana prevalecer sobre o talento e o compromisso. E assim, os artistas com esse perfil comprometido, com seu tempo, seu lugar, mas também com a música como arte e como construto da humanidade, ficam, e não só no caso brasileiro, sub-expostos enquanto essa cançãozinha morna vai se alastrando – ainda que com menor peso do que pretendem os seus artífices – como padrão e baliza do “moderno”. A despeito do que disse o cidadão da Califórnia acima poder, de fato, soar preconceituoso, como quem cuspe no prato mal lambido, há tempos que o que se diz no exterior sobre a música brasileira não é motivo de orgulho, sim de frustração. Depois da Bossa Nova e da melhor safra da MPB o que lá chega não mais nos representa em essência e diversidade. Embora pareça que não mais, ainda há fronteiras territoriais, traços étnicos, peculiaridades culturais, riqueza, mas não é essa cançãozinha monocórdica não.

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