Ecad: à sombra, todos os gatos são pardos?

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É uma grande barafunda, difícil de decifrar – e a obscuridade em torno do funcionamento do Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição) favorece, única e exclusivamente, a permanência da obscuridade.

Faltam forças a FAROFAFÁ para desvendar tanta trama diligentemente ocultada, mas é bom e positivo, paratodos (exceto os que preferem trabalhar na sombra), entender como gira a engrenagem de parceria público-privada em que “nós” pagamos e “eles” recebem.

Centralizador e unificador, o Ecad é centralizado e unificado (entendeu?, nem nós) por sociedades administradoras do dinheiro que devemos aos compositores pela música que está no ar. São várias sociedades. Poucas delas têm direito a voto nas assembleias fechadas do Ecad. Uma democracia feita de pequenas ditaduras, e/ou vice-versa.

Sem forças para entender da missa um terço, elaboramos aqui um glossário de gente influente da MPB que integra as diretorias das associações que integram (e/ou são integradas pel)o monolito sem rosto público Ecad. Pensemos nesses nomes (e em muitos outros não tão aparentes) sempre que lermos por aí que o Ecad coloniza os interesses “públicos” do Ministério da Cultura, ou que quer nos cobrar taxas às vezes duplas ou triplas por música que toca em casamentos, aniversários, blogs ou canais do YouTube.

Abel Silva – Compositor fluminense, parceiro de Dominguinhos, Fagner, João Bosco (em “Desenho de Giz”, de 1987), Moraes Moreira (em “Festa do Interior”, gravada em 1981 por Gal Costa), Sueli Costa (em “Jura Secreta”, gravada em 1977 por Simone). É diretor-secretário da UBC (União Brasileira de Compositores).

Danilo Caymmi – Cantor e compositor carioca, filho de Dorival Caymmi, coautor de “Andança”, canção defendia por Beth Carvalho em festival de 1968. É integrante da diretoria da Abramus (Associação Brasileira de Música e Artes).

 

Fernando Brant – Compositor mineiro, principal parceiro de Milton Nascimento – com quem assinou clássicos do clube da esquina como “Travessia”, “Outubro” (1967), “Sentinela” (1969), “Aqui É o País do Futebol” (1970), “San Vicente” (1972), “Milagre dos Peixes” (1973), “Saudades dos Aviões da Panair (Conversando no Bar)”, “Ponta de Areia” (1975), “Raça” (1976), “Maria, Maria” (1978), “Canção da América”, “Povo da Raça Brasil” (1980), “Nos Bailes da Vida”, “Notícias do Brasil (Os Pássaros Trazem)” (1981), “Encontros e Despedidas” (1985). Com os irmãos mineiros Márcio Borges e Lô Borges, compôs “Para Lennon e McCartney” (1970), o maior manifesto de amor pelo Brasil contra a dominação norte-americana gravado por Milton. É diretor-presidente da UBC, um posto que não se sabe se fica além ou aquém do poderio do diretor-superintendente da associação, José Antonio Perdomo.

José Antonio Perdomo – contador, representa a empresa Edições Musicais Tapajós/ EMI Songs do Brasil Edições Musicais junto à UBC, onde é diretor-superintendente. É tido como a maior eminência parda do Ecad. A inglesa EMI administra, por exemplo, obras dos Beatles e de Roberto Carlos.

Luciana Rabello – Compositora e cavaquinista fluminense, é irmã de Raphael Rabello e João Bosco Rabello (empresário de Paulinho da Viola, jornalista e diretor da sucursal brasiliense do jornal O Estado de São Paulo), esposa do compositor Paulo César Pinheiro. Criou, com Maurício Carrilho, a gravadora carioca Acari Records, responsável pelo lançamento de discos de Dori Caymmi e de integrantes das famílias Rabello e Carrilho. É diretora da Amar-Sombrás (Associação de Músicos Arranjadores e Regentes-Sociedade Musical Brasileira).

Joelma – Cantora e compositora de jovem guarda nos anos 1960, é identificada como diretora de controle de arrecadação e distribuição no site da Socinpro (Sociedade Brasileira de Administração e Proteção dos Direitos Intelectuais), não atualizado há anos.

Luiz Vieira – Compositor, cantor e radialista pernambucano, é autor de clássicos do cancioneiro nacional como “Menino de Braçanã” (1953), “Na Asa do Vento” (1956) e “Prelúdio para Ninar Gente Grande (Menino Passarinho)” (1962). Aparece como presidente da Socinpro em texto de 2007 do site aparentemente abandonado.

Marcus Vinícius de Andrade – Maestro e diretor artístico da gravadora paulistana CPC-Umes (ligada à União Municipal dos Estudantes Secundaristas de São Paulo), responsável pelo lançamento de discos da agora ministra Ana de Hollanda e de Nei Lopes. É presidente da Amar-Sombrás.

Maurício Carrilho – Filho do flautista Alvaro Carrilho, sobrinho do compositor e flautista Altamiro Carrilho, violonista, ex-integrante do grupo Os Carioquinhas com Luciana e Raphael Rabello, arranjador de trabalhos de Chico Buarque, Elizeth Cardoso, Francis Hime, Joyce, Miúcha, Nara Leão e Paulinho da Viola. Cofundador da gravadora Acari Records e diretor da Amar-Sombrás.

Nei Lopes – Escritor de livros de referência sobre a condição negra no Brasil e parceiro de Wilson Moreira em sambas de referência como “Coisa da Antiga” (gravado por Clara Nunes em 1977), “Coité, Cuia””(Roberto Ribeiro, 1977), “Goiabada Cascão” (Beth Carvalho, 1978), “Gostoso Veneno” (Alcione, 1979) e “Senhora Liberdade” (Zezé Motta, 1979). Diretor-secretário da Amar-Sombrás.

Paulo César Pinheiro – Parceiro de Baden Powell (“Lapinha”, 1968, “Aviso aos Navegantes”, 1971), Dori Caymmi (“Evangelho”, 1972, “Desenredo”, 1976, “Estrela da Terra”, 1980), Edu Lobo (“Vento Bravo”, 1973), João Donato (“Terremoto”, 1973), Tom Jobim (“Matita Perê”, 1973), Eduardo Gudin (“Maior É Deus”, “Mordaça”, 1974), João Nogueira (“Eu Hein, Rosa!”, 1974, “As Forças da Natureza”, 1977), Mauro Duarte (“Canto das Três Raças”, 1976, “Portela na Avenida”, 1981), Maurício Tapajós (“Tô Voltando”). Vice-presidente da Amar-Sombrás.

Paulo Rosa Jr. – Consta da lista da Abramus como integrante da diretoria. Homem de gravadora, Paulo Rosa é presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Discos (ABPD), que congrega as filiais brasileiras das grandes multinacionais do disco (EMI, Sony, Universal, Warner), mais a gravadora da Rede Globo (Som Livre). Não sabemos se Paulo Rosa e Paulo Rosa Jr. são a mesma pessoa, parentes ou nem uma coisa nem outra.

Ronaldo Bastos – Compositor fluminense, é responsável por clássicos do clube da esquina como “Cais”, “Cravo e Canela”, “Nada Será Como Antes” (1972) e  “Fé Cega, Faca Amolada” (1975), com Milton Nascimento, “O Trem Azul”, “Nuvem Cigana” (1972) e “A Via Láctea” (1979), com Lô Borges, e “A Página do Relâmpago Elétrico” (1977) e “Amor de Índio” (1978), com Beto Guedes. Assinou também sucessos para Lulu Santos (“Um Certo Alguém”, 1983) e Gal Costa (“Chuva de Prata”, 1985). É dono da gravadora Dubas e diretor de comunicação e assistência social da UBC.

Sandra de Sá – Cantora de soul, MPB, pop e rock, parceira de Cazuza, diretora-vogal (?) da UBC.

 

 

 

Silvio Cesar – Cantor e compositor de “Pra Você”, celebrizada por Roberto Carlos em gravação de 1970. Aparece no site da Socinpro, ora como diretor-geral, ora como presidente.

Walter Franco – Compositor experimental, dito “maldito”, de clássicos da MPB vanguardista-hermética como “Cabeça” (1972), “Me Deixe Mudo” (1973), “Muito Tudo”, “Feito Gente”, “Cachorro Babucho” (1975), “Respire Fundo”, “Coração Tranquilo” (1978), “Canalha” (1979), “Vela Aberta” (1980), “Serra do Luar” (1981). É vice-presidente da Abramus.

 

Wilson Moreira – Cantor e compositor de samba, parceiro de Nei Lopes. Pertence ao conselho fiscal da UBC.

 

 

 

À diferença das sociedades citadas acima, há aquelas em cujas diretorias constam apenas nomes não imediatamente reconhecíveis pelo público leigo. É o caso da Sbacem (Sociedade Brasileira de Autores, Compositores e Escritores de Música), com Denis Lobo (diretor-presidente), Yvonne Calabri Leite (diretora-tesoureira), José Orlando Ramos (diretor-secretário), Antonio Carlos Santana (diretor de distribuição) e Clailton Gil Miranda dos Santos (diretor-administrativo), e da Sicam (Sociedade Independente de Compositores e Autores Musicais), que identifica apenas um presidente chamado Chrysóstomo Pinheiro de Faria.

O site da Sicam expõe apenas, como supostos associados, Leandro LehartZezé di Camargo e Luciano. O da Sbacem é mais exuberante, com referências a Alexandre Pires, Caçulinha, Carlos Colla (autor de sucessos de Roberto Carlos), Cesar Menotti & FabianoFernando & Sorocaba, João Bosco & Vinicius, Jorge Mautner, Marcelo Crivella, Michel Teló, Padre Fábio de Melo, Padre ZezinhoPepeu Gomes e Sidney Magal.

Outros nomes de bastidor são o advogado Roberto Mello (presidente da Abramus), Jorge Kundert Ranevsky Waldemar Marchetti (diretores da Amar-Sombrás), Jorge Costa e Sylvio Silva (diretores da Socinpro), Aloysio Reis e Marisa Gandelman (diretores da UBC).

Por fim, um fato intrigante, para não dizer esquisito: todas as associações, sem exceção, dificultam (quando não bloqueiam) o acesso público a suas listas completas (ou mesmo parciais) de compositores associados. Se você precisar saber a qual sociedade arrecadadora estão filiados Ana de Hollanda, Arnaldo Antunes, Caetano Veloso, Chico Buarque, Chico César, Djavan, Gilberto Gil, Gutemberg Guarabyra,Jorge Ben Jor, Lobão, Lulu Santos, Marisa Monte, Rita Lee, Roberto Carlos, Zé Ramalho, Zeca Baleiro etc., tem de sair ligando de associação em associação para descobrir à base de tentativa e erro.

Apenas a título de pesquisa sobre a comunicabilidade da MPB via redes sociais, FAROFAFÁ saiu à busca de membros de diretorias ecadianas no Twitter. À exceção de Sandra de Sá (@sandradesa), não encontramos nenhum deles com contas ativas naquela rede de relacionamentos. Danilo Caymmi (@dcaymmi) possui perfil restrito àqueles que ele aceite como seguidores. Walter Franco (@walterfranco) não publica nada desde novembro de 2011. Wilson Moreira (@moreira_wilson) nunca tuitou.

 

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