eu conheci o escritor ricardo guilherme dicke em 2006, por intermédio de amigos de cuiabá.

recebi um livro que estava lançando, toada do esquecido & sinfonia eqüestre, e fiquei boquiaberto.

animado, consegui entrevistá-lo para o jornal.

ele morreu na quarta-feira, quase esquecido, na cuiabá que escolheu para ficar longe do eixão, das megalópoles arrogantes.

“as fodidas cidades onde impera o deus lucro e outros deuses irrelevantes” , disse.

ele definia toada do esquecido como uma ‘noveleta’, embora alguns achassem que era um conto.

tinha então 70 anos quando extraí dele algumas idéias sobre literatura.

foi claríssimo ao falar de suas ambições, e disse que não tinha pretensão de fazer literatura com um fundo filosófico:

“a época de albert camus e de jean-paul sartre acabou. creio que a filosofia
só serve mesmo é para filosofar”,

filósofo nascido na chapada dos guimarães, publicou pela primeira vez há quase 50 anos, mas era desconhecido para a maioria dos leitores e foi talvez um dos autores que mais me deu prazer descobrir recentemente.

só li um livro dele (dizem que o salário dos poetas é duca, mas não consegui um exemplar).

o primeiro texto de toada do esquecido, é habitado por personagens de cultura pop, como el diablo, cavaleiro, geppeto, a morte, zabud.

transitam por uma terra arrasada, a floresta brasileira queimada, todos na iminência de uma grande golpe ou de um grande abismo.

No segundo texto, sinfonia equëstre, dicke situa as antigas questões fundiárias, a disputa pela posse da terra, como conflitos medievais. personagens shakespereanos, kurosawianos, todos eles unidos por um único fio narrativo: a presença dos eqüinos.
um escritor de verdade, mas sem saco para os jogos bajulatórios do mercado editorial.

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Jotabê Medeiros, paraibano de Sumé, é repórter de jornalismo cultural desde 1986 e escritor, autor de Belchior - Apenas um Rapaz Latino-Americano (Todavia, 2017), Raul Seixas - Não diga que a canção está perdida (Todavia, 2019) e Roberto Carlos - Por isso essa voz tamanha (Todavia, 2021)

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