Em determinada altura de seu show online “Elixir de cauim”, Gero Camilo, ao saudar os músicos que o acompanham, comenta os tantos anos de estrada com os parceiros, “em que a gente vem fazendo [música] e eu me tornei músico profissional”. Ladeiam-no Rovilson Pascoal (direção musical, arranjos, violão, cavaquinho e guitarra) e Ricardo Prado (arranjos, contrabaixo, violão, piano, teclado e sanfona), este o proprietário do Canto da Coruja, aconchegante estúdio de paredes de tijolo cru em Piracaia/SP, onde o espetáculo foi gravado.
O comentário é curioso por que o cearense Gero Camilo, cantor e compositor talentoso, é mais conhecido como ator idem, vide atuações suas em filmes como “Bicho de sete cabeças” (2000), de Laiz Bodansky, “Carandiru” (2003), de Héctor Babenco, “Narradores de Javé” (2004), de Eliane Caffé, ou o hollywoodiano “Chamas da vingança” (2004), de Tony Scott, para citar apenas uns poucos.
Este lado que ele revela na temporada de “Elixir de cauim” é conhecido há pelo menos 20 anos por aqueles que se dispõem a mergulhar além da superfície do que o rádio toca, do que a tevê mostra, do que os críticos resenham. Gero Camilo é compositor gravado por nomes como seu parceiro Zé Modesto, Rubi, Kléber Albuquerque, Ana Leite, Ceumar, Otto e Luiz Caldas, para também citar apenas uns poucos.
A live é intimista, com Gero Camilo passeando pelo repertório dos dois discos que lançou – “Canções de invento” (2008) e “Megatamainho” (2014) –, além de inéditas. Ele traja uma camisa colorida em que o azul predomina, garantindo um ar intencional de nordestinidade, desde o cartaz, que evoca o designer Rogério Duarte e o Glauber Rocha de “Deus e o diabo na terra do sol” (1964), entre xotes e sambas, até o ar de tango da inédita “Iracema” (parceria com Luis Miranda), bela homenagem à sua terra natal.
A pandemia empurrou os artistas para formatos online, diante da impossibilidade de encontros presenciais com o público. O prolongamento indefinido das restrições impostas pela pandemia, fruto da pulsão de morte do governo de extrema-direita de Jair Bolsonaro, obriga a classe artística a persistir no formato, que garante algum alívio em meio a tantas mortes – enquanto escrevo este texto, fico sabendo da do soulman paraibano Cassiano, autor de hits como “Primavera”, “Coleção” e “A lua e eu”.
Como na peça “A procissão”, em “Elixir de cauim” – bebida alcoólica de origem indígena obtida a partir da fermentação da mandioca ou do milho – Gero Camilo mostra sua grandeza, a de um artista que merece ser ainda mais conhecido por tudo aquilo que faz.
Serviço: “Elixir de cauim” estreou hoje (7), no canal de Gero Camilo no youtube, e terá reprises dias 8, 9, 14, 15 e 16 de maio, sempre às 20h. Grátis.
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Assista a sessão de amanhã (8):
https://youtu.be/xMXbMLl5LhY