A cantora e compositora Tulipa Ruiz. Foto: Elsa Bouillot. Foto: divulgação
A cantora e compositora Tulipa Ruiz. Foto: Elsa Bouillot. Foto: divulgação

A cantora e compositora Tulipa Ruiz é um dos nomes do line up do Sampa Jazz Fest, cuja sexta edição acontece nesta sexta-feira (30), Dia Internacional do Jazz, às 19h, em modo online, com transmissões de shows pré-gravados no canal do festival no youtube.

Tulipa estará acompanhada do pianista acriano João Donato, com quem lançou, em 2019, o ep “Tulipa Donato”, inaugurando uma parceria que, por um lado ajuda a garantir frescor e vigor à produção de um dos inventores da bossa nova, do alto de seus 86 anos e que, por sua vez, traz “uma coisa antiga que moderniza as coisas atuais”, conforme declarou ontem ao Farofafá, sobre se unir a nomes de gerações mais novas.

No show do Sampa Jazz Fest, Tulipa e João Donato contarão com a participação especial de Doug Bone, trombonista do Bixiga 70 – o curador e diretor artístico do festival é Daniel Nogueira, saxofonista do grupo. Além da dupla, também se apresentam o bandolinista Hamilton de Holanda, homenageando Tom Jobim, e a saxofonista Sintia Piccin.

Tulipa Ruiz conversou com exclusividade com Farofafá.

ZEMA RIBEIRO – Tulipa, você é literalmente herdeira da vanguarda paulista, e artisticamente transita com desenvoltura em vários gêneros. O que você prepara para o Sampa Jazz Fest?
TULIPA RUIZ
– Meu pai [Luiz Chagas] é guitarrista e da banda Isca de Polícia, criada por Itamar Assumpção. Ele também é jornalista, crítico de arte, então eu tenho essas influências todas dele. Cresci em Minas, com minha mãe, que não é musicista, mas é musical, então também carrego em mim referências do Clube da Esquina, da Tropicália. Crescer ouvindo os discos dos meus pais impacta diretamente na música que faço e gosto de ouvir. O show do Sampa Jazz Fest será eu e minha banda, Pipoco das Galáxias, com o pianista atemporal João Donato e o trombonista Doug Bone. Não vejo minha banda há um ano e o último show que fizemos foi, justamente com João, no Rio de Janeiro. Estava em turnê com ele, pois lançamos um compacto juntos e é muito simbólico meu primeiro show com banda ser deste projeto, com todos os protocolos e Donato vacinado. Me faz ter esperanças que logo estaremos em bando e com banda tocando pelo mundo afora. Para este show, teremos, eu e Donato, nossos repertórios amalgamados e o trombone do Doug costurando tudo, com seus solos elegantérrimos.

Você está acompanhada por João Donato, um dos inventores da bossa nova, que tem o jazz em sua origem. Gostaria que você aprofundasse um pouco o que significa dividir disco, palco e uma fase da carreira com este monumento vivo da música brasileira?
A música do João é atemporal porque ele está sempre presente no agora, seja em 1951 ou 2021. Costumo dizer que ele não é mais velho que a gente e sim jovem há mais tempo. Quando li “Chega de saudade”, do Ruy Castro, fiquei impressionada com  a ligeireza de João, que aos 15 anos era sócio de fã-clubes musicais rivais, ou seja, já dialogava com a cena da época, independente dos gêneros. Na década de 1950 João já era moderno, já era vanguarda. Quando a bossa nova bombou, João já tinha tocado com orquestras latinas de jazz em Los Angeles, feito seu primeiro disco com produção do Tom Jobim, já tinha parceria com João Gilberto. Ou seja, João é um dos inventores da bossa nova, mas a sua bossa vai além da bossa nova. Nos anos 1970 tava ele lá fazendo música com os baianos. O “Cantar”, disco da Gal Costa de 1974, um dos meus prediletos da vida, é totalmente donatiano. João sempre presente no agora, seja na década de 1970 ou no século 21. Meu último show, antes de começar a pandemia, foi com ele. Meu primeiro show com banda, um ano depois, mas ainda dentro da pandemia, será com ele. Que grande privilégio termos João Donato como nosso contemporâneo.

Você e João Donato receberão Doug Bone, do Bixiga 70. É um timaço no palco. O que o público pode esperar?
Brilho no olho, coração na boca e muito amor. Admiro demais a música dos meninos (João e Doug) e sei que é recíproco. Então esse som será uma soma de pessoas que não se encontram há muito tempo e querem muito tocar juntas. Chega de saudade.

Como você tem lidado com o isolamento social imposto pela pandemia de covid19? E o que o fã-clube pode esperar para quando esse momento passar?
Gravo disco novo esse ano e nossos shows voltarão a acontecer quando nossas plateias estiverem protegidas e imunizadas. O momento pede consciência e cuidado. Tenho ressignificado tudo. Minha relação com as pessoas, com a política, com a natureza, com a matéria, com o espírito. Esse vírus é endereçado ao humano e isso é um sinal de que precisamos rever nossas práticas se quisermos seguir nesse planeta. A natureza está dando o recado. A pandemia para mim tem um prefácio, porque eu estava em turnê na China em janeiro de 2020, então vi o começo de tudo muito perto. Conseguir sair da China e voltar para casa parecia a coisa mais segura a se fazer, mas um ano depois vemos que é um dos piores lugares para se estar por conta deste governo genocida. A cadeia da música foi uma das primeiras a ser impactada. Os profissionais das artes, de uma hora para outra, ficaram sem emprego com as casas noturnas e teatros fechados. Já vínhamos de um histórico de ataques à  cultura por conta da polarização política, então quando a pandemia chegou já estávamos em estado de alerta e resistência. Uma das coisas que acalanta meu coração é que justamente nossa área, nosso ofício, tem segurado a cabeça de muita gente durante esse momento tão difícil. Quem não foi salvo por um filme, uma música ou um livro durante a pandemia? A arte tem sido uma grande companhia neste período. E é ela a melhor figura para contar essa história no futuro.

Serviço: Sampa Jazz Fest. Shows online de Hamilton de Holanda, Tulipa Ruiz e João Donato (feat. Doug Bone) e Sintia Piccin, 30 de abril (Dia Internacional do Jazz), às 19h, no canal do festival no youtube.
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