O governo de São Paulo ignorou solenemente o Conselho Estadual de Cultura e Economia Criativa na decisão de extinguir o Programa de Ação Cultural (ProAC). Os conselheiros só ficaram sabendo da suspensão do programa para o próximo triênio por intermédio da reportagem de Farofafá, ontem.
O conselho é, segundo o próprio governo, “responsável por debater, propor diretrizes para a política cultural e para os programas e ações da secretaria” de Cultura e Economia Criativa. Criado por João Dória, é vinculado diretamente ao governador do Estado e congrega 15 membros do poder público e 15 representantes do setor cultural e criativo da sociedade (é integrado por notáveis como Danilo Miranda, José Olympio Pereira, Marcelo Araújo, Nizan Guanaes, Heitor Martins, Fabio Barbosa, Ricardo Ohtake, Manuel Costa Pinto, Fernanda Feitosa, Eduardo Saron, Wilson Poit, entre outros). Tem mandato de um ano, renovável por mais dois anos.
O ProAC é uma espécie de Lei Rouanet de São Paulo e movimentou R$ 715 milhões entre 2013 e 2017, segundo a Fundação Getúlio Vargas, gerando 4 mil empregos.
Segundo especialistas em políticas culturais, o fim do programa deve impactar um amplo conjunto de projetos (incluindo planos anuais) que tinham há muito tempo o devido planejamento, após o estabelecimento de relação com empresas patrocinadoras (que, por sua vez, também tinham feito seus respectivos planejamentos). A decisão do governo, levada a cabo sorrateiramente na sexta-feira e em edição suplementar do Diário Oficial, parecia que estava tentando passar despercebida – contando com o momento de euforia pela confirmação da vacinação contra a Covid-19. Produtores e empresas foram mergulhados em mais incerteza num cenário já conturbado para a cultura. Muitos se movimentam para reverter a decisão, porque a queda do incentivo cultural via ICMS criava linhas de fomento com solidez, segurança jurídica e, principalmente, independência dos humores da administração pública, propícia à descontinuidade e ao arrivismo ideológico.
A extinção do ProAC também atinge projetos especiais voltados ao atendimento de instituições, que providenciam a democratização da cultura para diversas linguagens e segmentos. Isso sem contar o quadro geral orçamentário para o setor, instável e sujeito a reformulações a qualquer momento.
Embora as empresas tenham, de fato, perdido a capacidade de arrecadação do ICMS com o cenário de pandemia, o argumento do Estado, de que se trata da crise gerada pela pandemia, não parece razoável, já que o secretário de Cultura, Sergio Sá Leitão, promete manter a média de 100 milhões de investimento. De qualquer modo, troca uma política institucionalizada, sólida, por um cenário de promessa intermitente.
Uma produtora chamadou de “giro copernicano” o anúncio da suspensão dos editais de 2021, 2022 e 2023. Na sua avaliação, extinguir uma das principais modalidades de fomento à Cultura do Estado de SP, que funcionava via renúncia fiscal do ICMS, muda radicalmente a forma do patrocínio e fomento. Antes, a Comissão (CAP) simplesmente deveria habilitar os projetos, os quais deveriam buscar por sua conta, junto às empresas patrocinadoras em potencial, o apoio/investimento. Agora, um bureau será o encarregado disso. Mas o cargo do secretário que se dispõe a levar adiante essa política é, como todos os cargos públicos, sazonal, ele é réu por ações anteriores na Agência Nacional de Cinema (Ancine) e uma eventual condenação dele coloca tudo em suspenso, só que agora já com a política institucionalizada totalmente desfeita.