Foto Roberto Castro/MTur
Secretário de Cultura do governo Bolsonaro, Mario Frias

O governo Bolsonaro reuniu na tarde de ontem representantes de dois de seus ministérios para discutir o estímulo à produção de “novelas da família” por meio de sua Secretaria do Audiovisual. O encontro foi entre Mario Frias, secretário Especial de Cultura do Ministério do Turismo, e Marlice Umbelina Pinto, secretária Nacional da Família do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Participou da reunião o secretário do Audiovisual do governo, Hélio Ferraz.

Não foi divulgado qual o conceito de “novelas da família” que o governo Bolsonaro defende, mas é possível se ter uma ideia devido à pauta de costumes que tem abraçado (contra as temáticas LGBTQI+, de diversidade racial, inimiga da cultura livre, adversária da literatura, da música, do cinema e do teatro). O equívoco da gestão é acreditar que o papel do governo é produzir cultura segundo sua visão de mundo – a política de cultura serve à multiplicidade de visões de mundo de todo o País e de toda sua diversidade artística, e sempre como fomentador, não produtor.

A pauta, segundo a agenda da Secretária Nacional das Famílias, Marlice Umbelina, se enquadrava no escopo de “políticas públicas para família”. É possível depreender-se dessa iniciativa um novo enfrentamento com o maior produtor de novelas do País, a Rede Globo, hostilizada pelo presidente Bolsonaro com corte de anúncios publicitários e ataques diretos em lives e entrevistas. A questão é que o gênero novela é um dos produtos mais bem-sucedidos da teledramaturgia nacional, tem autossuficiência comercial e de público e não requer subsídio – a menos que não consiga caminhar com suas próprias pernas. O uso de dinheiro público nessa linha de produtos também configura um desequilíbrio na competitividade do mercado de TV.

Mantendo como uma espécie de refém o Fundo Setorial do Audiovisual (FSA), ao mesmo tempo em que sufoca a cinematografia nacional e sua agência de cinema, a Ancine, o governo dispõe de recursos vultosos se decidir realmente investir nessa linha. O problema é que cria um balcão de dirigismo cultural só comparável ao de ditaduras extremistas.

A tentativa do governo de impor sua pauta de costumes investe-se invariavelmente de movimentos de censura e autoritarismo. Esta semana, o secretário Mário Frias chegou a ligar para a Academia Brasileira de Cinema para tentar impor a vontade do governo na escolha do filme que tentará uma vaga para representar o Brasil no prêmio Oscar 2021. Em suma: assumiu a censura oficial. Ocorre que Frias caiu do cavalo: a Academy of Motion Pictures, Arts and Science (Ampas) de Hollywood determinou que a Academia Brasileira de Cinema é a única responsável por indicar o representante brasileiro, e o governo não tem nada a ver com isso.

Mario Frias já trabalhou em novelas da Rede Globo (iniciou-se na série Malhação). Também chegou a estrelar uma série (e foi garoto-propaganda) financiada pela empresa de turismo CVC, que foi cancelada pelo SBT. Não tem nada muito consistente no currículo – assumiu a secretaria Especial de Cultura após passagem-relâmpago da atriz Regina Duarte e era o único na fila (na qual entrou voluntariamente). O conceito de civilização do bolsonarismo é inimigo da Constituição e das leis brasileiras. Damares Alves, ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, tornou-se suspeita essa semana do vazamento de informações sobre uma menina de 10 anos violentada que foi submetida a um aborto legal no Nordeste – a ministra instigou simpatizantes do governo a tentar impedir o aborto. Ao final, um grupo de fanáticos cercou a entrada do hospital para hostilizar a vítima.

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