Fim de Festa, de Hilton Lacerda, alegoriza o Brasil ao tratar do desencanto depois do hedonismo de Tatuagem (2013)
O cineasta recifense Hilton Lacerda dialoga com a própria obra em Fim de Festa, que chega no pós-Carnaval para suceder Tatuagem (2013). No filme de sete anos atrás, uma comunidade hippie liderada pelo personagem de Irandhir Santos vivia o desbunde sexual como forma de resistência à ditadura civil-militar no final dos anos 1970. O ator Jesuíta Barbosa interpretava um jovem policial que se envolvia com o protagonista. Fim de Festa, por sua vez, se passa nos dias atuais e se ambienta nos dias posteriores à quarta-feira de cinzas. O mesmo Irandhir vive agora um delegado de polícia de meia idade, em crise com a profissão e com a vida.
Um núcleo de personagens jovens sustenta a atmosfera de liberdade sexual e de poliamor de Tatuagem, mas o ambiente geral, como o título indica, é de desencanto e de fim de festa. O assassinato de uma turista francesa durante o Carnaval confere ao filme um enredo policial, que substitui o hedonismo de antes pela dureza do cotidiano. É como se o jovem soldado de Tatuagem se tornasse adulto e trocasse a festa pela delegacia, dilacerado pelo sentimento de remorso pelo que se perdeu com a passagem do tempo. Fim de Festa carrega um tom amargo, de perda, que corresponde com justeza a tudo que tem acontecido no Brasil de 2013 para cá.
“Eu quero meu Brasil de volta”, clama a certa altura uma personagem reacionária. Em meio a homenagens a O Bandido da Luz Vermelha (1968), de Rogério Sganzerla, o Brasil de agora é descrito como “um país dilacerado e atingido bem no coração da liberdade”.