Coletânea do Prêmio Grão de Música 2019. Capa. Reprodução
Coletânea do Prêmio Grão de Música 2019. Capa. Reprodução

Cerimônia de entrega acontece amanhã (19), em São Paulo

A Sala Olido, no Centro Cultural homônimo, em São Paulo, sedia amanhã (19), às 19h, a entrega do Prêmio Grão de Música Brasileira. A premiação acontece regularmente desde 2014, idealizada pela cantora e compositora Socorro Lira.

Rolando Boldrin, Marlui Miranda, Rodrigo Sartori, Alessandra Leão e Josyara (cujo “Mansa fúria” é um dos grandes discos lançados ano passado no Brasil) estão entre os 15 agraciados da edição 2019, além do maranhense Gildomar Marinho.

A lista completa pode ser conferida no site do prêmio. Os artistas integram a coletânea do Grão de Música, cuja capa – e o troféu que receberão – é desenhada por Elifas Andreato, icônico capista da MPB, que já emprestou o talento a discos de Clementina de Jesus, Martinho da Vila e Paulinho da Viola, para citar poucos.

A cantora e compositora Socorro Lira. Foto: Patrícia Ribeiro/Divulgação
A cantora e compositora Socorro Lira. Foto: Patrícia Ribeiro/Divulgação

“Quando ganhei o Prêmio da Música Brasileira em 2012, vi que prêmio é importante. E que no Brasil quase não tem premiação dessa natureza. Então, pensei em criar um troféu a nível de Nordeste. Em 2009 produzi uma coletânea em CD chamada “Grão de Música” [lançada em janeiro de 2010] junto de uma empresa que se chamava Grão de Arroz, em Salvador [hoje, Grão]. Em 2014, Vera Martins, dona do Grão, me chamou de novo para fazer o evento de 40 anos do grupo e pensamos em fazer uma segunda coletânea para registrar o momento, novamente, com algo menos efêmero que um show. Propus a ela a criação de um troféu para aqueles e aquelas que doariam suas canções/fonogramas para o CD. De troféu em Salvador em 2010 passou a Prêmio Grão de Música em 2014, já em São Paulo. Contei ao Elifas Andreato, ainda em 2014, minha intenção de criar o troféu e ele disse “Quero desenhar esse troféu” e desenhou. Ele segue conosco inclusive pensando e estruturando o Prêmio Grão de Música”, lembrou Socorro Lira com exclusividade ao Farofafá.

O incomum na premiação é que ela não volta-se apenas para lançamentos, novidades, discos lançados este ano ou ano passado. A inclusão de Gildomar Marinho entre os agraciados, por exemplo, se dá graças a “Alegoria de saudade”, samba-choro que gravou com a adesão da mineira Ceumar em seu disco de estreia, “Olho de boi” (2009).

“Elegemos “obra e trajetória” como foco principal porque imaginamos a música como arte, duradoura, sem a voracidade de mercado que a vê e trata como produto. Atemporal. O olhar é sobre a pessoa-artista que cria, se desdobra e embeleza a alma desse país mesmo em seus piores momentos, como agora. A atenção está posta sobre aqueles e aquelas que, embora tenham um trabalho relevante, muitas vezes nem são percebidos, percebidas pela crítica especializada, também quase inexistente. A ideia é criar de novo um lugar para a canção brasileira e, de forma especial, a que acontece Brasil adentro. Gildomar foi premiado porque atende aos critérios da premiação. Ele é compositor, cantor, já gravou disco e, melhor, fora dos circuitos tradicionalmente mais ‘aclamados’ do país. A canção é uma pequena amostra que vai para o CD como registro da edição de cada ano”, continua Socorro Lira.

O cantor e compositor Gildomar Marinho. Foto: divulgação
O cantor e compositor Gildomar Marinho. Foto: divulgação

Gildomar comenta, com exclusividade ao Farofafá, a emoção de ter sido incluído entre os premiados. “Uma surpresa muito grande e de um significado de dimensão incalculável. Considero a música como uma garrafa jogada ao mar, como no caso de “Alegoria de saudade”, que achou um aconchegante porto no Prêmio Grão de Música”.

Ele continua, sobre a criação e gravação da faixa: “A música nasceu, digamos, em berço esplêndido, já que nasceu na Praia do Forte, na Bahia. Os coqueiros de lá devem, de alguma forma, ter me incentivado a fazer um sambinha, já que até então eu não havia composto nada do gênero. Talvez por ter ouvido por lá o “Samba da Bênção”, que diz que “é preciso um bocado de tristeza”. Na preparação da gravação do disco “Olho de boi”, alcovitado pelo amigo Glauco Porto, enviei algumas guias meio bambas pra Ceumar e ela, de cara, disse que gravaria “Alegoria de saudade”, uma emoção que me fez chorar na hora, coisa de fã. Essa confirmação me fez buscar um time de músicos à altura e a música teve o acompanhamento de Luiz Júnior, Robertinho Chinês, Carlos Pial…”.

Outra emoção que ele comenta é o fato de dividir prêmio e coletânea com alguns artistas por ele admirados. “A começar pelo mestre Rolando Boldrin, muito apropriadamente chamado de Senhor Brasil, que traz a lume nossa cultura recôndita, numa integração perfeita entre o tradicional e o moderno; Marlui Miranda, que conheci musicalmente em 1995, quando me deparei com o maravilhoso “Ihu – Todos os sons”, que me inspirou em diversas músicas, como “O Rio” e “Contramaré”, parceria com a poeta maranhense Samara Volponi. Me deparei com artistas que até então me apareceram como novidade, independente do tempo de estrada, fruto da fragmentação da difusão da música nestes tempos, como Bia Bedran, Márcia Tauil, Filpo Ribeiro…”.

Socorro Lira endossa a importância de Boldrin, destacada por Gildomar. “O Sr. Brasil é fonte para o Prêmio Grão de Música, embora hoje a gente conte com as curadorias regionais. Na medida do possível buscamos aproximar gerações, regiões, sotaques e experiências. Rolando e Marlui pertencem à “reserva ética” do país. Ouvi a expressão “reserva ética” pela primeira vez em 2011, da boca do poeta moçambicano Calane da Silva, em Maputo. Adotei a expressão para me referir a pessoas como Elifas, Rolando Boldrin, Marlui Miranda, Luiza Erundina… Para nos lembrarmos de que a bondade e o bem existem em nós e em todas as esferas da vida. Só precisar ampliar a consciência e arregaçar a manga pra fazer o que precisa ser feito”, afirma ela.

Por falar em Elifas, ela continua: “é ele próprio quem entrega o troféu a cada artista na noite da cerimônia de premiação. Sua participação é uma assinatura de beleza e compromisso com o Brasil que dá certo sob uma ótica sensível, humana e democrática”.

Comparando tempos distintos, mas nem tão distantes, Gildomar lembra a gravação de seu primeiro disco, há 10 anos: “É importante registrar que a gravação de “Olho de boi” foi fruto de um programa de incentivo, em um tempo em que a produção artística e a cultura eram incentivadas e não discriminadas, quando não criminalizadas. Em um tempo de pós-verdade, onde arte e artista são tangenciados por uma lógica maniqueísta, fazer arte no Brasil é, antes, tentar existir para depois resistir”.

Sobre as dificuldades em lançar dois novos trabalhos, já gravados há alguns anos, ele continua, esperançoso: “Objetivamente, há uma limitação de circulação dos mesmos, o que não nos deixa alternativa que não seja a disponibilização em plataformas digitais. Uma leve frustração, pois a “graça” de um álbum, para mim, um saudosista confesso, é o disco físico, com ficha técnica, identificando e valorizando os diversos parceiros que tornaram o trabalho possível. Com a perspectiva da gravação de “Estradar”, meu próximo álbum, prevista para novembro, aposto na possibilidade de lançar a trilogia “Mar do Gil”, “Porta sentidos” e “Estradar” em cd.

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