BOOGIE

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Tal qual um cruzamento de Jimi Hendrix com Madame Satã, o vocalista Fernando Almeida enfia inteiro na boca o microfone que não funciona e gargalha: “Produção! Produção!”, brada. “Engoli com vontade…”.

O primeiro show do tipo “batismo de fogo” da banda-sensação goiana Boogarins em São Paulo, frente a umas 2 mil pessoas no Popload Festival, ontem à noite, foi uma catarse – parecia que eram velhos conhecidos, a plateia e o grupo. “Recomendados” pelos States, que os celebraram em 4 apresentações do festival texano South by Southwest e lhes deram resenha no NYT (o crítico Jon Pareles viu neles uma mistura de Jefferson Airplane com a Tropicália), os rapazes têm realmente o vento a favor.Primeiro, por conta da competência. A principal diferença de sua psicodelia temporã para a dos colegas da noite (a boa banda Pond e os hypados Tame Impala) é que os brasileiros enfiaram algo de Santo Daime no seu delírio, um toque de surrealismo tropical que comparece nas letras em um português quase dissolvido em ácido. O outro componente que é nitroglicerina pura no seu blend é a performance andrógina de Fernando Almeida, que tem voz de Ney Matogrosso passada num moedor de carne (adicione aí um rebolado de Dzi Croquette e umas risadas meio Screamin’ Jay Hawkins, e tem-se a alquimia). “E os caras aqui achavam que eu fosse dizer algo sério…”, diverte-se o cantor, driblador de expectativas.

Enfiados entre o dedilhado meio pedante de Rodrigo Amarante e o psicodélico acadêmico do Pond, os rapazes mostraram grandeza. Primeiro, porque não ficam escovando psicodelia nem progressivo de ocasião para encantar hipster já dominado. Não são bibelôs de coxinhas. Eles mostram euforia e leve sarcasmo em sua performance, como nas canções Lucifernandis, Doce e Despreocupar. Sua performance foi meio curta (“Nos deram apenas mais 4 minutos”, lamentou pouco antes do final apoteótico o guitarrista Benke Ferraz), mas chapante – e um baterista impoluto que parece emprestado do TV on the Radio dá um toque blaxploitation definitivo.

Bogari é o nome de uma flor. Eles colocaram “boogarins”, com dois Os, para dar um sentido de boogie, segundo contaram. A flor que os batiza é um jasmim branco, que exala forte fragância durante a noite e que é chamada em inglês de Grand Duke of Tuscany. Como toda dança dervixe, é circular, tonteia e floresce o ano inteiro. Símbolo perfeito dessa lisergia do cerrado, Jimi Hendrix com pequi

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Jotabê Medeiros, paraibano de Sumé, é repórter desde 1986 e escritor de Belchior - Apenas um Rapaz Latino-Americano (Todavia, 2017), Raul Seixas - Não diga que a canção está perdida (Todavia, 2019), Roberto Carlos - Por isso essa voz tamanha (Todavia, 2021) e O Último Pau de Arara (Grafatório, 2021)

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