Festival Casarão, a adaptação e a celebração

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Nevilton, uma das atrações do 15º Festival Casarão - Fotos Regert Neto
Nevilton, uma das atrações do 15º Festival Casarão – Fotos Regert Neto
Quinze anos, incontáveis horas de música e inúmeras histórias que aconteceram nos palcos e fora deles. O Festival Casarão, em sua 15ª edição, mostrou sua principal face: adaptação. Sem apoio de editais ou por parte do governo de Rondônia e da Prefeitura de Porto Velho o festival ocorreu nos dias 30 e 31 de maio no Pioneiros Pub. A grande aposta do evento foi o “custo-benefício” ao trazer Bruno Souto (PE), Los Porongas (AC), Daniel Groove (CE) e Nevilton (PR). As colaborações de uns artistas com os outros resultaram em shows intensos, com ótima resposta do público. Jair Naves (SP) veio coroar a intenção do festival: “Se não há nomes grandes, que venham os grandes nomes”. Juntos integram o seleto grupo de bons e novos compositores, um sopro de renovação da cena musical brasileira. E com eles, desde o embarque de São Paulo, veio o espírito vigente do Casarão, a celebração.

Celebração que começou no ano de 2000, literalmente à beira do Rio Madeira em um casarão de construção datada de 1858. No meio da floresta amazônica, ao lado do rio, com os dois ao alcance das mãos e de quebra, presenciando a história com o casarão que deu o nome do festival e com os trilhos da estrada de ferro Madeira-Mamoré que passam ali por perto, a 7,5 quilômetros do centro da cidade. Era um local místico e que foi palco do evento até 2008. Então vieram as usinas de Santo Antonio e Jirau e a mudança de local do festival. Este migrou para a cidade, mas preservou o nome.

E agora, em 2014, o jovem Madeira quase se fez presente, já que há alguns dias atrás o local de realização do evento estava na área de risco, com várias ruas ao redor isoladas pelas águas que atingiram quase 20 metros acima de seu nível normal. Tudo isso torna indissociável a relação rio, cidade e Festival.

Na noite do dia 30/05, a primeira banda a se apresentar no palco do Pioneiros foi a Fuska 69, de Ariquemes, com seu rock cru, direto e com letras que falam sobre o cotidiano de jovens daquela cidade. Logo após subiu ao palco a banda acreana Filhos da Casa da Mãe (AC), de músicos competentes e vocais seguros, pecando apenas por apostar em uma proposta ainda não concreta de sonoridade. A única banda porto velhense da noite, Sexy Tape, proporcionou uma apresentação bem performática, principalmente do baixista Mikeias Belfort, com destaque na parte instrumental. E veio Branco ou Tinto, de Cuiabá/MT, de riffs bem feitos, levando o público mais para perto palco para bater cabeça.

Depois de toda a agitação sobe Bruno Souto (PE), munido de sua guitarra. A resposta do público à suas canções surpreendeu o próprio artista, que veio a Porto Velho divulgar seu disco solo “Estado de Nuvem” e relembrar canções da Volver, sua antiga banda. O resultado catártico e se amplificou com a participação de Nevilton na segunda parte do show.

E então veio Los Porongas (AC) para encerrar a noite. A banda aproveitou o show para lançar duas novas canções que agradaram aos presentes, mas as canções do repertório antigo foram cantadas em uníssono, com destaques “Lego de palavra” e “Enquanto uns dormem”. Foi um encerramento de noite perfeito.

Na segunda noite do Festival (31/05) coube à banda Par de Sais abrir os trabalhos da noite, com uma sonoridade interessante para uma banda formada por jovens, sem ser muito pesado nem soar como Los Hermanos. Além da programação do palco principal do Festival, batizado de “Classic”, havia na área externa do Pioneiros o palco “Experience” com curadoria do pessoal do Acústico Lo – Fi (Rafael e Douglas). Focado na produção local o palco abriu a oportunidade para vários estreantes no festival, como a banda Krápula, que encerrou as atividades musicais da área externa tendo como influência (e um integrante) a banda Made in Marte, uma das mais criativas surgidas em território rondoniense.

Logo após veio a Wari e uma apresentação com sintetizador, baixo e guitarra e projeções em um telão improvisado no fundo do palco, criando um formato sensorial interessante, que deu espaço para o som pesado da Coveiros, de riffs e cozinha bem alinhados. Impactante, fez a primeira roda de pogo aparecer no Casarão. Depois da intensidade veio a suavidade dos Descordantes (AC), banda que surpreendeu ao público e artistas convidados, e contou a participação de Bruno Souto em uma música da banda Volver.

Jair Naves, um show intenso e repleto de poesia
Jair Naves, um show intenso e repleto de poesia
Veio então uma das apresentações mais esperadas desta edição: Jair Naves (SP), intenso e com toda poesia que se espera dele, o que pôde ser comprovado em canções como “Pronto para morrer…”, “Um passo por vez”, “De branquidão hospitalar”, além de canções da Ludovic. Coube a Os Últimos, também de Ariquemes, encerrarem a participação rondoniense nos palcos do Casarão. A banda no palco com um rock bem elaborado, riffs certeiros e baixo e bateria bem alinhados, com destaque para a baterista Laura Brandhuber, que fez muitos bateristas do Festival reverem seus conceitos de pegada, brutalidade na batida e técnica na execução.

Daniel Groove (CE), “escoltado” pela banda Los Porongas, chegou e deu o recado: “A gente não é só brega, a gente é brega pra ca***”. Cantado em coro pelas pessoas que foram à frente do palco, destaque para “Giramundo”, “Novo brega” e “Nada” que teve participação especial de Diogo Soares, vocalista dos Porongas, cativaram o público que se deixou contagiar pelo estilo brega moderno.

Coube à Nevilton encerrar esta edição do Festival. O duo levou público a gastar as últimas energias com “Crônica” (com participação de Daniel Groove), “Pressuposto”, “A máscara” e uma versão de “Cheia de Manias”, do grupo Raça Negra. Sintetizou o clima de confraternização do Festival.

O Futuro

Embora a aura do Festival fosse coberta de um astral nunca antes visto o olhar da realidade ainda deve ser considerado. Realizado em um espaço confortável, mas aquém de seu verdadeiro potencial como evento cultural que é, quase provável que as contas não vão fechar. Tudo em virtude dos poucos patrocínios e participação nula por parte do governo e prefeitura. Literalmente um festival feito no peito e na raça, como outros tantos por aí contemporâneos que após anos de tática de guerrilha deixaram de existir.

A esperança de Vinicius Lemos, organizador, em manter o Festival se encontra na participação (e aprovação) de editais e também na nova política cultural que a Superintendência de Esporte, Cultura e Lazer do Estado promete aplicar nestes próximos meses. Festivais como Bananada, Abril Pró Rock gozam de muitos fatores que acabam por destoar do tamanho do festival realizado aqui, principalmente leis de incentivo por parte dos estados e aprovação dos projetos por grandes corporações, atualmente responsáveis por boa parte da circulação e produção cultural do país.

Cabe ressaltar a dificuldade logística que Rondônia apresenta, por ser distante dos grandes centros e a inflação do preço de cachês das bandas e artistas que conseguem se inserir em Circuito Sesc ou de casas de show em São Paulo e no Rio de Janeiro. Tudo isso dificulta a realização de mais eventos por aqui.

A décima quinta edição do Festival Casarão ficará marcada pelo clima de celebração que espero que se espalhe por todo o território nacional, onde todos os artistas colaborem entre si e com isso agreguem valor aos seus trabalhos e à cena musical. Um festival mítico – e de histórias sensacionais – e que esperamos que continue assim.

Interação intensa entre artistas e público de Porto Velho
Interação intensa entre artistas e público de Porto Velho

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